O planeta está em guerra connosco e, convenhamos, é merecido. Décadas de poluição desenfreada, de políticas industriais e de mobilidade negligentes, de excesso de resíduos e de extrativismo tiveram o seu preço: temperaturas asfixiantes e vagas de incêndios no Canadá e nos Estados Unidos, inundações e mau tempo sem precedentes na Bélgica e na Alemanha, cheias na China. O caos climático está a provocar centenas de mortos, danos materiais incalculáveis e tenderá a aumentar os exércitos de refugiados climáticos.
A ofensiva é poderosa e desta vez atingiu o centro do poder, os países mais ricos. É por isso de esperar que surjam mudanças e até algumas políticas verdes. O problema é que é tudo demasiado lento e demasiado contraditório com o sistema económico e com as políticas orçamentais que nos têm governado.
Mudar a economia, a verdadeira transição energética e industrial, custa muito dinheiro e implica necessariamente quebras nas taxas de lucro. É uma transformação social que não se suporta mercados especulativos nem pode estar dependente de investimentos privados, precisa de um impulso público e de políticas de inovação tecnológica, proteção de emprego e proteção social.
Isto anda tudo ligado – enquanto o combate às alterações climáticas for empurrado para as costas das nossas decisões individuais, as desigualdades vão levar a melhor. A chave está em dar-lhes luta ao mesmo tempo: mão forte para travar a agricultura intensiva, a monocultura do turismo e as indústrias poluentes; capacidade para direcionar o investimento para setores sustentáveis; poderosas políticas políticas para financiar a educação e o desenvolvimento científico, a proteção social o e controlo democrático de setores estratégicos como a energia.
Mas como financiar tudo isto? Em primeiro lugar, grandes reformas fiscais e uma revisão profunda dos “travões” orçamentais que criminalizam o investimento público através de metas de défice e de dívida pública. Mas também não chega. Continuará a existir um abutre a pairar sobre o investimento público chamado sistema financeiro, sempre disposto a especular sobre um novo produto estruturado de risco incerto ou a cortar as vazas a um país inteiro. A Alemanha pode conseguir financiar as suas políticas ambientais a baixo custo mas a crise ambiental, tal como o capital, não conhece fronteiras.
Que o digam os multimilionários que andam a brincar à conquista da termosfera, investindo milhões no desenvolvimento de naves espaciais para passear no espaço. Talvez Richard Branson (Virgin) ou Jeff Bezos (Amazon) tenham perdido a esperança na sua própria espécie – a dos capitalistas – e andem à procura de um planeta B onde se possam refugiar. Ou talvez tenham apenas encontrado uma nova oportunidade de negócio. O que é certo é que o turismo espacial deixou de ser tema de ficção científica e está prestes a transformar-se numa indústria de luxo. Prevê-se que o primeiro hotel espacial orbital esteja pronto até 2025.
“Visionários”, dirão os liberais, cheios de inveja, ao ver o lançamento de um foguetão que polui tanto como 395 voos transatlânticos só de ida. “Mas é o preço a pagar pela ciência e pelo bem comum, e eles pagam-nos com o próprio dinheiro”, responderão. Não é bem assim. Bem comum seria a Amazon pagar impostos pelos 44 mil milhões de euros em receitas líquidas que teve na Europa, ou não enriquecer à custa de maus tratos e da brutal exploração dos seus trabalhadores. Bem comum foi o investimento público que deu origem aos conhecimentos tecnológicos que os multimilionários agora desenvolvem para conquistar o mercado espacial.
A nova guerra das estrelas não passa de uma excentricidade de homens muito ricos. Cá em baixo a guerra é outra e eles estão do lado errado, do que nos ataca.
Deputada do Bloco de Esquerda