Aulas online. Horários escolares extensos e alunos ao sabor do vento

Aulas online. Horários escolares extensos e alunos ao sabor do vento


Ensino à distância recomeça hoje depois de 15 dias de interrupção letiva devido à covid-19. Pais lançam críticas à sobrecarga horária. E há famílias que não receberam informação das escolas sobre o plano de trabalho para os filhos.


Sobrecarga horária escolar e crianças à deriva sobre aquilo que vão fazer a partir de hoje com os professores: é assim que, em algumas escolas – públicas e privadas –, recomeçam as aulas online depois de 15 dias de interrupção letiva devido à pandemia de covid-19. Em casa, os alunos vão seguir as normas implementadas pelos agrupamentos de escolas, mas o que tem levantado críticas por parte dos encarregados de educação é o facto de haver disparidades “muito grandes” no que toca à carga horária. Ao i, a mãe de uma aluna de sete anos, que frequenta o 2º ano de escolaridade de uma escola na Margem Sul, diz não compreender o facto de a filha ter 20 horas semanais de aulas síncronas, ou seja, por videoconferência e em tempo real, com o professor e os alunos a interagirem ao mesmo tempo.

“A minha filha está numa escola privada. E serem tantas horas desagrada-me imenso. Nem a criança vai prestar atenção nem o professor conseguirá captar a atenção dos alunos certamente”, começou por dizer, sublinhando que já definiu que, fora do horário escolar – que é entre as 9h30 e as 17h00 –, a filha não fará quaisquer trabalhos adicionais.

“Possivelmente após terminar as aulas ainda terá trabalhos. Nós, pais, já decidimos que não os fará. O pai continua a trabalhar por turnos e eu também continuo a trabalhar fora de casa. Terei o apoio da minha prima e da minha tia. Caso contrário não sabia o que fazer”, referiu.

O mesmo acontece em escolas públicas. Segundo o i conseguiu apurar, há estabelecimentos de ensino em que, no 1º ciclo, os alunos vão ter entre 15 e 20 horas semanais de aulas síncronas, contrariando vários especialistas em pedopsiquiatria que indicam capacidades de concentração entre 20 e 30 minutos consecutivos para estas idades. Nas redes sociais, são muitos os pais que têm manifestado o seu desagrado. “Estão a exagerar no excesso de horas em frente ao ecrã para miúdos do 1º e 2º ciclos. Mas onde é que anda o bom senso?!”, questionam. E continuam: “13h45 no meu agrupamento”, pode ler-se.

Carlos Amaral, que tem uma filha de 11 anos a frequentar o 6º ano de escolaridade, não fala em sobrecarga horária, mas admite não compreender também os horários que estão a ser estabelecidos pelos agrupamentos.

“A minha filha vai ter aulas das 8h00 às 12h45 e a filha de uma amiga minha, do 3º ciclo, das 13h30 às 19h30. Não consigo perceber. O 2º ciclo ter aulas da parte da manhã e o 3º só da parte da tarde tinha a ver com um horário de trabalho definido para as aulas presenciais em contexto pandémico. Para que os alunos não se cruzassem, nos espaços comuns, na escola. Neste caso, não me parece que faça muito sentido, porque eles não se vão cruzar. O que acho que seria mais adequado era haver um horário mais alargado, entre as 9h00 e as 17h00, que permitisse que os miúdos tivessem um horário mais amigável e que coincidisse mais com o horário de trabalho dos próprios pais”, atirou.

Ter em conta vários fatores Contactado pelo i, o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, admitiu que, nestes casos, trata-se de “um exagero” e que as escolas têm de perceber que os horários não são iguais em todas as idades. “Temos de aumentar a quantidade de aulas síncronas à medida que vamos caminhando para o ensino secundário. Temos de ter em conta a idade dos alunos, o nível de concentração e o ano de escolaridade”, reforçou. Alguns pais, porém, teimam que isso não está a ser tido em conta: têm chegado “dúvidas” de encarregados de educação à Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap). “Há dúvidas que nos chegam sobre quanto tempo é que os alunos devem estar em aula síncrona. São questões que preocupam os pais, porque são díspares. Os pais conversam uns com os outros”, disse Jorge Ascenção, presidente da Confap.

Crianças sem plano de aulas Há escolas que, durante os 15 dias de interrupção letiva, se prepararam devidamente para o ensino à distância. Mas há outras em que isso não foi feito da melhor maneira. Jorge Ascenção vai mais longe e sublinha que alguns alunos não tiveram qualquer plano de trabalho feito por parte da escola até este fim de semana, que antecedeu o regresso ao ensino online.

“As escolas tiveram estes 15 dias para organizar, planear e informar as famílias sobre qual é o plano de trabalho. Alguns pais já sabem, porque as escolas já comunicaram. Outros ainda não terão sabido por parte da escola, o que é um pouco estranho. Na sexta-feira, já deveria ter sido dada a informação, por email, de qual vai ser o plano. Não sei se foi a escola que não deu essa informação ou se houve alguma falha de comunicação. As famílias estão um bocadinho nessa expectativa, a perceber o que vai acontecer”, alertou, explicando, porém, que por vezes esse plano pode ser ajustado às condições familiares dos alunos.

“Conheço casos de professores que tiveram o cuidado de perceber quais as condições que a família tinha para poder adequar os horários. Numa família, por exemplo, com dois ou três filhos, se estiverem todos numa aula síncrona ao mesmo tempo, pode dificultar um pouco. Nem todas as crianças têm um quarto só para si. E essa é uma preocupação. Sei que complica o planeamento e o processo, mas tem de se fazer”, concluiu.

Catarina Damil, de 18 anos e a frequentar o 12.º ano, estuda em Alvalade, no concelho de Lisboa, e diz que está previsto ter aulas pelas plataformas Teams ou pelo Zoom, mas ainda nada foi definido. “Só sabemos amanhã [hoje], conforme a indicação dos meus professores”, contou ao i.