Os conflitos entre a agora ex-diretora de informação da RTP e Sandra Felgueiras não são recentes e remontam pelo menos a junho, altura em que uma notícia sobre os prémios da companhia aérea portuguesa TAP terá sido travada por Maria Flor Pedroso.
A equipa do Sexta às 9 já contava com progressos significativos na investigação, mas a mesma foi bloqueada por Maria Flor Pedroso, impedindo o programa de noticiar em primeira mão a distribuição de mais de 1,1 milhões de euros por 180 trabalhadores da TAP, por considerar que a informação não era relevante – informação que o i acabou por dar em exclusivo a 6 de junho.
Nessa altura, Flor Pedroso refutou essa informação – de que a investigação tinha sido travada –, tendo pedido até a Sandra Felgueiras que desmentisse a notícia sobre o assunto divulgada pelo Correio da Manhã.
Mas as polémicas continuaram. No verão, o programa de Sandra Felgueiras foi de férias e deveria ter regressado ao ecrã a 13 de setembro. Mas não voltou, o que levou Eduardo Cintra Torres a escrever uma crónica no Correio da Manhã criticando a “interrupção”. Na sua opinião, existiam “fios invisíveis” que sugeriam que a direção da estação pública tinha assumido uma “servidão voluntária” face ao Governo de António Costa.
Nessa altura, a direção de informação da estação pública afastava qualquer ligação ao Governo, garantindo tratar-se apenas de ajustes na grelha: “A direção de informação desmente a suspensão de qualquer programa sob sua responsabilidade. Houve e continuará a haver ajustes de programação em função da cobertura da campanha eleitoral. Todas as alterações foram articuladas com os responsáveis dos vários programas”. No dia seguinte era publicado na página de Facebook do programa que o Sexta às 9 regressava a 11 de outubro, a sexta-feira a seguir às eleições legislativas.
Já nessa altura, o i tinha avançado que existia tensão entre a direção de informação e a equipa do programa de Sandra Felgueiras, uma vez que temas como o caso Familygate e o negócio do lítio deixaram a direção incomodada. Pelo menos foi isso que garantiu uma fonte do canal público: “Há uma relação tensa e é notório o desinvestimento no programa, nomeadamente na equipa. A direção de informação não acha piada a nada que ponha em causa o poder”, referiu ao i.
Regressado o programa, os problemas adensaram-se com a primeira investigação de Sandra Felgueiras e da equipa sobre a prospeção de lítio pela Lusorecursos em Montalegre.
Visado na investigação, o secretário de Estado da Energia, João Galamba, publicou um longo texto com várias acusações ao programa da estação pública. “O programa Sexta às Nove tem-se dedicado à desinformação sobre a concessão mineira atribuída à empresa Lusorecursos. Foi várias vezes explicado ao Sexta às Nove o enquadramento legal aplicável, mas teimam em não aceitar a explicação e, mais grave, teimam em ignorar” a lei, escreveu João Galamba. E acrescentou: “Ao contrário do que alega o Sexta às Nove, não há aqui qualquer irregularidade ou anormalidade administrativa”.
Mas não ficou sem resposta, uma vez que Sandra Felgueiras respondeu ao socialista nos comentários da publicação: “Caro João Galamba, nenhum político nem servidor público está acima do escrutínio. A sua resposta é o reflexo pleno do total alheamento dos factos que pretende fazer desde o início”, começou por escrever. “Atacar a solidez das nossas dúvidas é atacar, neste momento, o Ministério Público, que abriu um inquérito-crime. Não posso tolerar que acuse o Sexta às 9 de mentir quando tudo o que revelamos são factos! Comprovados com prova testemunhal e documental e ainda mais sustentados na entrevista do Dr. Jorge Costa Oliveira. Compreenda o nosso trabalho. Porque ele é sério. Como sério espero que seja o seu”, concluiu a jornalista.
Entretanto, Sandra Felgueiras, Maria Flor Pedroso e Gonçalo Reis – presidente do conselho de administração da RTP – foram ouvidos na Assembleia da República a propósito da suspensão temporária do programa da RTP. Maria Flor Pedroso voltou a insistir que a “interrupção do programa não [teve] nada a ver com alguma informação que o programa estivesse a dar”, remetendo a decisão para um ajuste relacionado com a cobertura da campanha eleitoral.
Quanto ao facto de a investigação sobre o lítio poder incomodar o Governo, Flor Pedroso foi perentória: “Eu não acredito que haja um jornalista da RTP que tem uma notícia e não a dá. Nós sabíamos, obviamente, o que os programas estão a tratar. A questão do lítio nem era novidade. Estas notícias abriram os noticiários mais importantes”, disse. E garantiu: “Não, esta direção não foi sujeita a pressões, nem do Governo nem da oposição, porque não é permeável a elas”. “Não sinto que eu ou a minha direção esteja beliscada por causa deste caso”, disse.
Por último surgiu o caso do Instituto Superior de Comunicação Empresarial (ISCEM) que, depois do seu encerramento, estava a ser investigado pela equipa do programa Sexta às 9. E foi esta última polémica que levou à demissão de Maria Flor Pedroso. A então diretora de informação da RTP terá informado Regina Moreira, diretora do instituto, sobre a investigação. Além disso, só depois de a investigação já ter começado é que Maria Flor Pedroso terá informado a equipa do programa Sexta às 9 de que era professora naquele estabelecimento de ensino. Ao conselho de redação, Flor Pedroso garantiu que “apenas tentou ajudar”, uma vez que “tinha acesso a fontes não alcançáveis pelos jornalistas da equipa”. E apesar de ter garantindo que não se demitia, Flor Pedroso acabou por voltar atrás e colocou o seu lugar à disposição.
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