O motorista com o pé pesado e o regime de impunidade


Parece difícil de acreditar: uma semana depois de o i ter noticiado que o despacho de acusação ao motorista do ministro Eduardo Cabrita continha um erro factual e grosseiro, continua sem haver qualquer explicação por parte do Ministério Público ou da procuradora que assina o documento. Pior: ninguém mostrou qualquer intenção de corrigir o que…


Parece difícil de acreditar: uma semana depois de o i ter noticiado que o despacho de acusação ao motorista do ministro Eduardo Cabrita continha um erro factual e grosseiro, continua sem haver qualquer explicação por parte do Ministério Público ou da procuradora que assina o documento. Pior: ninguém mostrou qualquer intenção de corrigir o que está mal.

O caso continua a dividir as opiniões, mas creio que há dois equívocos fundamentais na discussão. O primeiro é que o ministro não ia ao volante e, como tal, não tinha de saber a que velocidade seguia o carro.

Ora, qualquer pessoa com o mínimo de honestidade intelectual perceberá que um motorista não é um condutor particular. É um profissional, e como tal cumpre ordens, não age de motu proprio. Não é a ele que cabe decidir a que velocidade o carro vai. Mas mesmo que fosse o caso, e o motorista estivesse em excesso de velocidade por sua iniciativa (algo em que ninguém acredita), o seu superior devia dizer-lhe para reduzir a velocidade. Eu, como passageiro, já o fiz diversas vezes em viagens de táxi.

O segundo equívoco diz respeito a ter-se feito “aproveitamento político de uma tragédia pessoal”.

O que está em causa não é o acidente particular, o azar que o cidadão Eduardo Cabrita teve de se cruzar com um trabalhador “imprevidente”. O que se passou extravasa muito a esfera particular – e não apenas por envolver um ministro que, para cúmulo, era quem tinha a tutela da segurança rodoviária.

Recordo que em Lisboa, o anterior autarca, que pertence ao partido do Governo, queria pôr zonas na cidade em que a velocidade máxima permitida era de 30 km/h. Mas pelos vistos os seus camaradas acham que normal andarem a 200 km/h ou perto disso.

O que está em causa não é o azar que pode acontecer a qualquer um. É este regime de impunidade em que os membros do Governo fazem regras que eles próprios acham que não têm de cumprir. Estão profundamente convencidos de que não há problema nenhum em infringir a lei porque eles próprios são a Lei. E se alguém lhes chama a atenção ainda ficam muito ofendidos.