A minha ideia é mostrar a mulher como companheira. Ela não aparece em cima de uma prancha de surf com o corpo cheio de óleo. Ela é aquela que transporta a prancha até ao carro para irem juntos para Montauk.” Podia ser um mantra feminista ou uma passagem de entrevista a uma ficcionista, em conversa com a “The Paris Review”. Na verdade, é o novo conceito da revista masculina “Maxim” e tem a assinatura de Kate Lanphear, a senhora que acredita que há vida para além do binómio carros velozes e mulheres quentes (ou melhor, que é possível apresentá-los ao público com outro tipo de embrulho).
A prova é a mais recente capa da publicação. O destaque vai inteiro para a cantora Taylor Swift, quase irreconhecível na primeira página, fotografada com um top preto e maquilhagem discreta. Nada de biquínis ou outras modalidades reduzidas de vestuário. A partir de agora, a pele fica para segundas núpcias, e o que fica a nu é mais o conteúdo e menos a embalagem – e, aliás, para continuar a seguir os velhos padrões, tem toda uma internet à sua disposição. No interior desse número, lá está uma entrevista durante a qual Swift é convidada a partilhar as suas opiniões sobre a condição feminina, a misoginia e como conquistar o mundo com uma guitarra.
Não comece já a bocejar, pois garantimos que é capaz de apreciar as afinações. Retroceda até ao número de estreia de Kate Lanphear que, em Setembro, anunciava a saída da direcção de estilo da revista “T”, do “The New York Times”, e o ingresso no título detido pelo milionário Sardar Biglari que soma mais de dois milhões de subscritores, a maioria dos quais na faixa dos 34 anos, e casados. Em Fevereiro, a “mulher mais desejada do mundo” fazia a primeira capa planeada por Lanphear: Candice Swanepoel, modelo sul-africana de cortar o fôlego e nome de referência da Victoria’s Secret. Nada de cenários de praia, decotes profundos, lingerie provocadora ou pernas quilométricas à vista. Um grande plano do rosto e estava feito o teaser para conhecer o recheio da “Maxim”, preparada para virar a página rumo a um novo paradigma.
“Quero celebrar o luxo e as histórias de sucesso, que realmente inspiram as pessoas. E pontuar isto com uma apresentação estilosa, porque o estilo permeia todas as áreas da nossa vida, sendo possível fazê-lo de uma forma divertida. Quero manter o espírito aspiracional, mas sem perder a ligação à realidade”, defendeu ao Fashionista a loura platinada, famosa pelo seu bob assimétrico, pelo estilo clean irreverente que marca as tendências nas ruas nova-iorquinas, e é presença assídua nos blogues que seguem em fotografia as criaturas mais apetecíveis das semanas de moda. As calças skinny e os blusões de cabedal são algumas das imagens de marca da miúda nascida no sul rural e conservador dos EUA, a milhas de distância do cosmopolitismo da capital, que hoje, a julgar pelos novos parâmetros, ficaria a matar na capa da revista que edita – a própria assume que os seus uniformes habituais piscam o olho ao guarda–roupa masculino. “É por isso que sou a escolha perfeita”, ironizou à “NyMag”.
Kate estudou jornalismo e, já em Londres, testou o impacto de publicações contagiadas pelo hype, casos da “i-D” e
“The Face”. Foi a partir de Inglaterra que saltou para Sydney, na Austrália, onde trabalhou na “Vogue” e na “Harper’s Bazaar”. De regresso ao seu país passou pela “Elle”, deixou a sua impressão digital na “T” e tem agora o desafio de redesenhar o conceito da revista masculina saída dos anos 90, esperançada de que os leitores entendam que “há algo de sexy no mistério”.
Viagens, roupa, consumo, gourmet são alguns dos temas a aprofundar numa casa que pretende não viver apenas dos atributos femininos. A editora tratou de pôr Mike Tyson de boxers e o escritor Neil Strauss a falar sobre como se trata o vício do sexo, tudo com uma curadoria cuidadosa.
A grande questão é saber se Lanphear conseguirá manter a “Maxim” “men friendly”, para lá da popular lista “Hot 100”, sem correr o risco de a converter numa revista de moda, incapaz de satisfazer o voyeurismo dos milhares de seguidores ao longo dos últimos anos. Com direito a 16 edições, vendidas em 75 países, o título importado do Reino Unido tornou-se sinónimo de editoriais que não se livraram de polémica por aproximarem a figura feminina do objecto, sob a edição de nomes como Keith Blanchard, Joe Levy e Dan Bova. Quem sabe se não deveremos pensar o oposto. Conseguirá transformá-la numa revista “women friendly”? É seguir os próximos capítulos.