Ao telefone acontece mais ou menos a mesma coisa que em disco: ela diz o que tem a dizer, nem por isso fala muito, mas mesmo quando parece ser a pessoa mais frágil do mundo, caros amigos, que ninguém caia no engodo, tudo isto é atitude. "Burn Your Fire For No Witness", o novo álbum de Angel Olsen, abre sereno, só com a artista e a sua guitarra, sem grandes ondas. Mas a canção tem por título "Unfucktheworld", um "deixem-se de tretas" mansinho que quase nos engana no seu jeito de fábula indie-rock. No início da nossa conversa, Angel diz: "Se quiseres, tudo o que ouves no disco pode ser a minha história de vida, o meu mau feitio". Depois ri-se. Já ganhou.
"Mas se não quiseres podes construir histórias. Eu gosto de construir as minhas", continua. Angel não gosta de revelações, pelo menos não directas. Até porque se não as assumir tudo vai correr melhor em palco. "Ao vivo estou muitas vezes sozinha mas sem problemas. É um concerto, não é terapia." Pois não, mas as canções são quase todas sobre dar a volta, não olhar para trás, esquecer quem não já não faz parte das contas e mandar quase tudo à merda. "São, é verdade [boa, acertámos], mas esses são os temas que dão boas canções, que fazem com que os que escrevem e os que ouvem se concentrem naquele momento, naqueles curtos minutos."
E ainda que Angel Olsen já não passeie sozinha, é sempre ela e a sua escrita que estão no centro da acção. O novo álbum tem dentro de si uma banda de corpo inteiro, mas há aqui uma patroa, que diz-nos não ver nada mudado a não ser o som, "mais forte, mais alto, mais duro, mais tudo, era o que procurava, precisava que tudo fosse maior". Correu-lhe bem o plano. "Burn Your Fire For No Witness" já é o melhor conjunto de canções que Angel Olsen alguma vez fez. E se superar o feito, 2014 vai ser o ano em que tudo mudou. Não lhe falta nada nem ninguém
Marcha atrás: antes de trabalhar por conta própria, Angel fez parte de outras equipas, como a que Will Oldham levava pela estrada sempre que vestia o nome Bonnie "Prince" Billy. "Aprendi muito, é difícil explicar o quanto aprendi durante esse tempo, mas sempre soube que essa era apenas uma etapa", conta. Uma decisão mais que acertada e que deu primeiro num EP, "Strange Cacti" (2011), e depois num álbum de corpo cheio, "Half Way Home" (2012). Nessa altura, Angel afirmou por várias vezes que poucos foram os que lhe prestaram atenção, a ela e a o seu trabalho. Perguntamos-lhe se é "Burn Your Fire For No Witness" que vai mudar tudo isso. "É capaz, pelo menos até ao momento não me posso queixar do tempo de antena que tenho tido e das notas que os críticos me têm dado." Porque apesar da pose não-estou-nem-aí-para-quase-nada, é bom saber o que dizem de nós, não é? "Se agora dissesse que não isto não faria grande sentido." É, não faria. Mas ao que parece há sempre tempo para descobrir novidades na mente de desconhecidos. "Percebi há poucos dias que a Wikipedia tem uma entrada sobre mim. A Wikipedia!" E o que está por lá escrito? "Angel Olsen, americana, cantora e guitarrista de indie-rock." Tudo em bom, portanto. "Sim, gosto, fica-me bem, é uma frase que não compromete mas que também não faz estragos."
Verdades. Mas não explica que Angel Olsen é um cruzamento improvável entre a alucinação de Grace Slick e a elegância de Joni Mitchell – dizemos nós, claro. E que também canta coisas à maneira de um Johnny Cash menos rouco ou de um Roy Orbison com mais lata para dizer o que politicamente não é correcto. No meio de tudo isto, Angel é nome artístico ou nem por isso? "Nem por isso, é mesmo o meu nome." Certo, só para confirmar.