A bússola vocacional. Das escolas para a universidade


Cada escola tem a sua bússola para orientar os alunos: umas fazem contactos com universidades e empresas, outras limitam-se a aconselhamento e testes psicotécnicos.


Jorge Humberto é o único psicólogo para os 2700 alunos das Escolas de Valongo. Além de fazer orientação profissional, acompanha a educação especial, faz avaliação psicológica e tem a seu cargo a escola de pais, entre outras tarefas. É isto que o leva a concluir que “as escolas estão semipreparadas” para ajudar os alunos na orientação vocacional: “O ideal seria ter mais recursos técnicos e maior disponibilidade para apoiar os alunos na escolha do curso. Tentamos chegar a todos, mas a eficácia não é a desejável.” 

O caso de Jorge Humberto não é úni- co nas escolas portuguesas. “Parece-me que o que acontece, na prática, é que os alunos têm uma experiência muito redu- zida de aconselhamento pelos serviços de psicologia e orientação (SPO)”, teme o psicólogo da Universidade de Lisboa Paulo Jesus. A sobrecarga de trabalho e a escassez de recursos humanos limitam a atenção que a escola poderia dar aos alunos. Ainda assim, defende que o acom- panhamento vocacional, embora longe do desejável, tem “qualidade técnica”.

As metodologias variam consoante os casos e nem sequer são obrigatórias. “As escolas têm de ajudar os alunos na orientação vocacional. Se o fazem ou não, isso já é outra história”, diz o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, Manuel Pereira. Regra geral, quan- do se dedicam à orientação vocacional dos alunos, fazem-no essencialmente no 9.o ano e no secundário, actuando por duas vias diferentes, explica a directora do agrupamento de Escolas IBN Muca- na, em Cascais, Teresa Lopes. “Por um lado, orientação vocacional através do SPO; por outro, divulgação”. E nesse âmbito podem existir contactos com as uni- versidades (divulgação, visitas ou feiras de orientação vocacional) e por vezes, mas menos frequentemente, com empre- sas, de modo a conhecer as rotinas das profissões. Eventos como a Futurália e programas como o Braço Direito, da asso- ciação Junior Achievement Portugal (em que o estudante acompanha um dia de um profissional numa área do seu inte- resse) podem ser uma mais-valia.

Seja porque não tiveram o acompanha- mento necessário seja porque ainda não têm maturidade vocacional, existe uma elevada taxa de desistência e mudanças de curso ou área por parte dos estudan- tes. As razões podem ser várias, mas Pau- lo Jesus realça que “o sistema educativo português tem uma estrutura muito limi- tadora, por propor o estreitamento das opções demasiado cedo”.

Olhando para as dificuldades que os alu- nos têm em escolher no 9.o e 12.o anos, “devia-se, por exemplo, manter as Ciên- cias e Matemáticas até ao final do secun- dário para que pudessem escolher qual- quer área na universidade”. Ter mais ofer- tas de cursos profissionais e ainda a possibilidade de personalizar as trajec- tórias são outros caminhos para facilitar a vida aos estudantes. Teresa Lopes acres- centa que o currículo do secundário é “muito redutor”, lamentando o facto de disciplinas como a Área de Projecto (“essen- ciais para desenvolver projectos dentro das áreas vocacionais dos alunos”) terem sido retiradas do programa.

Mas falar de orientação vocacional não é só olhar para o papel do ensino secun- dário, defende Manuel Pereira. “A univer- sidade deveria fazer mais do que simples- mente atirar com a responsabilidade para cima da escola.” Apesar de existirem bons exemplos em algumas instituições de ensi- no superior, a maioria “esteve sempre à espera” que o trabalho fosse realizado ao nível do secundário: “Esta questão é cul- tural, de tradição, e vai acabar por mudar mais cedo ou mais tarde.”