A expectativa era muita, e digo-o sem um pingo de sarcasmo. Um mês depois da data anunciada para as conclusões do grupo de trabalho que reuniu especialistas para pensar o novo ano letivo, o governo prometeu novidades para o dia 1 de junho. Na data marcada ouvimos o ministro Tiago Brandão Rodrigues e o primeiro-ministro apresentarem o Plano 21|23 Escola+, e até apreciamos o powerpoint, mas foi difícil encontrar medidas concretas. Até ficamos à espera que os jornais do dia seguinte tivessem informação mais detalhada, mas a coisa ficou por aí.
Comecemos pela expectativa. Depois de afastadas – e bem – algumas propostas liberais assentes em escolas de verão e modelos decalcados de países sem sistemas de educação pública fortes como o nosso, havia duas grandes questões que concentravam as atenções: o investimento em recursos humanos e o encurtamento dos programas (a autonomia dada às escolas para gerirem ambos é uma questão importante e não tão simples quanto parece).
Vamos à realidade. O número apresentado pelo Governo é sonante: um investimento de cerca de 900 milhões. Mas apenas 140 milhões são para recursos humanos. A fatia maior, 670 milhões, vai para equipamentos e infraestruturas. Tudo o resto inclui medidas avulsas ou simplesmente a continuidade de políticas em curso. Ninguém será contrário à abertura de cinquenta salas para o ensino pré-escolar mas não estavam já programadas? A organização semestral do ano letivo e a flexibilidade curricular já eram uma possibilidade mas irão continuar a esbarrar na rigidez da avaliação? A atenção dada à recuperação a matemática é pertinente mas será que as orientações se distanciam assim tanto das “Recomendações para a melhoria das aprendizagens dos alunos em Matemática”, um documento de 280 páginas com a as conclusões de um grupo de trabalho criado por este ministro em 2018? Quanto às tutorias, mantêm-se. Há poucas novidades identificáveis, como a possibilidade dos alunos frequentarem aulas das disciplinas a que chumbaram mesmo não ficando retidos.
Ainda que estas medidas fossem suficientes restaria a questão: e os professores, se-lo-ão? Aqui entramos noutro nível de dúvida sobre o que foi apresentado. A notícia do jornal Público dava conta de que o reforço de 3300 professores (uma média de 2,5 por agrupamento) de setembro passado vai manter-se e será esse o reforço para o próximo ano letivo. Nesse caso, e sem condições para o confirmar, o grande reforço resumir-se-ia afinal a não despedir 3500 docentes.
Nesse caso, e sem condições para o confirmar, não haveria créditos adicionais para as escolas e agrupamentos de escolas poderem desdobrar turmas ou fazer turmas mais pequenas. Será que pelo menos o reforço de docentes passaria de temporário a definitivo? E os técnicos especializados anunciados, são adicionais ou apenas a renovação do reforço do ano anterior?
No mês passado já tinham sido anunciados 599 milhões de euros para recursos digitais pagos pela chamada bazuca europeia, grande parte destinada à aquisição de computadores e o restante a laboratórios equipados com kits de robótica, novos conteúdos pedagógicos digitais, wi-fi com mais velocidade e projetores para as salas de aula. Que parte deste investimento já anunciado é que está incluído no novo pacote e que parte é nova?
O Ministério da Educação habituou-nos anúncios sucessivos das mesmas medidas como se fossem novidade. Foi assim com a contratação de assistentes operacionais, foi assim com os computadores. Ainda ninguém percebeu muito bem o que é de facto o Plano 21/23 Escola+ e qual será o investimento real na educação. São demasiadas dúvidas para junho.