Europeu-2020. Cuidado! Nunca desprezes a serpente…

Europeu-2020. Cuidado! Nunca desprezes a serpente…


Depois dos testes frente à Espanha (0-0) e contra Israel (4-0), Portugal entra em campo na próxima terça-feira, no Estádio Ferenc Puskás, para defrontar a Hungria, um adversário contra o qual nunca perdeu – nove vitórias e quatro empates…


Portugal cumpriu pacatamente os seus dois jogos de preparação para a estreia do Europeu, em Budapeste, face à Hungria, na próxima terça-feira, 17h00 de Lisboa, empatando aborrecidamente em Madrid com a Espanha (0-0) e devolvendo, em Alvalade, os quatro golos com que os israelitas nos tinham despachado em Telavive, na fase de apuramento do Mundial-82 (4-1 para eles lá, nessa altura; 4-0 para nós cá, anteontem) e agora basta ir contando as horas para mais uma estreia numa fase final do um Europeu, a sétima consecutiva, algo que nos deve deixar com uma pontinha de orgulho, mas não retirar do foco principal que, apesar de tudo, o sorteio nos obrigou a defrontar a Hungria na sua própria casa, o Estádio Ferenc Puskás, que alberga qualquer coisa como 57 mil espetadores e não está sujeito às restrições da pandemia, tal como acontece em outros sítios onde iremos jogar.

Podemos dizer que, hoje em dia, esta Hungria já não é de meter medo a (quase) ninguém, longe que está daquele brilho que cegava na primeira metade dos anos 50 quando cometeu a barbaridade de estar cinco anos e meio (4 de julho de 1950 a 19 de fevereiro de 1956) sem conhecer uma derrota, somando 42 vitórias e sete empates até, finalmente, se ver batida no Jogo Impossível (O Milagre de Berna), a final do Campeonato do Mundo e 1954, disputada na Suíça, pela Alemanha Ocidental (2-3), Alemanha essa que desmembrara sadicamente na fase de grupos por 8-3 e vencera recentemente, num particular, por 5-0.

Os astros alinharam-se contra os Mágicos Magiares e tiraram-lhe a Taça Jules Rimet que tudo tinham feito para merecer. Mas o tempo passou, entretanto, milhões de hectolitros de água correram sob a ponte de Margit, que une Buda a Peste, e os húngaros até se tornaram, para nós, portugueses, adversários simpáticos, podendo mesmo acrescentar-se que um tudo nada submissos.

 

Zero!

Desde o dia 27 de dezembro de 1926 que Portugal e Hungria se defrontam, seja em desafios particulares seja em jogos oficiais, somam um total de 13 frente a frente, e o facto, puro e duro, aí espetado no meio da prosa como um estandarte da memória para que jamais alguém se esqueça. é que nunca os húngaros nos venceram. Desses 13 jogos, nove são vitórias lusitanas e ficam a restar quatro empates, o último dos quais durante a fase inicial do Europeu francês do nosso contentamento. Já depois disso, em março e dezembro de 2017, na fase de qualificação europeia para o Campeonato do Mundo de 2018, na Rússia, dois jogo e duas vitórias da equipa dos cinco escudos azuis: 3-0 e 1-0.

Claro que esta soberana superioridade portuguesa tem de ficar longe da cabeça dos jogadores quando entrarem em campo na terça-feira. Como dizia o célebre provérbio chinês, do alto da sua milenar sabedoria: “Nunca desprezes a serpente. Quem sabe se um dia se transformará num dragão?”

Imagine-se, a propósito, que neste grupo tremendo – que junta o Campeão do Mundo com o Campeão da Europa mais a Alemanha que geralmente tudo pode e a caseira Hungria -, que os húngaros já têm encasquinado nas suas cabeças duras, herdadas dos seus antepassados vindos do leste e aos quais chamavam o povo dos magiares, que perante os problemas que os assoberbam a vitória no jogo inaugural é a chave que abre o cofre da sua manutenção na prova. Ou seja, para eles, o embate contra os portugueses torna-se numa espécie de tudo-ou-nada onde assentará o seu futuro num Europeu que também é muito deles. São contas fáceis de fazer, pelo menos em relação aos dois qualificados diretos – dois primeiros lugares – mas já não tão fáceis em relação aos melhores terceiros que continuarão a ter a sua oportunidade de lutar pela Taça Henry Delaunay tal e qual aconteceu connosco há cinco anos, chutado que foi o Europeu de 2020 para 2021. Tenderão a olhar para este encontro, os lusitanos mais otimistas, como o “jogo-para-ganhar”, ficando a seleção em seguida dependente apenas de um empate contra um dos dois monstros que sobra. O otimismo cega e distorce a realidade, mas neste caso não deixa de ser uma visão correta dos acontecimentos. Para portugueses como para húngaros, a vitória deixará sempre um traço de vantagem sobre franceses e alemães que, jogando uns contra os outros, ou perdem dois pontos ambos, ou perde três pontos um deles.

A fase de grupos de um Mundial ou de um Europeu (sobretudo de um Europeu por via da atual regra dos melhores terceiros) transformou-se num quadro de lousa onde todos vamos fazendo as nossas continhas de merceeiro com a prova dos nove logo ali ao lado. Para Portugal a ligeiríssima vantagem de nunca ter sido derrotado pela Hungria. Mas também não nos cruzámos no tempo em que a sua formidável equipa dominava o mundo…