Faro. Pai da menina retida dois anos na Bélgica vai ser julgado por sequestro

Faro. Pai da menina retida dois anos na Bélgica vai ser julgado por sequestro


Paulo Guiomar terá infligido “maus-tratos emocionais” e “instrumentalizado psicologicamente” a criança.


O Tribunal de Instrução Criminal de Faro decidiu esta terça-feira levar a julgamento o pai de Alice, menina que esteve dois anos retida na Bélgica, pelo crime de sequestro, e não de subtracção de menor, devido à gravidade do seu comportamento.

Em Fevereiro, a defesa do pai da criança, que está preso preventivamente, requereu a abertura de instrução do processo e pediu a alteração da qualificação do crime, de sequestro para subtracção de menor, menos grave, mas os seus argumentos de que Alice estaria em situação de perigo por viver com a mãe não convenceram o tribunal.

Segundo o tribunal, a conduta do arguido configurou "um absurdo injustificado", pelo período de tempo em que privou a menina, na altura com sete anos, de liberdade, ao confiná-la a espaços reduzidos e impedindo-a de frequentar uma escola e de ter convivência social ou contacto com outras crianças.

Durante o "imenso lapso de tempo" em que reteve a menina na Bélgica, com a ajuda da mãe do arguido, que está em prisão domiciliária, Paulo Guiomar terá infligido "maus-tratos emocionais" e "instrumentalizado psicologicamente" da criança, ao dizer-lhe que, se a polícia o encontrasse, iria preso.

De acordo com a avaliação psicológica feita à menor, invocada pelo tribunal durante a decisão instrutória proferida, esta continua "muito contida, reservada e ansiosa", apresentando "sentimentos de culpa pela prisão do pai" e um sentimento de auto- responsabilização que "não devia ser forçada a suportar".

O tribunal considera ainda que o ex-agente da Polícia Marítima podia ter accionado qualquer dispositivo legal para resolver a alegada situação de perigo a que menor estaria sujeita, mas, ao invés disso, dificultou a sua localização pelas autoridades e adoptou um "comportamento de fugitivo", que só terminou com a sua detenção.

O argumento da defesa de que Alice estaria em perigo, nomeadamente por questões de saúde, devido às frequentes consultas médicas e episódios de assistência em unidades de saúde não convenceu o tribunal, que considerou que a realização de 31 consultas em sete anos – desde que a menina nasceu até ter sido levada para a Bélgica -, "não é, por si só, indicador de um problema de saúde".

Em declarações aos jornalistas, à margem da sessão, o advogado de defesa frisou não concordar com a decisão do tribunal, observando que seria um "ato de coragem" tomar uma decisão diferente e que o tribunal optou por seguir uma "linha mais conservadora".

Ricardo Serrano Vieira continua a considerar que a medida de coacção do arguido deveria ter sido alterada para prisão domiciliária, acrescentando que o que aconteceu resulta de um "ato de desespero" do pai, que é, também, em parte, vítima das circunstâncias.

O advogado referiu ainda que o pai da menina não tem qualquer contacto com a filha, "situação que será discutida em sede própria".

Alice esteve dois anos na Bélgica com o pai, Paulo Guiomar, e a avó, Maria Dolores Guiomar, depois de ter sido alegadamente sequestrada por ambos, em Setembro de 2012, após as férias escolares, altura em que a menina deveria ter sido entregue à mãe.

O ex-agente da Polícia Marítima foi ainda acusado de abandono de funções e de detenção ilegal de arma de fogo.

Lusa