No futuro haverá mais idosos mas serão mais funcionais

No futuro haverá mais idosos mas serão mais funcionais


Nos últimos anos têm aparecido actividades direccionadas para os idosos e algumas começam a ser pensadas para os do futuro.


O aumento da esperança média de vida e o envelhecimento da população traz desafios às sociedades, que se por um lado já estão a tentar adaptar-se a esta realidade, por outro enfrentam desafios e incertezas, em que as expectativas de uma velhice tranquila se jogam com reajustamentos dos sistemas e das estruturas sociais. Nos últimos anos têm aparecido actividades direccionadas para os idosos e algumas começam a ser pensadas para os do futuro, tentando responder a necessidades físicas, mas também ocupacionais e de bem-estar. Os níveis de rendimento condicionam e podem continuar a condicionar, nas próximas décadas, o acesso a actividades e benefícios de forma que o Outono da vida se converte num Inverno rigoroso e penoso. Com a ajuda da médica gerontologista e professora no Instituto Piaget de Viseu Zaida Azeredo, tentámos perceber como se está a desenhar o presente em direcção ao futuro, em áreas como a robótica, a saúde, o turismo ou o lazer.

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Robótica

Os conceitos podem fazer pensar em ficção científica,
mas estas duas áreas já se encontram em desenvolvimento e a tendência é para estarem cada vez mais presentes na realidade do futuro. Tecnologias ligadas à domótica (aplicada ao ambiente doméstico) e à robótica favorecem a vigilância à distância dos idosos, permitindo-lhes manter a autonomia e a independência por muito mais tempo, e permanecer no seu domicílio em segurança, funcionando como uma espécie de “ajuda técnica” em muitos casos: alimentação, medicação, ajuda para sair à rua e evitar quedas, entre outras situações. Desejos de certo forma expressos pelos idosos actuais à especialista em gerontologia Zaida Azeredo nas suas consultas de medicina familiar. Em Portugal algumas destas ferramentas já começam a ser utilizadas. A Cáritas de Coimbra é parceira no projecto-piloto internacional GrowMeUp, um robô equipado com um sistema de diálogo inteligente que detecta emoções ao longo do diálogo e é capaz de manter interacções. Porém, de acordo com Zaida Azeredo, essas áreas permanecem inacessíveis a grande parte dos idosos por razões económicas e actualmente também por iliteracia tecnológica. O futuro, seguindo o exemplo de países como a Finlândia e a Noruega, terá, segundo a investigadora, de começar a ser pensado hoje. “Aquelas duas áreas (sobretudo a domótica ) deveriam estar a ser desenvolvidas nas autarquias para o bem-estar e a qualidade de vida dos seus idosos, poupando-se assim muito em recursos, que talvez já sejam insuficientes perante um envelhecimento tão rápido e intenso como o que se verifica em Portugal.” A especialista em gerontologia defende também que é importante que a ciência nessas áreas se empenhe em novas descobertas, tanto em prol de um envelhecimento activo como em “manter o grande idoso (acima dos 75 anos) autónomo e independente”. Estes, por sua vez, terão de ter feito, e continuar a fazer, uma aprendizagem constante ao longo da vida, sob pena de se tornarem obsoletos e em risco de exclusão social, mais que os idosos que, não tendo acesso à tecnologia, tinham, apesar de tudo, uma rede social forte, com suporte familiar estruturado. “À velocidade a que o mundo muda, o que é essencial é aprender a aprender e sobretudo aprender a adaptar-se, o que deve ser feito ao longo da vida, e não apenas quando chegamos a idosos”, sustenta.

Saúde

A saúde é uma área-chave quando se fala em envelhecimento da população, não só em matéria de prestação de cuidados, como enquanto factor económico a potenciar, tendo em conta que as projecções do INE apontam que, em 2060, o peso da população com mais de 65 anos seja 32% do total. Mas neste caso o alvo são sobretudo os reformados de estratos sociais mais altos e oriundos de outros estados--membros da União Europeia, com Portugal e constituir-se uma espécie de “Florida da Europa”, como defendeu o antigo ministro da Economia Álvaro Santos Pereira. Assim, o que podem então esperar os futuros reformados portugueses? “Em Portugal fez--se um esforço grande no que respeita à literacia em saúde das populações, com grande contribuição do Serviço Nacional de Saúde. Com a crise económica e outros factores, tem vindo a ser destituído da sua essência. Este facto, associado à diminuição das regalias sociais e de saúde, poderá alterar em pouco tempo indicadores que levaram anos
a atingir níveis elogiados internacionalmente e pela OMS”, considera Zaida Azeredo. A médica e especialista teme que possam ressurgir casos de doença, como no passado. No entanto, ressalva que se desenvolveu uma maior responsabilidade “individual e colectiva” pela saúde das populações e que o esforço feito pelas entidades e instituições que neste momento acompanham a população envelhecida deve ser acompanhado de uma avaliação para, se necessário, “se inflectirem estratégias”.

Turismo e Lazer

São outras das áreas com potencial económico e que apostam na população sénior, mas, mais uma vez, estão dependentes dos rendimentos dos pensionistas, e como tal em boa parte voltadas para reformados estrangeiros. Neste momento, em Portugal, nota Zaida Azeredo, o esforço de incentivo a um envelhecimento activo para estratos sociais mais baixos está a cargo das autarquias. A promoção de actividades de exercício físico, turísticas, culturais e de lazer, como o passaporte cultural ou o termalismo sénior, são alguns exemplos. Mas mesmo aqui tem havido, segundo a especialista em gerontologia, uma inflexão por muitos idosos estarem actualmente a ajudar no sustento de familiares desempregados. O desafio para o futuro é por isso maior se considerarmos o risco de vir a haver a perda de rendimento, associada a um rápido crescimento da percentagem de população com mais de 65 anos e ao aumento da esperança média de vida. A ocupação torna-se por isso essencial e, sem esquecer estruturas específicas adaptadas a cada fase da vida, deve ser transversal e as actividades não serem apenas dirigidas ou só procuradas quando se é sénior. “É o conjunto de actividades ao longo de toda a vida e a forma como nos adaptamos a mudanças que produz uma velhice bem-sucedida”, refere Zaida Azeredo. Até porque um idoso hoje não o será necessariamente amanhã.
“Não sei como será o idoso em 2060, mas, pelas tendências demográficas, antevejo uma sociedade francamente envelhecida com uma alta percentagem de idosos com 65 ou mais anos, mas não velhos, isto é, com normal funcionalidade, uma alta percentagem de grandes idosos, também funcionais, e uma percentagem relativamente elevada dos chamados idosos de excelência (com 100 ou mais anos)”, conclui.