Por uma nova primavera na justiça, por uma justiça que honre Abril! Estas duas “reivindicações” proferidas hoje na Gulbenkian no âmbito da conferência “A Justiça antes e depois do 25 de Abril” mais parecem palavras de ordem repetidas numa manif no dia anterior à revolução. Quem as profere é Henrique Araújo, presidente do Supremo Tribunal de Justiça num acontecimento inédito que reúne a quadratura dos tribunais superiores.
Depois de recordar os principais “marcos legislativos” positivos depois de 1974, Henrique Araújo lamentou os “períodos de absoluto alheamento ou de mera atividade de gestão corrente, sem qualquer ação prospetiva”. Exortou então o poder político a pôr os olhos no futuro e agir, fazendo um novo Abril na Justiça: “As intermitências da atuação política num domínio tão fundamental para a vida dos cidadãos e para a democracia, conduziram-nos a um presente em que já não é possível disfarçar as vulnerabilidades do sistema. Tenho-o dito muitas vezes, mas as minhas palavras têm esbarrado na espessa camada da indiferença. Por isso, repito: é urgente colocar a Justiça como prioridade da atuação política!”.
O presidente do Supremo sintetizou as prioridades: “Fortalecimento da independência do poder judicial e níveis de transparência da sua atuação; modelo de financiamento do sistema de justiça; concretização da autonomia administrativa dos Tribunais da Relação; eficácia e celeridade processuais; formação de magistrados; assessorias; acesso à justiça; monitorização do impacto da produção legislativa; dignificação e valorização das carreiras dos oficiais de justiça e funcionários”. Tudo isto “com diálogo e abertura, empenho e espírito de compromisso, rigor e competência”.
Também o presidente do Tribunal Constitucional (TC) fez um flasback histórico e, num tom revolucionário noivo do espírito da época, recordou a Constituição de 76, “um corolário da revolução democrática e humanista, que nos libertou da mais velha ditadura da Europa”.
Para o juiz conselheiro José João Abrantes, essa Constituição, de que o TC é o “guardião”, tem como “missão e razão de ser defender uma Lei Fundamental centrada na dignidade da pessoa humana, o primeiro e o mais imprescritível dos valores do Estado de direito democrático”.
“Essa pessoa humana não é uma abstração, são seres humanos, mulheres e homens concretos, inseridos numa sociedade, onde há tensões e contradições, onde existem muitas potenciais ameaças à liberdade e à dignidade dessas concretas pessoas”, acrescentou.