Estudou ciências políticas, mas é à história que tem dedicado a sua escrita, porque vê nesta a política do passado. Acredita que os acontecimentos determinantes da humanidade foram sempre liderados pela determinação individual. Porém, os seus livros falam de personalidades cuja importância ficou muitas vezes na sombra de outros, neste caso de maridos, reis e imperadores, com lugar de destaque primordial na história. As mulheres “tinham um papel que se chamava influência”. É esse lado menos conhecido que pretende trazer à tona.
Já escreveu vários livros sobre figuras femininas históricas. Porquê a imperatriz Leopoldina?
Por um lado, por trabalhos que fiz em Espanha, fiquei a conhecer muito bem as mulheres da dinastia de Habsburgo e a saber que tinham desempenhado um papel muito importante de influência na política espanhola. Quando trabalhei no sector editorial em Portugal, também me ocupei de Carlota Joaquina e escrevi uma biografia dela, e o que me surpreendeu foi que, quando Leopoldina chegou ao Brasil, a relação que Carlota Joaquina estabeleceu com ela – que havia sido advertida de que a sogra tinha um carácter especial – foi uma relação entre duas mulheres inteligentes que se temem e respeitam ao mesmo tempo. Isso chamou-me a atenção porque a versão tradicional de Leopoldina era a de uma mulher débil e dominada, sacrificada pelo marido._Fiquei a pensar que a sua personalidade, provavelmente, seria muito mais complexa. Quando tive oportunidade, comecei a trabalhar numa biografia dela para mostrar justamente isso.
O livro foi baseado em cartas escritas pela imperatriz. Como chegou a essas cartas?
Através de Carlota Joaquina, quando Leopoldina chega ao Brasil e conta à família as suas impressões. As cartas são parte fundamental da estrutura da obra, porque Leopoldina, que tinha tido uma educação bastante aristocrática para a época no que respeita às mulheres, gostava muito de escrever cartas. E escrevia cartas oficiais em que manifestava as versões oficiais da realidade. Por outro lado, escrevia cartas à sua irmã Maria Luísa, com quem confidenciava. Através dessas cartas percebe-se que há um contraste entre a Leopoldina oficial, a Leopoldina política e a Leopoldina íntima.
O que mais o surpreendeu nessa personalidade complexa?
O que mais me surpreendeu foi perceber que, no início, Leopoldina tinha uma personalidade impulsiva, como o marido. Mas a sua personalidade sofre uma evolução quando tem de enfrentar desafios, como a sua relação com D. Pedro. A Leopoldina que começa a mostrar-se no Brasil, depois de perceber que o marido lhe é infiel, é completamente diferente da Leopoldina caprichosa, impulsiva e romântica quando estava na Áustria.
E nessa altura percebe também que tem de cumprir as suas obrigações, não olhando a sacrifícios?
Exactamente. Podemos não concordar com os valores de Leopoldina, mas temos de a respeitar, porque era uma mulher honesta que actuou segundo os seus valores, e eles serviram para que ela vivesse com dignidade. Acreditava na fidelidade no matrimónio, na educação cristã dos filhos e que uma pessoa que estivesse numa posição mais alta na sociedade devia actuar para o bem comum.
Ainda assim suportou as infidelidades de D. Pedro. Isso contribuiu para que fosse considerada uma mulher frágil?
Digamos que ela é vítima de um jogo subtil. Como tem uma formação e origens que a impedem de se manifestar abertamente, tem de se conter.
Apesar das divergências entre o casal, eles tinham algumas coisas em comum, como a música e a admiração por Napoleão, o que é curioso.
Sim, é muito interessante e revela abertura mental dos dois. Ambos eram pessoas muito inteligentes. O drama foi, como o próprio D. Pedro reconhecia, ele não ser capaz de submeter a paixão à razão, enquanto Leopoldina aprende a dominar a paixão pela razão. Revela abertura mental porque Napoleão prejudicou as duas famílias. Mas, como são pessoas inteligentes, admiram a capacidade política do político corso.
Os livros que tem escrito são sobre personagens históricas femininas. Porque se interessa por elas?
Estudei ciências políticas e o facto de as mulheres terem tido, na história da humanidade, um papel marginal na política, não significa que não tenham agido. Tinham um papel que se chamava influência. E as mulheres que podiam influenciar quem dominava a política eram sobretudo as princesas e as rainhas. Se as mulheres de reis e imperadores eram mais inteligentes e fortes, isso podia condicionar a actuação deles. Mas isso está oculto. A história é construída, quase sempre, com base naquilo que os homens fizeram. Por isso era interessante unir a esse lado o aspecto mais desconhecido: a influência política das mulheres.
Todas as personalidades sobre as quais tem escrito têm alguma ligação a Portugal. Porquê?
Quando comecei a minha carreira editorial, em Espanha, descobri que muitas mulheres da monarquia portuguesa tinham tido relação com a história de Espanha. E, dado que sou um iberista convicto, e penso que a península Ibérica devia estar unida porque representa, na história da Europa, uma série de valores importantes e antigos, nada melhor que procurar as relações entre os dois países. Ao mesmo tempo, sou argentino e sinto isso também em relação à América Latina, com o Brasil e a Argentina.
Estudou ciências políticas. Como é que passou para a história?
Considero a história a política do passado e interessa-me a política, mas não a activa. Acredito no valor pedagógico da história. Ver como actuaram certas personalidades em momentos determinantes pode ajudar a que no presente se evite repetir os mesmos erros.
Mas porquê biografias e não factos ou acontecimentos históricos?
Acredito sobretudo na liberdade humana e que são os seres humanos que fazem mover a história. Na análise histórica que tenho feito, vejo que personalidades com grande inteligência, força de vontade e grandes valores podem mudar os acontecimentos.
Em média, quanto tempo demora a investigação para cada livro?
Em geral, um ano e meio, mais um ano a escrever. Só o da rainha D._Joana de Portugal, que foi uma rainha consorte muito importante de Castela, é que a investigação foi mais demorada.
Já escolheu a próxima figura sobre a qual vai escrever? Será de novo uma figura feminina?
Creio que sim, ainda mais agora, que prevejo, embora possa estar enganado, que na maior potência mundial, os EUA, há fortes possibilidades de o próximo presidente ser uma mulher. E também porque as circunstâncias do caso de Hillary Clinton são muito parecidas com as de Leopoldina. Uma mulher inteligente que esteve atrás de um homem inteligente, que teve paixões semelhantes às de D. Pedro, e a maneira como esta mulher inteligente responde às paixões do marido de forma a não arruinar as suas próprias ideias ou ambições políticas.