As amizades nem sempre são fáceis. As que começam de forma imposta e com desconhecidos passam sempre por uma fase de desconfiança e vergonha, que podem deixar marcas. Mas desde 2003 que o Festival Temps d’Images se dedica a reunir os amigos mais improváveis com sucesso. Performance e teatro, bailado e cinema, artista e público. Concebido pelo canal televisivo ARTE France, a pluridisciplinaridade e o cruzamento de linguagens encontrou morada nas instituições lisboetas. A criação nacional foi a feliz testemunha que soube presenciar 200 projectos de fusão e aceitar o Temps d’Images como um património irrefutável. “O objectivo continua a ser o mesmo, a criação de uma rede europeia de confronto artístico”, explica António Câmara, o director artístico do festival desde a sua fundação. “Todos estes projectos só são possíveis dentro de um terreno de total liberdade e nada teria acontecido sem a solidariedade das nossas instituições culturais.” Em 2003 o festival estreou-se em Lisboa apenas no Centro Cultural de Belém e na Cinemateca. A edição deste ano apresenta 14 programadores distintos a gerirem 12 espaços. Entre os destaques deste ano estão a exposição de Gerard Byrne “Imagens ou Sombras” na CAM (Inauguração hoje) e o concerto dos OqueStrada no Teatro São Luiz (20 de Dezembro, 21 horas).
“Apesar da crise tenho grande esperança pela continuidade”, reflecte António. Para celebrar os dez anos pedimos ao director artístico que destacasse dez espectáculos marcantes, um por cada ano de vida.
2003 “Na nossa primeira edição começámos por juntar o cineasta Pedro Costa ao coreógrafo João Fiadeiro. Da relação resultou o filme ‘The End of The Love Affair’, que este ano é apresentado no Doclisboa. O projecto foi pensado para um filme que unisse duas linguagens e agora é apresentado como uma instalação. Esta mutação dos projectos no Temps d’Images agrada-me muito.”
2004 “O Museu do Chiado juntou-se a nós e fizemos uma primeira tentativa em instalação de vídeo da Luciana Fina. Ela fez uma montagem vídeo num tríptico com a actriz Carla Polido. Foi a nossa primeira intervenção num espaço museológico. A obra ainda hoje circula pelo mundo fora.”
2005 “Ainda no Museu do Chiado, conseguimos fazer uma colaboração com a galeria Marian Goodman e trazer William Kentridge. Ele trouxe para o museu ‘Journey to the Moon’ uma instalação gigantesca. Com um custo bastante baixo, trouxemos para o festival um artista seminal das artes plásticas.
2006 “A colaboração desta vez foi em ‘Silêncio’, onde juntámos a coreógrafa Clara Andermatt e o cineasta francês François-Jacques Ossang. Sempre num diálogo da imagem com o movimento, fizemos um filme desse espectáculo que foi apresentado em Cannes e ganhou o prémio de melhor curta-metragem.”
2007 “Antes de ficar conhecido como o realizador de ‘José e Pilar’ (2010), juntámos o Miguel Gonçalves Mendes à coreógrafa Vera Mantero. Juntos fizeram dois filmes que ainda circulam em exposições e no cinema. O ano passado foram apresentados em Porto Alegre, no Brasil.”
2008 “Criámos uma secção competitiva de documentários dentro do festival apenas sobre linguagens artísticas. O Instituto do Cinema e do Audiovisual financiou o festival e provavelmente ainda é o único festival de cinema exclusivo da temática da arte, pelo menos na Europa.”
2009 “Desta vez quisemos confrontar o teatro do Pedro Gil com o universo da cineasta Cláudia Varejão. O resultado foi “Às Vezes as Luzes Apagam-se”. Foi um momento muito marcante, o espectáculo foi protagonizado apenas por adolescentes. O mundo da adolescência foi completamente desnudado, por adolescentes que nunca tinham sequer pisado um palco.”
2010 “O nosso projecto mais arriscado foi neste ano, quando juntámos a grande violoncelista Irene Lima à coreógrafa Olga Roriz e à Cláudia Varejão. Elas tiveram apenas seis dias para preparar um projecto e nesses seis dias o espectador podia assistir à evolução do projecto desde o início.”
2011 “O que mais me emocionou no ano passado foi o espectáculo ‘Play, The Film’ de André Godinho com o Cão Solteiro. A peça consistia na projecção de um filme dos anos 30 que assinalava a passagem do mudo para o sonoro.”
2012 “Este ano o destaque a não perder é o “Ich Sah: Das Lamm auf dem Berg Zion”, no próximos dias 26 e 27 de Outubro no Teatro Maria Matos, em Lisboa. O coreógrafo Va Wölfl juntou 17 bailarinos para abordar o tema do apocalipse. Além do palco, a própria plateia é uma instalação do artista. O texto adequa-se muito bem aos tempos que vivemos.”