A dada altura, um dos doentes que não estão internados no Hospital Conde Ferreira, no Porto, mas que ali é assistido diariamente, confessa a uma auxiliar de saúde: “Vim de autocarro. Mas entro no autocarro e fico ao lado do motorista. Fico ali calado, não digo nada, mas não vou para o meio das outras pessoas. As pessoas abusam, chamam-me maluco.”
E o homem continua na sua rotina, um dia após outro. Jorge Pelicano decidiu juntar estas duas dimensões da vida num centro psiquiátrico em “Pára-me de repente o Pensamento”: revelar o que está para lá do estigma e do desconhecimento mas sem esconder a realidade do que acontece, a repetição de um quotidiano limitado e por vezes opressivo.
Era impossível fazê-lo sem impressionar, sem que muitos se questionem se querem mesmo continuar a ver isto. Mas não há, de modo nenhum, um trabalho a favor de uma missão moral, de uma evangelização.
Ninguém quer mudar mentalidades, mas se mudarem daí só vem bem ao mundo. Mas mais que esse primeiro impacto – o de nos vermos dentro de um mundo diferente e quase desconhecido – “Pára-me de repente o Pensamento” é um jogo brilhante entre as personagens e os cenários, qual dos lados o mais cativante. Um desafio que também é constante entre os protagonistas, que de tão à vontade parecem representar. Ou então é coisa nossa, que entrámos na história e dela já não saímos.