Não acabou o curso de Turismo. Vê-se como alguém que foi formada na alta competição. Ser actriz foi uma porta que se abriu. Gosta do que faz mas, se tiver de fazer outra coisa, dará o máximo. Sente-se, sobretudo, bem na sua pele. Os seus medos centram-se no futuro. A violência e a falta de liberdade assustam-na. Diz no fim da conversa que é algo que só vai mudar daqui a 100 mil anos. Descontraída e alegre, Diana Chaves começou por falar na “Primeira Companhia” e de como se sente mais à vontade quando não tem muita roupa.
Desde a sua participação naquele reality show, “A Primeira Companhia”, mudou muito?
A minha vida mudou um bocadinho; eu, não creio que tenha mudado assim tanto. Aquilo que terei eventualmente mudado está mais ligado à passagem do tempo: passou uma década.
Creio que foi em 2005…
Na verdade, mudou muita coisa. A primeira reacção foi dizer que não porque a essência é a mesma, e eu lembro-me de tudo como se fosse ontem. E lembro-me da forma de estar e das preocupações que tinha.
E voltava a participar, se fosse hoje?
Voltava. Adorei. Não tenho vergonha nenhuma. Não foi uma decisão fácil, eu quase que não participei…
Por que razão?
Porque sou muito tímida e, na altura, ainda era mais. E achava que ser filmada o tempo todo, durante não sei quanto tempo, com pessoas que eu não conhecia a não ser da televisão, seria um tiro no pé. “Não, nem pensar, não vou abrir a boca, vai ser horrível e vou querer ir-me embora o tempo todo.” E foi um bocadinho assim nos primeiros dias. Depois comecei a achar graça. Pensei que ia ficar só uma semana, são programas de popularidade. Eu, sendo a única pessoa que não era conhecida, pensei que era a primeira a sair: saía com o dinheirinho e lá ia, toda contente, de volta à minha vida. Mas as coisas mudaram. Comecei a perceber que, não tendo saído na primeira e na segunda, aquilo começava a ganhar alguma graça em termos de estratégia. E eu fiz a minha estrategiazinha, ia fazendo continhas em relação ao dinheiro, o jeito que me ia dar depois, quando saísse de lá. E as coisas mudaram nesse sentido…
E não foi só nisso. Quando saiu à rua, notou a diferença, não?
Pois essa foi uma grande diferença. Enquanto lá estava não tive tempo, nem maneira, de me aperceber. Quase no final, parti um dedo e tive de ir ao hospital, e foi nesse momento que percebi que as coisas estavam muito diferentes: as pessoas chamavam-me pelo nome e falavam de coisas que não seria normal saberem, e isso foi um choque. “O que é que se passa?”, pensava eu. Depois voltei outra vez e fiquei isolada novamente, mas já tinha a noção de que, quando saísse do programa, as coisas iam ser bastante diferentes a esse nível…
Quanto tempo esteve no programa?
Sete semanas. Quando saí dali, foi tudo muito rápido. Recebi logo um convite para fazer um casting para os “Morangos com Açúcar” que eu não quis fazer (risos). Fiquei outra vez a pensar que não conseguia. Mas fiz, depois fiquei e foi por aí fora.
Antes desse começo de aventura, o que queria fazer na vida?
Eu fui atleta de alta competição a minha vida toda. Antes de entrar, tinha deixado de nadar há muito pouco tempo, um mês ou dois. Estava a estudar Turismo. Achava que a minha vida iria passar pelo turismo e pelas viagens. Fui para o turismo para continuar a viajar, viajava muito em competição e queria ter um trabalho que me permitisse continuar. Andava à procura, ia fazendo os meu trabalhinhos, alguma publicidade…
Foi por isso que a foram buscar para o programa?
Não, foi porque, no mês em que estreou a “Primeira Companhia”, eu era a capa da “Maxmen”, que tinha feito através da minha agência, Glam. Já era agenciada por eles e a capa era enquanto atleta.. Como a “Primeira Companhia” tinha essa vertente de tropa e desporto, uma das participantes foi a Dina Pedro, que foi campeã mundial de thai boxing, muay thai e kickboxing. E, imagino eu, à falta de alguém conhecido que quisesse participar e aparecendo eu numa capa, terão pensado em mim.
Não foi complicado para si ser capa de uma revista masculina, não pensou duas vezes?
Não, a minha relação com a falta de roupa é muito boa. Passei a minha vida de fato de banho, até me sentia mais à vontade com pouca roupa vestida.
Um pouco estranho (risos)…
É verdade, porque aquele era o meu habitat natural, sentia-me bem.
Mas não há algumas diferenças entre estar de fato de banho para nadar e ser capa de um revista masculina para ser olhada? Não a incomodava?
Não, porque quando eu estava no bloco, antes de entrar em prova, também tinha muitas pessoas a olhar para mim, e era aí que me sentia confiante, era o meu momento. Se calhar, se me fotografassem com roupa, nem sequer sabia como havia de estar.
Os “Morangos com Açúcar” foram o seu primeiro trabalho de representação. Quando achou que isso fazia sentido, que representar passava a ser o seu habitat natural?
À medida que a timidez foi ficando de parte e que conseguia concentrar-me mais, sentir mais o que fazia, e aperfeiçoar-me, comecei a achar graça. É giro encarnarmos outras vidas, outras pessoas, sermos diferentes do que somos. E, na verdade, os “Morangos” são quase um curso intensivo. Nós gravávamos de segunda-feira a sábado, das oito da manhã às oito das noite, e durante um ano.
Não acha que os “Morangos com Açúcar” não tinham que ver com a realidade, eram umas histórias um bocadinho cor-de-rosa e betas?
Claro que tinha um imaginário muito cor-de-rosa, mas havia um esforço para abordar outras questões. Mas eu tinha já uma idade diferente da maior parte dos meus colegas: a maioria tinha 16 e 17 anos, e eu já tinha 24 anos, tinha uma outra perspectiva. Sempre tive esta postura na vida: enquanto estou a fazer uma coisa, vou tentar fazer o melhor possível e aproveitá-la. Depois logo se vê. Não faço planos a longo prazo.
Quando é que achou que estava a representar, já não apenas porque tinha vencido um concurso, mas porque era a sua vocação?
Fui fazendo outras coisas e achei que era capaz. Na verdade, ainda hoje, a insegurança está muito presente, e penso: “Não estou fazer bem, não estou fazer bem.” Mas com a minha experiência de atleta de alta competição, tendo a reagir bem ao stresse. Mas talvez na novela “Laços de Sangue”, em que eu tinha uma personagem muito mais difícil, com uma carga emocional enorme. Era dramática e dura, chegava a ter 30 cenas em que 25 eram de uma carga dramática muito grande. Foi duplamente difícil: enquanto atleta, fui treinada para afastar a parte emocional e concentrar-me na prática. Independentemente do que está a acontecer na nossa vida, só temos aquele momento para dar tudo por tudo. Na representação, o processo é inverso: tenho de trazer tudo e a emoção toda, e deixar de ser fria. Eu não sou fria mas, nos momentos de tensão importantes, consigo pôr a parte emocional de parte. Na representação, invertia totalmente o que treinei anos: tive de recuperar a emoção e a capacidade de a exprimir.
Há um filme da actriz Charlize Theron em que ela interpreta o papel de uma mulher horrível e alcoólica. Vê-se a representar papéis completamente diferentes do seu registo actual?
Sim, adorava. Seria um enorme desafio. Até hoje tenho feito quase sempre de boazinha. Já fiz uma coisinha em que não era má, mas tinha as minhas razões para ser mazinha. Adorava fazer uma coisa completamente diferente.
Mas é mais interessante fazer papéis de má?
Quando fizemos muitas vezes de boazinha, é interessante fazer um papel diferente. É um pouco libertador. Fazer de louca, qualquer coisa, para conseguirmos sair do registo habitual.
Consegue ver aquilo que faz? Vê as gravações?
É difícil, mas esforço-me por ver para me aperfeiçoar. Mas, às vezes, quando vejo, não gosto muito, sou muito crítica e fico desanimada: “Bolas, poderia ter feito muito melhor.”
As pessoas têm uma certa tendência para pensar que as pessoas que colonizam as revistas sociais vivem num mundo à parte…
Não vivo nada num mundo à parte. Vivo numa realidade igual a toda a gente. Todos os dias faço coisas tão corriqueiras como esta: só depois de adormecer a minha filha consigo tratar da roupa e arrumar a cozinha. São estas coisas práticas que são a vida das pessoas. Depois preparo as coisas para o dia seguinte, para dormir, e ela acorda. Tenho de me organizar para a levar à escola, depois vou a correr para o trabalho. Não há nada de mundo à parte.
Um dia do seu trabalho é o quê?
Se estiver numa novela, é muito mais difícil do que se imagina. São muitas e muitas horas, e depois ainda temos de preparar as cenas para o dia seguinte em casa – isso somado com a logística de uma família. Agora, com o programa “Achas que Sabes Dançar”, o trabalho concentra-se mais no fim da semana. No início, tenho mais tempo.
Quando está a gravar novela não obriga o seu marido a fazer mais tarefas domésticas?
Mesmo sem novela, ele faz também. Ajuda sempre. Nisso há muito bom senso. Enquanto adormeço a Pilar, ele arruma a cozinha, ou vice-versa. Não é tudo para mim. Mas é verdade: com a novela, é preciso ainda mais ajuda.
Recentemente, uma actriz de novelas, Maria Zamora, apareceu morta em casa. Fala-se de violência por parte de um ex-namorado.
Eu li qualquer coisa, mas não vi bem. [Começa a falar do caso com a agente]… A sério, e tinha apresentado queixa? Esses casos impressionam-me e indignam-me muito, até porque, na maior parte, a polícia não faz nada, acha tudo normal. A mim, tudo o que seja um atentado à liberdade, à vida e ao espaço de cada um faz-me imensa confusão. Faz-me mais confusão ainda quando as pessoas fazem queixa e denunciam, e depois não são protegidas.
Acha que em Portugal não se liga muito a estes casos, que vivemos num país em que cerca de 80 mulheres são mortas por ano pelos companheiros, e pouco se faz?
Sim, porque infelizmente vivemos num país um bocadinho machista em que é normal as mulheres serem ameaçadas pelo marido ou porque saem com saias curtas ou vão passear com as amigas. As pessoas pensam que isso é normal. Para mim, é uma violência. Ninguém tem de se sentir mal por sair com uma saia, com uns calções ou até de cuecas, cada um anda como quer. Como é que é possível vivermos num país em que essa pressão, essas coisas são normais? Isso não é normal, cada um tem direito à sua liberdade e ao seu espaço. Num casal também tem de ser assim.
Entrou num filme, como foi?
Foi uma participação muito pequenina num filme do Marco Horácio, há muito pouco tempo.
Não se está a ver a fazer mais isso? Achou graça à diferença do registo?
Sim, mas, nesse sentido, foi mais interessante a série “Sal”, que eu fiz. Foi um registo completamente diferente daquele em que eu tinha participado até hoje. Era uma série cómica, com nonsense, e eu adorei fazê-la.
Já fez teatro?
Entrei numa espécie de musical, ainda associado aos “Morangos com Açúcar” e, para ser sincera, ainda não fiz teatro porque achei que não estava ainda preparada. Há peças mais comerciais em que já podia ter entrado, mas não quero fazer só por fazer.
É de uma geração que, ao contrário da anterior, que veio do teatro, apareceu muito nos “Morangos com Açúcar”. Muitos deles trabalhavam como modelos.
Há essa diferença, mas há uma coisa comum: para representar é preciso muito mais do que ser bonito. O aspecto físico ajuda em todas as áreas, mas não nos mantém durante anos numa profissão, até porque pessoas bonitas há muitas. É preciso mais para continuarmos a ser actores. É um bilhete de entrada, mas é preciso esforço e dedicação, mesmo que não tenhamos o maior talento do mundo. Se algum dia terminar, não tenho medo de trabalhar. Sei que o vou fazer. O meu curso estava voltado para as línguas, tenho aptidão. Não tenho medo de ir trabalhar para qualquer parte do mundo.
É uma pessoa preocupada?
Há questões assustadoras. Tenho uma filha pequena, assusta-me o futuro do país e do mundo e este flagelo que é o terrorismo, o facto de não conseguirmos viver em segurança, já para não falar de problemas sociais e económicos que afligem todas as pessoas. Posso dizer-lhe que, no dia 24 de Dezembro, me penhoraram a conta por uma dívida que não tinha à Segurança Social.
Pode-se dizer que teve menos sorte que o nosso primeiro-ministro (risos).
(risos) Tinha uma dívida dessas e estou a pagar. O que é facto é que me penhoraram a conta por causa de uma coisa que estava paga. Ainda assim, penhoraram-me a conta na véspera do Natal. Agora eu penso, imagine-se que era uma família que só tinha aquela conta: o que faria? É esta falta de cuidado que me deixa indignada e que se reflecte em tudo.