Mais tempo? PSD diz que não pede, mas quer


O dilema do PSD e do governo é só um: como pedir mais tempo sem pedir? Ou por outras palavras: como pressionar a troika a dar mais tempo para a consolidação orçamental sem que pareça falha do governo? Se até aqui o quebra-cabeças ficava fechado nas sedes do governo e do PSD, agora já poucos…


O dilema do PSD e do governo é só um: como pedir mais tempo sem pedir? Ou por outras palavras: como pressionar a troika a dar mais tempo para a consolidação orçamental sem que pareça falha do governo? Se até aqui o quebra-cabeças ficava fechado nas sedes do governo e do PSD, agora já poucos escondem que uma maior flexibilização por parte das instâncias internacionais dava jeito para se manter o consenso interno (coligação com o CDS) e a paz social. Ontem, o deputado Miguel Frasquilho disse-o com todas as letras e Eduardo Catroga também: Portugal precisa de mais dois anos.

A credibilidade externa conquistada é aliás o trunfo que o PSD joga para cima da mesa. “Penso que seria justo a troika reconhecer o trabalho de casa que o governo tem feito e premiar com uma flexibilização de prazos que não impusesse mais austeridade aos portugueses”, defendeu ontem o vice-presidente da bancada social-democrata Miguel Frasquilho. O deputado não defende mais tempo para desculpar as falhas na consolidação, mas mais tempo para que Portugal continue a ser financiado, a “ponte” de regresso aos mercados já admitida pelo Comissário Europeu Olli Rehn. E o PSD apressou-se a dizer que afinal, o que o deputado defende está “inscrito” nas “orientações” do partido. O líder parlamentar Luís Montenegro lembrou até que o PSD sempre alertou para o facto de se “por razões externas, algum dia se colocasse essa questão, ela teria que ser vista pelos nossos parceiros atendendo ao comportamento que tínhamos tido”.

Mas ontem ao fim do dia surgiu uma voz de peso contra: António Borges, conselheiro do governo e também ex-director do departamento europeu do FMI. Borges diz que “seria muito pouco vantajoso para Portugal” pedir um adiamento. “Seria até uma grande decepção. Pode vir a acontecer, por razões que muitas vezes estão fora do nosso controlo, mas seguramente esse não é o plano”, acredita.

Mas a posição dos sociais-democratas mudou. Quatro avaliações positivas debaixo do braço e uma execução orçamental que revela falhas do lado da receita, pondo em causa o défice, são argumentos para a pressão sobre os parceiros. A que se juntam outras: “o resultado do Conselho Europeu e as condições dadas a Espanha levam ao debate sobre uma maior flexibilização, mas não é pedir. Se a troika entender que o caminho é a flexibilização, mas nós não pedimos”. A frase é da a vice-presidente do partido Teresa Leal Coelho em declarações ao i. Também o deputado Campos Ferreira, afirma ao i que o “ajustamento” ao Memorando deve de ser feito “pela via do cumprimento” e que, além do prolongamento do prazo, esse ajustamento pode ainda trazer “melhores condições”.

A orientação para uma maior liberdade em falar em mais tempo foi dada pelo próprio primeiro-ministro que na semana passada foi o primeiro a abrir a caixa de Pandora e a deixar em aberto a possibilidade de Portugal ter mais tempo para consolidar as contas. Mas no dicionário político social-democrata, falar do assunto não significa pedir mais tempo. A estratégia é explicada pelo homem que negociou o Memorando pelo PSD: “A própria troika é que vai fazer os reajustamentos no seu programa porque definiu objectivos para 2012 – e o governo do PS que aceitou – com base em dados imperfeitos de 2010 e na estimativa para 2011”, disse Eduardo Catroga à Rádio Renascença. O ex-ministro das Finanças concorda com Frasquilho e traça um novo calendário: “Tecnicamente devia ser mais um ou dois anos, desejavelmente dois anos.”

Em termos formais o PSD insiste no discurso de que há riscos, mas que o governo está “empenhado na concretização dos objectivos para que consiga sair da ajuda externa o mais rapidamente possível”, disse ontem o primeiro vice-presidente do partido, Jorge Moreira da Silva.

Culpa da troika Fonte da direcção da bancada do CDS diz ao i que a iniciativa de alargar o prazo do Memorando tem de partir da troika até para que esta faça a “mea culpa”. “Portugal fez tudo o que as instâncias pediram mas algo falhou e por isso algo na receita que nos deram estava mal”, explica a mesma fonte. Publicamente o CDS não tem aparecido a pedir mais tempo, nem mais dinheiro, mas tem feito avisos à coligação: não há espaço para mais austeridade. E caso seja preciso tomar outras medidas, a solução não passa, na opinião do CDS, por mais aumento de impostos.

A oposição aproveitou as declarações de Frasquilho para cavalgar a onda do “falhanço” das políticas do governo. “O falhanço da política [do governo] e o não terem feito a tempo o que nós sugerimos leva agora a que não tenham outra alternativa”, considerou o líder parlamentar do PS, Carlos Zorrinho. Já para o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, diz que pedir mais tempo à troika pode “adiar” o problema mas não o resolve.