O Porto vai ter um novo mercado: o velho Bolhão. No sítio de sempre, com a gente de sempre. E com a compostura que havia perdido. Agora é que é. Para termos uma parte da alma do Porto lavada de fresco. O projecto apresentado pela Câmara do Porto é uma espécie de back to basics arquitectónico. O Bolhão vai ser o que já foi, com as condições que desde há uns 30 anos se pretendia que tivesse: um mercado de frescos no centro da cidade. Sucede que, tal como ainda está, estava realmente degradado e agoniante.
Não só vinha a deixar de servir o fim a que se propunha, como dava uma imagem pouco condizente com aquilo que o Porto é. O que está previsto para o Bolhão é manutenção. Da traça, do espírito e da função do edifício. Manutenção dos comerciantes, das bancas e das lojas. No fundo, só muda e só se renova aquilo que é mesmo obrigatório – as condições de instalação, de segurança e de acessibilidade, os materiais e o conforto de quem lá trabalha, utiliza ou visita. Não há megalomanias nem excessos criativos. Há um projecto que devolve ao Bolhão a sua beleza, agora em modo século xxi, recuperando décadas de estragos.
O Bolhão representa uma parte do Porto, naquilo que ele tem de autenticidade, de trabalho e de resistência às dificuldades. Só assim se compreende, entrando hoje em dia no Mercado, que ainda lá haja pessoas a trabalhar e a lutar pelos seus negócios, a par de outras que aí vão fazendo as suas compras e que têm nisso verdadeiro prazer. Esta é uma parte da alma do Porto que estava presa por arames, muito apagada e triste. E, se virmos na reabilitação do Bolhão um restauro dessa alma, então temos bons motivos para ficar contentes.
Pode sempre perguntar-se: mas afinal, quantos portuenses costumam frequentar o Bolhão? Quantos se lembram, vagamente que seja, de lá entrar? Genuinamente, parece-me que não muitos. A grande mudança será mesmo essa – voltar a existir no Porto um mercado que é um orgulho da cidade.
Escreve à quinta-feira