A nova declaração do Estado de Emergência traz a angústia do regresso a um confinamento que terá as consequências que já conhecemos. Ainda estamos a pagar caro a fatura do anterior confinamento: fatura económica, social e pedagógica.
Hoje está claro que as consequências da crise pandémica não afetaram todos por igual. Em outubro, a professora Carmo Machado pediu aos seus alunos do secundário um depoimento escrito sobre o período de confinamento. As respostas, que depois compilou num artigo publicado na Visão, confirmaram os seus piores receios: a experiência foi mais traumática do que se esperava.
Num dos testemunhos, a Ana dizia que “o confinamento foi o período mais extenso da minha vida: foram semanas que aparentavam demorar meses, dias que pareciam semanas, horas que passavam muito devagar.” A Clara falou dos que aconteceu a muitos: “Os meus planos iniciais terminaram inevitavelmente em cansaço e desmotivação. E depois veio a depressão e o desespero…”.
Outra aluna confirma: “Não vou mentir. No início do confinamento, achei que ia seguir com todos os meus planos. Mas comecei a isolar-me e a stressar-me com tudo à minha volta. As aulas online deixavam-me mais desgastada do que um dia inteiro de aulas presenciais”. No final, a professora refere que a Ana continua a sofrer os efeitos do isolamento e tem dificuldades em controlar a ansiedade.
O balanço dos efeitos do confinamento sobre as crianças e os jovens é muito claro e consensual. O risco de afastar novamente os alunos das escolas é o de vermos agravarem-se as desigualdades sociais, problemas de saúde mental, prejuízos definitivos na aprendizagem e no desenvolvimento emocional e intelectual, acesso desigual ao ensino à distância, redução das respostas sociais contra a fome e pobreza, menos acompanhamento especializado para a inclusão.
Nestas idades, há aprendizagens que não se suspendem: atrasam-se ou simplesmente perdem-se.
É verdade que as consequências são diferentes de acordo com a idade e o contexto dos alunos. Os alunos que transitaram para o 2.º ano de escolaridade têm níveis de aprendizagem como se estivessem no 1.º. Os professores do 2.º ciclo relatam-nos alunos que chegaram ao 5.º ano “ainda bebés”. A Escola Nacional de Saúde Pública publicou um estudo em que fica claro que os mais jovens são os que relatam uma maior degradação da saúde mental por causa do isolamento.
Os impactos são transversais e estendem-se às famílias, muitas em confinamento e teletrabalho. É por isso que o Governo deve fazer o que for possível para impedir que os alunos voltem a ficar confinados às suas casas.
As escolas foram locais seguros ao longo deste ano letivo. Não é a elas que se deve esta terceira vaga mas é-lhes pedido um esforço acrescido para que se mantenham seguras.
Para isso é preciso reconhecer que os profissionais da educação integram a linha da frente dos serviços essenciais e tomar medidas para proteger todos os que estão dentro da escola, principalmente os grupos de risco.
É preciso adequar as orientações a uma terceira vaga da pandemia. Em dezembro, o Parlamento aprovou, por proposta do Bloco de Esquerda, a realização de rastreios gratuitos por amostragem nas escolas, mas o ministro da Educação e o Governo continuam a hesitar sobre a sua realização. Pedimos clareza e uniformização de procedimentos para lidar com casos positivos nas escolas, mas as equipas de saúde pública não foram reforçadas para fazer este acompanhamento.
As escolas não podem ficar para trás nas preocupações do Governo. Se reforçar a higienização, contratar funcionários, fazer rastreios e adequar a organização das escolas pode ajudar a que se mantenha o ensino presencial, pelo menos para os alunos mais novos, então é preciso agir depressa.
É preciso fazer tudo o que for possível para que alunos, professores e trabalhadores estejam na escola em segurança. Por muito boas razões mas também porque os computadores prometidos para o início do ano letivo ainda não chegaram à maioria das escolas.
Deputada do Bloco de Esquerda