Bairrismo digital


É amigo da junta de freguesia no Facebook?


Comecei a seguir a junta de freguesia no Facebook e, à boleia, tenho também espreitado mais vezes as páginas das redondezas. Numa altura em que as redes sociais tendem a revelar-se muito pouco construtivas da nossa vida em sociedade, das correntes de insultos gratuitos à indústria das fake news, este bairrismo digital cada vez mais ativo é uma oportunidade diferente.

O potencial é imenso e começo pela Proteção Civil, que tem andado pelas ruas da amargura na opinião pública. No dia da tempestade Leslie havia uma feira medieval montada no bairro – não dá para explicar, mas estes certames históricos no meio do betão fazem parte da magia dos subúrbios. Como já seguia a junta, a meio da tarde recebi uma notificação com uma imagem de um céu carregado, um sinal de perigo e o aviso de que, por causa do agravamento do estado do tempo, iam fechar mais cedo a feira. As televisões anunciavam emissões especiais, mas só noite dentro, e as pessoas queriam saber se estavam no caminho do “maior furacão a atingir Portugal desde 1942” – bastava acompanhar as páginas dos meteorologistas amadores de serviço na internet para perceber a necessidade de mais informação e interação. Uma notificação da junta de freguesia a revelar, em tempo útil, que estava a acompanhar a situação e que havia uma medida de precaução concreta pareceu-me uma forma eficaz de comunicar e de tornar visível qualquer trabalho de bastidores.

Mais tarde viriam a dar conta das ruas em que caíram árvores e de um corte de eletricidade. Se mais autarquias tivessem complementado os alertas nacionais com informação na internet, e se mais pessoas estivessem ligadas às páginas dos seus municípios, talvez o aviso tivesse chegado de forma mais atempada a algumas das zonas realmente fustigadas pelo mau tempo. E digo mais pessoas porque o número de seguidores destas páginas das autarquias, sendo umas mais ativas que outras, é bastante inferior ao de eleitores e residentes.

Esta amizade digital e, até ver, sem polémicas com a minha junta de freguesia e com as da vizinhança – ainda não tentei usar a página para me queixar de não haver passeios rebaixados ou de terem mudado o ecoponto de sítio… – tem-me revelado, de resto, todo um mundo de programação cultural e social que nos escapa completamente quando andamos metidos na nossa vida e o sítio onde vivemos acaba por ser pouco mais do que um dormitório. Programação que, seguramente, se não for promovida nestes canais, terá muito menos espetadores/utilizadores do que poderia ter, desmotivando até os seus promotores/intervenientes, um círculo vicioso que importa quebrar nesta demanda nacional da descentralização, seja descentralizar ir do litoral para o interior ou da grande cidade para a periferia. 

Se as redes sociais trazem tantas vezes ao de cima o pior de nós, a este nível podem fazer cada vez mais diferença, tornando-se um meio de vinculação, de cada vez maior participação cívica, de exigência para com o poder local e até de mais solidariedade. Isto à medida que se tornarem canais menos institucionalistas – basta lembrar que, durante muito tempo, o conceito de ligação ao cidadão se resumia a autarquias incontactáveis depois das 17h e à partilha de fotos de inaugurações – e mais espaços de diálogo. Com isso, estaremos mais sensíveis ao que nos rodeia, mais críticos, mais comprometidos. É a internet, depois de ligar o mundo, a ligar o que está perto, com tudo o que de positivo isso pode trazer para a economia local. Portanto, é fazermo-nos amigos dos nossos sítios e ajudar estas comunidades a crescer, em tamanho e dinamismo.

 

Jornalista

Escreve à sexta-feira
 


Bairrismo digital


É amigo da junta de freguesia no Facebook?


Comecei a seguir a junta de freguesia no Facebook e, à boleia, tenho também espreitado mais vezes as páginas das redondezas. Numa altura em que as redes sociais tendem a revelar-se muito pouco construtivas da nossa vida em sociedade, das correntes de insultos gratuitos à indústria das fake news, este bairrismo digital cada vez mais ativo é uma oportunidade diferente.

O potencial é imenso e começo pela Proteção Civil, que tem andado pelas ruas da amargura na opinião pública. No dia da tempestade Leslie havia uma feira medieval montada no bairro – não dá para explicar, mas estes certames históricos no meio do betão fazem parte da magia dos subúrbios. Como já seguia a junta, a meio da tarde recebi uma notificação com uma imagem de um céu carregado, um sinal de perigo e o aviso de que, por causa do agravamento do estado do tempo, iam fechar mais cedo a feira. As televisões anunciavam emissões especiais, mas só noite dentro, e as pessoas queriam saber se estavam no caminho do “maior furacão a atingir Portugal desde 1942” – bastava acompanhar as páginas dos meteorologistas amadores de serviço na internet para perceber a necessidade de mais informação e interação. Uma notificação da junta de freguesia a revelar, em tempo útil, que estava a acompanhar a situação e que havia uma medida de precaução concreta pareceu-me uma forma eficaz de comunicar e de tornar visível qualquer trabalho de bastidores.

Mais tarde viriam a dar conta das ruas em que caíram árvores e de um corte de eletricidade. Se mais autarquias tivessem complementado os alertas nacionais com informação na internet, e se mais pessoas estivessem ligadas às páginas dos seus municípios, talvez o aviso tivesse chegado de forma mais atempada a algumas das zonas realmente fustigadas pelo mau tempo. E digo mais pessoas porque o número de seguidores destas páginas das autarquias, sendo umas mais ativas que outras, é bastante inferior ao de eleitores e residentes.

Esta amizade digital e, até ver, sem polémicas com a minha junta de freguesia e com as da vizinhança – ainda não tentei usar a página para me queixar de não haver passeios rebaixados ou de terem mudado o ecoponto de sítio… – tem-me revelado, de resto, todo um mundo de programação cultural e social que nos escapa completamente quando andamos metidos na nossa vida e o sítio onde vivemos acaba por ser pouco mais do que um dormitório. Programação que, seguramente, se não for promovida nestes canais, terá muito menos espetadores/utilizadores do que poderia ter, desmotivando até os seus promotores/intervenientes, um círculo vicioso que importa quebrar nesta demanda nacional da descentralização, seja descentralizar ir do litoral para o interior ou da grande cidade para a periferia. 

Se as redes sociais trazem tantas vezes ao de cima o pior de nós, a este nível podem fazer cada vez mais diferença, tornando-se um meio de vinculação, de cada vez maior participação cívica, de exigência para com o poder local e até de mais solidariedade. Isto à medida que se tornarem canais menos institucionalistas – basta lembrar que, durante muito tempo, o conceito de ligação ao cidadão se resumia a autarquias incontactáveis depois das 17h e à partilha de fotos de inaugurações – e mais espaços de diálogo. Com isso, estaremos mais sensíveis ao que nos rodeia, mais críticos, mais comprometidos. É a internet, depois de ligar o mundo, a ligar o que está perto, com tudo o que de positivo isso pode trazer para a economia local. Portanto, é fazermo-nos amigos dos nossos sítios e ajudar estas comunidades a crescer, em tamanho e dinamismo.

 

Jornalista

Escreve à sexta-feira