Lei “absurda” obriga ao fecho de “A Casa Portuguesa” em Barcelona


Uma “lei absurda” sobre o uso de espaços comerciais no distrito barcelonês de Gracia vai obrigar ao fecho, no fim de semana, sete anos depois da inauguração, da loja “A Casa Portuguesa”, disse à Lusa um dos proprietários. Termina assim um processo de luta de mais de dois anos contra o polémico plano de usos…


Uma “lei absurda” sobre o uso de espaços comerciais no distrito barcelonês de Gracia vai obrigar ao fecho, no fim de semana, sete anos depois da inauguração, da loja “A Casa Portuguesa”, disse à Lusa um dos proprietários.

Termina assim um processo de luta de mais de dois anos contra o polémico plano de usos aplicado pelo distrito municipal de Gracia e que, segundo Pedro Ramos, discrimina entre comerciantes no bairro, dependendo da idade das suas licenças, e entre estes e outros “uma rua ao lado”, já noutro distrito.

Ramos afirmou que a decisão de fechar – exatamente no domingo, quando a loja instalada na rua Verdi cumpre sete anos de vida – é irrevogável e que, mesmo que no futuro a lei mude, a “Casa Portuguesa” não voltará àquele espaço.

“Gracia é um mundo aparte em Barcelona. Tem muita independência. Dentro da independência tem ainda mais independência”, disse, referindo-se à lei de 2006 que proibia qualquer estabelecimento alimentar de ter degustação no local.

“É um contrassenso. Temos uma licença de pastelaria, mas os clientes não podem lá comer os bolos. E temos licença de vinho mas não podem lá beber”, explicou.

A legislação agravou-se há dois anos, obrigando os estabelecimentos nesta situação (sem degustação), e com exceção das pastelarias, a fecharem às 23:00.

“Como temos duas licenças, uma de pastelaria e outra de venda de vinhos, uma tinha que fechar às 11 e a outra não. Ficávamos num limbo”, afirmou.

Começou uma fase complicada com visitas da Guarda Urbana e dos inspetores distritais, o que, apesar de processos judiciais e recursos administrativos, não impediu o fecho temporário. Só puderam reabrir depois de retiradas as mesas e cadeiras do local.

Os proprietários regressaram à luta, com uma recolha de assinaturas e a constituição de uma associação de comerciantes afetados, pressões que parecem estar a ter resultados: a lei está a ser revista, mas o processo é complicado e pode demorar, já que se requerem 75% de apoio.

Um prazo demasiado longo para “A Casa Portuguesa” que, caso permanecesse aberta – “não pretendíamos mudar o conceito do espaço” –, poderia levar a mais encerramentos forçados ou a multas que podem ascender aos 60 mil euros.

“Já estamos novamente com um processo de encerramento. Podíamos voltar aos tribunais, mas os advogados acham que no final perderíamos porque a lei que existe é esta”, afirmou.

“O risco de continuar a luta com aquilo aberto é muito grande. Pode pôr em causa toda a empresa”, acrescentou.

Pedro Ramos recordou que a lei só se aplica a quem tenha solicitado as licenças depois de 2005 — criando assim concorrência desleal entre os comerciantes da zona — e não se aplica nas outras zonas da cidade.

“Duas ruas abaixo já se pode servir no interior. É um absurdo mas é a lei. Como muitas outras leis absurdas. Temos que nos sujeitar”, referiu.

Desaparece assim um espaço que durante vários anos se consolidou quase como um oásis português no meio culinário e cultural de Barcelona.

Referência na cidade, foi um espaço não só de gastronomia e vinhos, mas de apresentação da cultura e artes portuguesas, seja música, cinema, pintura ou literatura.

Pelo espaço, logo nos primeiros tempos, passaram nomes como Jorge Palma, os The Gift ou os Terracota, livros de José Luis Peixoto e de Teresa Rita Lopes, ou curtas-metragens de jovens realizadores portugueses que vivem em Barcelona.

O projeto continua, para já, através de um espaço aberto em meados do ano passado, noutra zona de Barcelona, e pode, eventualmente — “se a lei mudar e quando mudar” –, através de um espaço hoje usado para a produção, também permanecer no bairro de Gracia, zona por vezes comparada ao lisboeta Bairro Alto.

*Este artigo foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico aplicado pela agência Lusa