Qualquer desculpa serve para tirar uns dias de férias. Mas nem todos os lugares são um bom retiro. Atenção, caro leitor, se quiser seguir esta proposta pedimos-lhe organização. Tem onde apontar? Então vamos a isso. Marque um voo para Londres e aí alugue um carro por alguns dias. Pegue no mapa e veja qual é o trajecto que melhor se adequa a si, faça contas a gasolina e portagens. Miguel Branco guia-o por seis cidades que influenciaram seis grandes mestres da literatura britânica: Stoker, Orwell, Dickens, Austen, Woolf e Shakespeare. Leve um livro de cada e sinta-se em casa
Whitby. O “Drácula” de Bram Stoker entre as ruínas do mosteiro
Se os vampiros continuam na moda – na televisão, nos livros, no cinema –, devem tudo a Bram Stoker. Embora não tenha sido ele a inventá-los, pois há registos destas criaturas antes de 1897, data da edição de “Drácula”, é com o autor inglês que ganham notoriedade. O clássico que inspirou milhões foi idealizado por Stoker nesta pequena cidade costeira no North Yorkshire, Norte de Inglaterra. Mas o local de eleição do escritora era o Mosteiro de Whitby, hoje em ruínas. A literatura sempre esteve por estas bandas, já que o primeiro poeta inglês de quem se conhece o nome, Caedmon, viveu no Mosteiro, onde cuidava de animais, durante o século vii. Whitby é conhecida ainda pela sua tradição turística bem como pela indústria mineira. Um dos locais que pode escolher para dormir é o The Bay Royal Hotel, onde se acredita que Stoker tenha escrito grande parte do livro.
Jura. A ilha de George Orwell, perdão, Eric Blair
Na costa oeste da Escócia existe uma ilha com desfiladeiros que cortam o vento e enormes vales com histórias por contar. A mão de George Orwell veio mesmo a calhar para estas contas. Foi neste lugar, com pouco menos de 200 habitantes, que o escritor inglês passou os seus últimos três anos de vida. Em luta contra a tuberculose, perdeu a paciência para grandes cidades como Paris e Londres, isolou-se num recanto de beleza ímpar e terminou a sua obra “1984” numa casa familiar que acolhe os aventureiros solitários que embarcam na ilha. Barnhill de seu nome, foi o lugar onde Orwell se instalou, apesar de os seus habitantes o conhecerem pelo seu nome verdadeiro, Eric Blair. Os donos são os mesmos e o ambiente rústico mantém-se, e é uma bela opção para ficar, a não ser que queira acampar. Alugue um barco e dê uma volta completa à ilha.
Broadstairs. A casa de férias de Dickens
130 quilómetros a sudeste de Londres encontra-se a cidade a que Charles Dickens se referiu como “o nosso balneário inglês”. Broadstairs deve ser dos poucos lugares do Reino Unido onde efectivamente se pode aproveitar a praia com algumas condições – não espere temperaturas como as que aqui encontra. Além disso, é por aqui que existe a Dickens House, onde o escritor encontrou inspiração para a casa de Betsey Trotwood no seu grande sucesso “David Copperfield”. Muitos chás foram tomados pelo inglês nesta morada que hoje é um museu com todo o tipo de recordações – pelo que deve valer a pena passar por aqui. Para dormir escolha a Bleak House e evite os resorts de grande dimensão. A vista para o mar está lá à mesma e sempre pode dizer que pernoitou num lugar onde Dickens escreveu muitos das suas obras.
Bath. As termas do orgulho de Jane Austen
De 1801 a 1806, Jane Austen fez de Bath, uma cidade termal a duas horas de Londres, sua residência oficial. Diz-se que Bath foi criada pelos romanos, já que encontraram uma água com propriedades milagrosas. Lendas à parte, a verdade é que a cidade não pode ser afastada da vida e obra da autora inglesa. É em Bath que decorre o enredo de “A Abadia de Northanger”, que foi publicado postumamente em 1817. Em 2013, Bath assinalou os 200 anos de “Orgulho e Preconceito” com uma série de eventos singulares – com roupas a rigor – a relembrar o século xix. Não abandone Bath sem conhecer o n.o 4 de Sydney Place, um apartamento do século xviii onde Austen viveu por pouco tempo. Agora tem plasmas, internet e tudo o que os séculos xviii e xix não conseguiam oferecer. Ainda assim, pisámos o mesmo chão que Austen. Não é suficiente?
Lewes. Quem tem medo compra a casa de um monge
A cidade de Lewes, no Sussex, Sul de Inglaterra, é hoje conhecida pelo mercado e pelo castelo, bem como pelas importantes descobertas arqueológicas feitas no local. Indiferente a isso, ou talvez não, a escritora Virginia Woolf apaixonou-se pela cidade e em 1919 comprou a casa de um monge que ficaria para a história como Monk’s House. A pomposa habitação serviu de casa de férias – ou somente de refúgio, de incubadora criativa – a Virginia e ao seu marido, Leonard, jornalista de profissão. Mas não só. O grupo de Bloomsbury fazia retiros em Lewes e há registos de que T. S. Eliot, Roger Fry e E. M. Forster foram visitas regulares do casal Woolf. Mostre que não tem medo de Virginia Woolf, comoEdward Albee não teve quando o escreveu em 1962, e passe por Lewes para conhecer os cantos desta casa. O monge agradece e Virginia também.
Stratford-upon-Avon. Shakespeare por toda a parte
A 23 de Abril de 1564 nascia em Stratford-upon-Avon aquele que seria o expoente máximo da literatura inglesa de todos os tempos. A cidade natal de William Shakespeare fica a menos de uma hora de Birmingham e albergava, em 2001, quase 24 mil habitantes. Convém dizer que toda a atracção turística em seu redor – acolhe 3 milhões de visitantes por ano – é culpa de William Shakespeare, ou da sua mãe, que o trouxe ao mundo por estas bandas. A casa onde este nasceu é de visita obrigatória. Ali vai encontrar marcas de tudo, desde o nascimento do autor até praticamente à sua morte, em 1616. Tudo aqui é Shakespeare. Ora veja-se o nome do maior hotel da cidade: The Mercure Stratford-upon-Avon Shakespeare Hotel. Tudo organizado para se recordar de Shakespeare em cada lance de escada, no seu espelho da casa de banho. Shakespeare é intemporal, por isso também Statford-upon-Avon.