Foi o O’Neill quem as viu e salvou dos lugares mais comuns da poesia, “as mães, as minhas, a tua, as que estropiam ternamente os filhos para monótono e prudente avanço da família”, as que rezam, cosem farrapos de dor, dizia o poeta, enaltecendo esse terror quase obsceno que fica parado, vigilante, nos seus olhos maternais, e, na véspera do dia em que o mundo as homenageia, morreu uma atriz norte-americana que deu espessura e relevo no grande e no pequeno ecrã a essas figuras dominadoras e amoráveis. Olympia Dukakis foi muitas vezes mãe, mais do que os três filhos que teve com o parceiro de uma vida e também ator Louis Zorich, são especialmente memoráveis esses papéis que exigiam firmeza e desatavio, força moral e experiência, e tudo isso nesses traços que se exprimem apenas com um encosto, acotovelando nas cenas de desabafo, quando os filhos procuram as mães. Lá estava ela em fitas clássicas do VHS dos anos 80, como a mãe de Kirstie Alley nos primeiros dois Olha Quem Fala, ou como a mãe septuagenária e metediça de Ted Danson em Dad, mas será recordada sobretudo como a mãe siciliana de Loretta Castorini, em Feitiço da Lua. Foi a comédia romântica de Norman Jewison protagonizada por Cher que lhe valeu o Óscar de Melhor Atriz Secundária em 1987 e lhe deu, por fim, com 56 anos de idade, e quando tinha já atrás de si uma carreira de três décadas no teatro, a oportunidade de se ver livre dos cupões e da obrigação de comprar a roupa em saldos, trabalhando entre 10 a 12 horas em produções teatrais para sobreviver. Como a sardónica mãe de uma jovem viúva italiana que se vê em palpos-de-aranha ao apaixonar-se pelo irmão do seu noivo, representado por Nicolas Cage, Dukakis deu à matriarca italiana essa dureza e força que se tornam um apoio e um consolo. O papel valeu-lhe não apenas o Óscar como um Globo de Ouro e uma nomeação ao BAFTA. A atriz morreu que no sábado, aos 89 anos, tornou-se, assim, um rosto familiar no final daquela década, num período de graça que coincidiu com a campanha eleitoral do seu primo, Michael Dukakis, ex-governador do Massachusetts, como candidato democrata às presidenciais de 1988. Olympia concluiu o discurso de agradecimento do Óscar levantando a estatueta e clamando: “Ok, Michael, vamos lá.” Embora o primo tenha acabado por perder a eleição para George H.W. Bush, ambos mantiveram um perfil bastante ativo na política.
Nascida em Lowell (Massachusetts), a 20 de junho de 1931, Olympia era filha de imigrantes oriundos do sul da Grécia. Ela e o irmão mais novo, Apollo, também ele ator, cresceram em New England, e, segundo ela, a assimilação da cultura americana foi um processo que se estendeu por toda a sua vida, admitindo que deu grandes dores de cabeça aos pais na adolescência, mas que estes sempre a encorajaram a ser autêntica e a viver como uma americana sem trair a sua herança grega. O seu pai sustentou a família desdobrando-se num número sem fim de empregos, tendo trabalhado numa fábrica de munições, numa gráfica e no departamento de controlo de qualidade da Lever Brothers. Mas foi ele que transmitiu aos filhos a paixão pelo teatro, e chegou a fundar uma companhia amadora. Depois de se licenciar em fisioterapia na Universidade Boston, Olympia passou um período a exercer a profissão nos estados de West Virginia, Minnesota e Texas durante os piores dias da epidemia da poliomielite, isto até juntar dinheiro suficiente para voltar à universidade e pagar um curso em artes dramáticas. Cedo percebeu que se queria trabalhar nos palcos teria de criar o seu próprio caminho, e foi assim que se virou para a Broadway, ajudando a levantar produções das peças que lhe interessava representar, clássicos da dramaturgia, como Electra, Titus Andronicus ou Peer Gynt, que interpretou ao longo da vida.