Fábricas de talento. Até onde vão as empresas para agarrar os melhores?

Fábricas de talento. Até onde vão as empresas para agarrar os melhores?


A gestão de talentos é cada vez mais um trunfo para o êxito nos grandes grupos empresariais. Há toda uma máquina montada para descobrir e agarrar os melhores que estão nas universidades ou nas empresas de topo.


O talento não é um dom que se encontre ao virar da esquina. Se assim fosse, não haveria road-shows em universidades e politécnicos, estágios e programas de trainee, academias e escolas corporativas. Dentro das grandes empresas há toda uma máquina a girar em torno de um único objectivo: descobrir onde se esconde o talento entre os milhares e milhares de recém-licenciados que todos os anos se atiram ao mercado de trabalho.

Encontrar, fixar e gerir talentos é cada vez mais o caminho para o sucesso de qualquer organização. E em qualquer organização a pergunta para um milhão de euros (ou muitos mais, espera-se) é “onde vai estar a minha a minha empresa daqui a uma ou duas décadas com esta gestão de talentos?”. Respostas certas não há, mas é possível prever o futuro com alguma confiança. Recrutamento, formação e estímulos são os trunfos. “Se consigo gerir bem o talento da minha empresa, mostrando aos colaboradores que quero ficar com os melhores e dando-lhes incentivos, aumento a probabilidade de ficarem”, explica o consultor da RAY Human Capital Miguel Abreu. 

A fórmula do sucesso até parece fácil, mas implica dentro de cada empresa todo um planeamento virado para esse fim. Procurar os melhores, fazer tudo para não que não fujam e criar o ambiente ideal para o talento amadurecer é tão importante que se transformou numa estratégia obrigatória em qualquer organização com sonhos ambiciosos: “É uma das áreas mais premium dos recursos humanos.” 

PRIMEIRA PEÇA Antes de tudo, é preciso ter talento para encontrar o talento. Essa é a primeira peça da engrenagem, que determina tudo o resto. “A equipa de recrutamento é uma parte fulcral do nosso departamento de recursos humanos”, conta Dalia Turner, directora de RH da Microsoft Portugal. São eles que estão na linha da frente quando se trata de identificar e contratar os melhores.

E o talento pode estar em qualquer parte do mundo. O recrutamento é feito tanto dentro como fora da Microsoft, a nível nacional ou internacional. A equipa liderada por Dalia Turner está sempre inquieta. Assim que o radar descobre um talento potencial, há dois corredores a percorrer. O primeiro é mais curto e resume-se a desafiar os talentosos a ocuparem os lugares que ficaram vagos na empresa. O outro pode ser mais demorado e exigir alguma paciência. Os candidatos ficam estrategicamente arquivados numa carteira à espera da primeira oportunidade.

Na Sonae, a tarefa de seleccionar os melhores não compete apenas aos recursos humanos. O grupo tem uma equipa de “diferentes backgrounds académicos e profissionais” com experiências que atravessam as áreas organizacional, académica ou de consultoria. “A gestão de talento é uma preocupação nossa há várias décadas”, diz Isabel Barros, directora de Gestão de Talento da empresa.

PROCURAR Mas afinal onde deve uma organização procurar talentos? Em primeiro lugar dentro de casa, responde Isabel Barros. Não vale a pena ir mais longe enquanto não se conhecer o que existe na própria empresa: “Porque  estamos convencidos do grande potencial dos nossos colaboradores, a política de recrutamento tem como prioridade a identificação interna de candidatos” a determinadas vagas. Só depois se olha para o que existe lá fora. E aqui a estratégia é disparar em várias frentes para no fim conseguir acertar no alvo: anúncios na imprensa, divulgação no site corporativo, sites de recrutamento, redes sociais (como o LinkedIn e a Rede Contacto, da Sonae, a primeira criada a nível mundial por um grupo económico) e ainda roadshows em universidades de topo nacionais e internacionais. 

De seguida será preciso peneirar com muito cuidado para não deixar escapar nenhum talento. Durante a fase de recrutamento, o objectivo passa por identificar candidatos com “elevado potencial, através dos diferentes programas integrados de talento jovem”, esclarece a directora de Gestão de Talento da Sonae. 

Quem julga que a missão ficou aqui concluída não faz ideia do que vem a seguir. Terminada a fase inicial de integração ou estágio, “é necessário garantir o desenvolvimento sustentado desses perfis”. E é para isso que existem iniciativas como a Sonae Management & Leadership Academy. A universidade corporativa destinada aos trabalhadores integra escolas de negócio e academias de competências.

Descobrir os melhores e fazer tudo para não que não fujam é tão importante que se tornou estratégia obrigatória.

INDIVIDUAL E COLECTIVO Descobrir e trabalhar os talentos envolve vantagens para os dois lados. E muitas. Desde logo moldar os talentosos ao ambiente da empresa e depois treiná-los para serem os melhores nas funções para os quais foram escolhidos. Ganha a empresa e ganham os talentosos. “A atracção, a captação e a formação de talento considera não só as aptidões específicas definidas para a função, mas ainda um perfil de competências alinhado com a cultura, os valores e a estratégia do grupo”, conta fonte oficial da EDP. 

É olhando para esse dois lados que a EDP procura atrair, desenvolver e alargar o seu talento. Promove iniciativas e oportunidades no meio académico e nas redes sociais, investe no networking e em parcerias com instituições de ensino e outras entidades e cria também oportunidades de competição e desenvolvimento de projectos junto de universitários e estudantes de cursos profissionais (através de desafios como o EDP University Challenge). Estágios (de Verão, curriculares e profissionais), programas para jovens talentos (EDP Trainee) e Universidade Corporativa são outros caminhos para recrutar e formar talentos. 

Olhando para estes exemplos, o mais imediato seria imaginar um país semeado destas pequenas ou grandes fábricas de talento. Mas há ainda um longo caminho a percorrer, avisa Miguel Abreu. “Normalmente, quem investe nesta área são os grandes grupos.” Acontece que em Portugal “o tecido empresarial é maioritariamente constituído por pequenas e médias  empresas. E neste universo há muitas que nem sequer têm departamento de recursos humanos”.