Os países mais felizes. Nórdicos lideram

Os países mais felizes. Nórdicos lideram


Estado social forte, relação com a natureza e menos trabalho


O que nos faz sentir feliz, um dia na praia ou muito dinheiro? Realização individual ou desenvolvimento social? A julgar pelo ranking mundial de felicidade divulgado pelas Nações Unidas, vale mais o tempo poupado a trabalhar que o trabalho gasto para arrecadar. A velha máxima de que o dinheiro não traz felicidade não é inteiramente verdadeira, mas aponta nesse sentido.

Os países escandinavos continuam a dominar os dez mais bem classificados do índice que a ONU vem fazendo desde 2012 e aí o que se nota é a existência de um Estado social forte, com serviços públicos tendencialmente gratuitos, onde as pessoas não se importam tanto de pagar impostos desde que estes sejam usados para o bem comum. A lei dinamarquesa de Jante aplica-se: a sociedade acima do indivíduo, não invejar os outros.

Integração de imigrantes, progressismo, defesa dos direitos humanos, o contacto com a natureza e esse gosto pelo exercício físico são algumas outras características que se podem encontrar entre os países com mais felicidade neste planeta.

Aos dez primeiros da lista o ano não decorreu da mesma forma, se alguns passaram sem grandes marcas por 2018, como a Islândia, onde as marcas da crise financeira de 2008/2009 parecem ter desaparecido, e o país se tornou pela sua beleza muito procurado pelos turistas, outros houve que acabam este ano num impasse sobre o que se irá passar a seguir, como a Suécia onde uma longa política de braços abertos para os imigrantes parece em risco, depois de os sociais-democratas terem tido o pior resultado nas eleições em 100 anos e a extrema-direita se transformar na terceira maior força política.

Curiosamente, na Suécia, os imigrantes sentem mais felicidade que os nascidos no país, ao contrário da Suíça, cujo quinto lugar se deve à opinião menos otimista dos imigrantes, e da Holanda, onde a população muçulmana tem sido alvo dos jogos políticos da extrema-direita e as velhas tradições do colonialismo holandês ainda perduram. 

Os países mais felizes do mundo

Finlândia. Estado Social forte como pilar da sociedade: No ano em que a Finlândia se tornou notícia porque Donald Trump citou o país como exemplo de prevenção de incêndios, por limparem a floresta com ancinhos, o que desatou muitas piadas nas redes sociais,  os finlandeses continuaram longe das manchetes e no topo dos países mais felizes do mundo. Um estado de espírito para o qual muito contribui, explica a “The Economist”, o seu Estado social forte, sustentado por um sistema de impostos progressivos e redistribuição de riqueza. Educação gratuita e um sólido serviço nacional de saúde, não esquecendo as reformas e a proteção na velhice. O frio e falta de luz em grande parte do ano não parece obstáculo para se ser feliz. Desde 2000 que os sucessivos governos finlandeses conseguiram reduzir a taxa de suicídio em 30%.

Noruega. A lei de Jante e a riqueza petrolífera:  A Noruega, que no último índice perdeu o primeiro lugar que mantinha há dois anos consecutivos para a Finlândia, embora os cinco países do topo mantenham mais ou menos as mesmas características, baseadas naquilo a que se chama Janteloven ou a lei de Jante: colocar a sociedade acima do indivíduo, não se gabar dos feitos individuais, nem invejar os outros. Mas mesmo um país feliz tem momentos infelizes e 2018 ficou marcado por uma série de escândalos sexuais envolvendo figuras políticas nacionais, entre líderes partidários e ministros e ex-ministros. Por outro lado, os noruegueses ficaram a saber que o petróleo continuará a ser uma riqueza nacional por muitos anos, tendo em conta que 37% do total de reservas no seu território continua por explorar. 

Dinamarca. Estado social e o risco dos algoritmos: Tal como na Noruega, também na Dinamarca a ideia de que a sociedade está acima do indivíduo está muito presente, daí que a existência de um Estado Social forte não seja uma arma de arremesso político entre governo e oposição. De qualquer maneira, por entre a felicidade, houve alertas este ano de que o investimento na inteligência artificial possa voltar-se contra os próprios noruegueses. Por exemplo, a “Foreign Affairs”, dá o exemplo do município de Gladsaxe, em Copenhaga que começou a usar algoritmos para identificar – a partir de uma base de dados governamental – crianças em risco de abuso, prática que pode violar a privacidade das famílias e a liberdade de expressão, ao mesmo tempo que desresponsabiliza o Estado por funcionar de acordo com fatores não humanos.

Islândia. Pequeno país faz frente à União Europeia: Com uma população de 300 mil pessoas, a Islândia é um dos países mais seguros e pacíficos do mundo e no relatório de 2018 esteve entre aqueles que mais subiram no índice. Recuperado da crise financeira que levou ao encerramento de alguns dos seus principais bancos, o país voltou a ser notícia apenas pelas boas razões, atraindo o turismo para as suas belas paisagens e exportando mais músicos per capita para o mundo do que qualquer outro país. Apesar de não possuir exército próprio, mantendo um acordo de proteção com os EUA, os islandeses são muito cientes da sua soberania, por isso, apesar de serem membros do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, mais de metade dos islandeses (57,3%) opõem-se a que o país adira à União Europeia. 

 

Suíça. Um acordo que faz lembrar o Brexit: É verdade que há uma ligeira alteração na felicidade dos suíços, mas tão ínfima que não retirou o país do top 5 entre os que melhor vivem neste mundo. O resultado tem a ver com o facto de, ao contrário dos outros quatro, a Suíça só aparecer na nona posição nos rankings da felicidade entre os imigrantes do país. Politicamente, as tensões com a União Europeia subiram de tom nestes últimos dias no que diz respeito à negociação de um novo acordo bilateral. Bruxelas está a pressionar Berna para que as relações se baseiem apenas num acordo e não nos 120 assinados nos últimos 20 anos e reduzindo o protecionismo dado aos suíços no acesso aos empregos na Suíça, que a UE diz que viola a livre circulação de pessoas no espaço comunitário. 

 

Holanda. Se os imigrantes fossem mais felizes…: A Holanda mantém a sua posição na lista. Tal como a Suíça, os seus números acabam a descer porque a comunidade imigrante tem uma perspetiva diferente na avaliação da sua vida no país, onde o populismo se tem aproveitado muito da população muçulmana para ganhos políticos. Certas tradições, como as do Black Piet (Pedro, o Negro), em que as pessoas se vestem de pajem renascentista e pintam as caras de preto para distribuírem doces, são consideradas racistas por uma parte importante da sociedade (44%) e já aconteceram até ataques a manifestantes antirracistas por contramanifestantes em recentes protestos contra a tradição que remonta aos tempos em que a Holanda tinha um império colonial.

 

Canadá. A legalização da marijuana para fim recreativo:  País de imigrantes, feito com grandes vagas nos últimos 50, 60 anos, o Canadá é um exemplo de integração, a ponto de locais e imigrantes terem mais ou menos a mesma perspetiva em relação à sua qualidade de vida, em ambos, o país surge no sétimo lugar (posição que já tinha em 2017). Liberal nos costumes, progressista nas ideias, com um sistema universal de saúde, ao contrário do seu gigante vizinho do sul (EUA), o país tornou-se em 2018, no segundo do mundo, a seguir ao Uruguai, a legalizar a marijuana para uso recreativo. Um exemplo da força da sua sociedade civil é o facto de o governo canadiano ter sido obrigado a cancelar o seu contrato de venda de armas à Arábia Saudita por pressão de ONG de direitos humanos.

Nova Zelândia. Melhor que o trabalho é a paisagem: Os neozelandeses são felizes porque não colocam muita ênfase no trabalho, nem se preocupam muito com o status ou a realização pessoal, preferindo passar muito tempo a desfrutar da natureza, o que num país com muitas belezas naturais e pouca pressão demográfica só pode trazer felicidade. Este ano, não foram as belezas naturais a dominar as conversas, mas o facto de o Estado andar a vigiar os cidadãos de forma ilegal. A prática remonta pelo menos a 2008 e estendeu-se a vários ministérios e a mais de 130 agências governamentais. “O uso de investigadores privados por braços do Estado está cheio de perigos para os direitos dos cidadãos numa democracia liberal”, alertou o “New Zealand Herald” em editorial.

 

Suécia. País dos braços abertos num impasse político:  A Suécia trocou de posição com a Austrália, subindo um lugar na lista, embora o estado de felicidade entre os dez primeiros classificados da lista se diferencie em pouquíssimas décimas. Uma das características diferentes da Suécia é que nele os imigrantes são ainda mais felizes que os naturais do país, fruto de políticas muito liberais de acolhimento de asilados e exilados durante décadas. Se já não é tanto assim, poderá vir a agravar-se, tendo em conta que os sociais-democratas tiveram o pior resultado em 100 anos nas eleições de 9 de setembro e a extrema-direita (Democratas Suecos) se tornou na  terceira força política, alterando a aritmética parlamentar. Daí o impasse na formação de governo que ainda perdura.

Austrália. Passar o tempo na rua com vista para o mar: Os australianos vivem na rua. Entre churrasco, praia, parques, surf, é difícil mantê-los em casa quando o sol brilha lá fora a maioria do tempo. Caminhadas, ciclismo, desportos aquáticos, râguebi, futebol australiano são atrações permanentes. Embora seja um país gigantesco, os aussies vivem na sua maioria com vista para o mar e preferem trabalhos temporários ao esforço de manter um emprego a longo prazo. Este ano, o país viu-se a braços com nova crise política (cinco primeiro-ministros em cinco anos), desta vez com contornos mais rocambolescos, já que Malcolm Turnbull foi vítima de um golpe dentro dos conservadores, levado a cabo por Scott Morrison que acabou por lhe roubar a liderança e a chefia do governo.