Há quem acredite e defenda que, muitas pessoas, são conquistadas pela boca. A verdade é que a gastronomia diz muito sobre a cultura de um país. Passando pelas suas origens, mergulhando na contemporaneidade e visionando o futuro. Nesse campo – tal como em muitos outros –, Portugal tem-se destacado e a última cerimónia de entrega das novas estrelas Michelin, voltou a prová-lo. A mais recente edição do guia gastronómico foi apresentada em Toledo, Espanha. Agora, há mais cinco restaurantes em Portugal que passaram a constar no Guia vermelho de 2023 com uma estrela. Porém, a grande novidade da noite foi a conquista da independência do país. Ou seja, ao fim de inúmeros anos (os prémios foram criados em 1900 por André Michelin, um industrial francês fundador da Compagnie Générale des Établissements Michelin, fabricante de pneus mais conhecida como Michelin), Portugal terá finalmente um guia próprio. Durante o evento, Gwendal Poullennec, Diretor Internacional dos Guias Michelin, anunciou que a seleção de restaurantes de Portugal e Espanha para a edição de 2024 será realizada em dois eventos diferentes, um para Espanha, e, pela primeira vez, outro apenas para Portugal.
Novas estrelas
O primeiro a subir ao palco foi o famoso chef José Avillez, juntamente com o chef José Diogo, responsáveis pelo restaurante Encanto, na capital, que se torna assim no primeiro vegetariano em território nacional a merecer a distinção. A distinção foi acrescentada às duas que o Avillez já possui e que tem mantido: no Belcanto, em Lisboa, e outra na Tasca, no Dubai.
Seguiu-se o chef Paulo Alves, do restaurante lisboeta Kabuki, e o chef Paulo Morais, do japonês Kanazawa.
Já a Norte, na cidade invicta, o Euskalduna Studio, do chef Vasco Coelho Santos, e o restaurante Le Monument, comandado pelo chef Julien Montbabut, acabaram por fechar a lista das cinco novidades portuguesas no Guia Michelin de 2023 – mesmo número de restaurantes da edição anterior.
Estrelas Verdes
Além disso, o restaurante Mesa de Lemos, em Viseu, que detém uma estrela Michelin, recebeu a Estrela Verde. Atribuída pelo terceiro ano consecutivo, esta distinção destaca os restaurantes que estão «na vanguarda da gastronomia sustentável».
«Os restaurantes distinguidos pelo Guia Michelin com a ‘estrela verde’, estão a liderar um exemplo e têm um impacto real na sociedade», defendeu Gwendal Poullennec, em entrevista à Lusa.
Aliás, mundialmente, o Guia Michelin, que está presente em 40 países, recomenda cerca de 16 mil restaurantes. Destes, cerca de 400 exibem a dita “estrela verde”. Segundo o responsável, o impacto tem sido «surpreendente».
Estes restaurantes em questão «estão realmente a liderar o caminho para uma abordagem mais sustentável da gastronomia» e a distinção tem contribuído «para a mudança das práticas e iniciativas inovadoras», frisou Poullennec destacando ainda que a abordagem do Guia Michelin é positiva: «Dizemos: aqui estão os melhores. Se quiser inspirar-se, veja o que eles fazem bem». «Estou realmente impressionado com o impacto. Foi muito além das minhas próprias expectativas. Não mudámos a nossa abordagem, os chefs é que estão a mudar o seu jogo», explicou, acrescentando que estes «estão muito mais empenhados». «Estão a mudar a sua mentalidade e estão também a criar consciência, para além da gastronomia», referiu ainda.
No que toca aos inspetores responsáveis pela avaliação dos restaurantes, segundo a mesma agência de notícias, estes têm em conta, entre muitas coisas, «a redução do desperdício alimentar e do consumo de energia» ou «o abastecimento de produtos». «Os inspectores anónimos no terreno devem ter uma experiência verdadeiramente sustentável. Isso significa que não é apenas a visão de chef executivo, mas que se estende também a todo o pessoal e aí sabe-se que se está no centro de tudo o que eles fazem. Não é uma iniciativa de marketing. Não se trata apenas de técnicas, mas sim de todo o projecto», esclareceu Poullennec.
Atualmente, Portugal detém três “estrelas verdes”, nos restaurantes Mesa de Lemos (Passos de Silgueiros, uma estrela Michelin), Il Galo d”Oro (Funchal, duas estrelas Michelin) e Esporão (Reguengos de Monsaraz, uma estrela).
O 1º evento em Portugal
Relativamente a 2024, o responsável explicou que com a organização de um evento próprio em Portugal, a revelação da seleção de restaurantes, e a consequente implementação de conteúdos editoriais e de comunicação, que serão partilhados nas diferentes plataformas, «queremos contribuir para a promoção de Portugal como destino gastronómico europeu incontornável». «A Michelin está grata pelo apoio institucional a esta iniciativa e já está a trabalhar com o Turismo de Portugal na organização desta gala. As datas específicas e o local serão revelados durante o primeiro trimestre de 2023», sublinhou a organização do Guia Michelin.
De acordo com a Lusa, ainda na distinção de restaurantes portugueses, na categoria Bib Gourmand – que distingue a melhor relação qualidade/preço – há mais restaurantes portugueses que passam a integrar o Guia Michelin 2023.
Placa Bib Gourmand
Em Lisboa, os restaurantes Carnal, o Oficio e o Zunzum Gastrobar Lisboa passam a ter a placa de Bib Gourmand do Guia Michelin à porta. Já no Porto os distinguidos foram o restaurante Gruta e o Semea by Euskalduna. Em Vila do Conde, o restaurante Rio by Paulo André e, por fim, no Algarve o À Mesa, em Tavira. Ou seja, neste momento, no total, Portugal tem agora 48 restaurantes com esta distinção.
Em 1889, André e Édouard Michelin, dois irmãos e empreendedores franceses, fundaram uma empresa de pneus, chamada Michelin. Onze anos depois, e tendo em conta o crescimento da indústria do turismo, decidiram criar um guia que classificasse hotéis e restaurantes. Os dois viam-no como «uma forma de dinamizar as viagens automóveis e a venda de pneus». Portugal, em particular, tem restaurantes no Guia Michelin desde 1910 (ano da primeira edição da publicação no nosso país).
Uma curiosidade é que, até hoje, desconhecem-se os critérios utilizados pelo Guia Michelin para a escolha dos restaurantes. No próprio guia, lê-se apenas: «As nossas estrelas, uma, duas e três distinguem as cozinhas mais notáveis, qualquer que seja o seu estilo. A escolha dos produtos, o controlo do ponto de cozedura e sabores, a personalidade da cozinha, a constância de prestação e a boa relação qualidade/preço são os critérios que, para além das diferentes cozinhas, definem as melhores mesas».