Médicos querem que Governo vá mais longe no combate a agressões

Médicos querem que Governo vá mais longe no combate a agressões


Petição pede lei específica para criminalizar violência nos serviços de saúde. SIM quer que utentes agressores sejam excluídos e que agressões passem a fazer parte do ficheiro dos utentes.


O Governo anunciou ontem a criação de um gabinete de segurança para analisar os casos de violência contra profissionais de saúde, à semelhança da Escola Segura, mas a primeira medida depois dos casos de agressões violentas que marcaram os últimos dias de 2019 não chegou para serenar os ânimos.

Um grupo de médicos lançou uma petição para que este tipo de violência seja criminalizado com legislação específica, pois atualmente não existe uma moldura própria para estes casos no Código Penal. À hora de fecho, a iniciativa, dirigida à Assembleia da República, reunia cerca de mil assinaturas. Já o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) propõe ao gabinete de segurança um conjunto de medidas, a começar pela exclusão imediata, “obrigatoriamente e no própria dia”, dos utentes agressores da lista de médicos de família agredidos ou da consulta dos médicos hospitalares – uma medida que já existe, por exemplo, em alguns serviços do sistema de saúde inglês, que em 2018 lançou uma estratégia nacional de tolerância zero contra a violência nos serviços de saúde.

O SIM defende ainda o impedimento permanente de entrar na unidade de saúde onde foi praticada a agressão, após a análise da situação pela entidade empregadora no prazo máximo de sete dias. O sindicato propõe também que a agressão seja averbada no registo clínico do utente, bem como a obrigatoriedade de acompanhamento por agente de autoridade aquando da prestação de cuidados médicos, durante período de tempo a definir. A última proposta, numa lista publicada no site do sindicato, passa pela criação de uma subvenção, pelos ministérios da Saúde e da Administração Interna, para a frequência pelos médicos do SNS de ações de formação de defesa pessoal e porte de meios de defesa pessoal. “Em causa está estarmos munidos de planos de fuga dos gabinetes e de mecanismos como botões de pânico”, disse ao i Jorge Roque da Cunha, secretário-geral do SIM.

A posição surgiu já depois de o Governo ter anunciado a criação do gabinete de segurança, na sequência de uma reunião entre o ministro da Administração Interna e a ministra da Saúde, o que levou o SIM a escrever no seu site “intenções e palavras bonitas, levam-nas o vento”.

O Governo anunciou que o gabinete de segurança terá início imediato, com vista a uma abordagem mais sistemática dos problemas de violência contra profissionais de saúde. O ministro Eduardo Cabrita anunciou que será colocado junto do gabinete da ministra da Saúde um oficial das forças de segurança que será responsável por coordenar a avaliação das “áreas de maior risco”, já identificadas, bem como avaliar “as características físicas numa perspetiva de segurança de algumas instalações de saúde, fundamentalmente de hospitais e, se necessário, de centros de saúde, para que sejam dadas as recomendações adequadas que permitam melhorar as condições de segurança dos profissionais e dos utentes do Serviço Nacional de Saúde”.

O i tentou perceber junto do Ministério da Saúde, que na semana passada anunciou que até ao final do mês será apresentada uma estratégia para combater o fenómeno, quais as áreas de maior risco identificadas até ao momento, mas não foi possível ter resposta até à hora de fecho desta edição. Citada pela Lusa, Marta Temido disse esperar, com esta medida, “intervenções mais pró-ativas de formação dos profissionais de saúde para lidar com episódios deste tipo” e “um diagnóstico daquilo que sejam as eventuais insuficiências ou falhas” das instalações.

Um estudo publicado na última edição da revista Acta Médica Portuguesa, com base em inquéritos a profissionais num hospital público de Lisboa, revelou que o acesso sem limitações e a falta de segurança aumentam o risco de agressões (ver ao lado), sendo o tempo de espera excessivo, o desrespeito pelos profissionais e casos de doença mental os gatilhos das agressões. Segundo este estudo, são uma minoria os profissionais que notificam o incidente à Direção-Geral da Saúde.

Em 2019, até setembro, a DGS recebeu o reporte de 995 episódios de violência, um número recorde e que supera os casos registados em todo o ano de 2018. A maioria são situações de assédio e violência verbal, sendo os enfermeiros o grupo profissional que reporta o maior número de casos. Nas estatísticas da DGS, que refletem o total de notificações recebidas desde que este tipo de violência começou a ser monitorizada, em 2007, em 56% dos casos, os agressores eram utentes, seguindo-se agressões cometidas por familiares (21%), mas também entre profissionais de saúde da mesma instituição (20%).