Faça você mesmo o seu partido!


A concentração de eleitores nos quatro maiores círculos pôs fim à cláusula-barreira e criou os partidos low-cost.


No fabrico de partidos políticos existem três métodos consagrados. O mais célere assenta no desfazer de um partido, por via de uma cisão, fugindo com uma costela do anterior para criar um novo. A história recente assinala um primeiro exemplo com a ASDI, fruto de uma cisão em 1979 a partir do então PPD e que em 1980 integrou, com o PS e a UEDS, a FRS, tendo eleito quatro deputados nas listas desta coligação. Nas eleições do passado domingo, dois outros partidos secessionistas tiveram destinos diferentes. A Aliança, fundada por Pedro Santana Lopes depois de perder as eleições para presidente do PSD, não elegeu qualquer deputado, ao passo que o Livre, fruto de uma cisão do Bloco de Esquerda, elegeu uma deputada.

Um segundo método de criação partidária corresponde ao “partido na hora”, também referido como “barriga de aluguer”. Nesta modalidade uma nova gerência ocupa, de armas políticas e de bagagens ideológicas, um partido previamente existente. O método permite poupar tempo e maçadas como as inerentes à obtenção das 7500 assinaturas autenticadas por cidadãos eleitores (que, nos termos mesquinhos da lei, têm de ser, como descobriu com pesar o Chega, maiores de 18 anos e estar vivos). Marinho e Pinto demonstrou a viabilidade do método junto do MPT – Partido da Terra, sob cuja bandeira se fez eleger eurodeputado em 2014, de par com o líder do MPT. Mal-agradecido, o dito líder requereu pouco tempo depois a perda de mandato de Marinho Pinto como eurodeputado, acusando o eleito de ter no entretanto fundado o Partido Democrático Republicano (credor dos votos de 9217 eleitores no passado domingo).

O terceiro método de fabrico de partidos políticos é o mais sofrido: obriga a lidar com militantes, quotas, eleições internas, congressos, caciques, programas, candidaturas, campanhas eleitorais em todos os círculos, infindáveis circuitos da carne assada, concertos de música pimba, discursos, autocolantes, brindes, beijos a velhinhas e criancinhas e perguntas pelo nome dos animais de companhia (e nunca pelo nome da companhia dos animais). Mas nem assim o método de fabrico tradicional deixa de dar resultados, como aconteceu esta semana com o Chega e a Iniciativa Liberal. Somados ao Livre e ao PAN, deram origem à categoria dos partidos low-cost, fáceis de montar e supostamente baratos em relação aos resultados eleitorais obtidos, admitindo que as contas das campanhas são, como sempre, claras, transparentes e auditáveis. Está lançado o repto a todo o cidadão eleitor: faça você mesmo o seu partido, eleja-se deputado e recupere, com lucro, o investimento logo no primeiro mês a seguir às eleições. Sob o mote “um eleitor, um partido!” serão superadas as conhecidas limitações da representação política. Para os interesses estabelecidos será, certamente, mais económica a captura de um partido low-cost do que dos partidos tradicionais, mesmo dos que estejam em perda de eleitores e que se sintam tentados pela promoção de saldos políticos por razões de sobrevivência imediata. E há o perigo de os partidos low-cost atacarem com sucesso os partidos tradicionais. A Iniciativa Liberal sorri e pensa destronar o CDS, o Livre tem sonhos húmidos em que se vê maior do que o Bloco. O barato sai caro.

A TVI já tinha feito eleger um Presidente da República. Agora, a CMTV elegeu um deputado. A anunciada fusão das duas deverá permitir eleger uma maioria parlamentar.

 

Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990