António Costa já apanhou o “Expresso” da maioria absoluta?


António Costa continua a gozar com os portugueses. No dia em muitos questionavam o paradeiro do primeiro-ministro, com o país legitimamente preocupado com os desenvolvimentos do incêndio em Monchique, António Costa divertia-se em mais uma ação de propaganda política


1. Escrevemos na semana transata, aqui no i, que o destaque inusitado dado à entrevista de Pedro Duarte pelo “Expresso”, na penúltima edição do jornal, se inseria numa lógica de desgaste do PSD – o que, somado à erosão previsível do Bloco de Esquerda na sequência da duplicidade moral de Ricardo Robles, tem o objetivo manifesto de reforçar o PS de António Costa, rumo à maioria absoluta. Afirmámos ainda que o “Expresso” iria, nas semanas subsequentes, dar amplo destaque à vitalidade política e solidez eleitoral do PS, exaltando os “feitos” de António Costa. Mal sabíamos nós que esta promoção do primeiro-ministro iria ser tão descarada – e logo na edição seguinte do mesmo jornal! Se dúvidas subsistissem sobre qual o posicionamento político do “Expresso” e a sua (fantasiosa) imparcialidade, estas foram definitivamente dissipadas: o jornal de Francisco Pinto Balsemão quer António Costa a liderar um governo socialista maioritário, dispensando PCP e Bloco de Esquerda. 

2. O que se percebe: por um lado, esta é a oportunidade histórica única para o fundador do “Expresso” ajustar contas com o partido de que é militante número um, o qual, na sua conceção, nunca o tratou à medida do seu merecimento; por outro, António Costa criou o ambiente político favorável à inviabilização da aquisição da TVI pela Altice, mantendo–a sob controlo de um grupo ligado aos socialistas espanhóis. Por último, humanamente, é muito difícil para um jornalista político do “Expresso” tecer considerações menos positivas sobre António Costa, irmão de Ricardo Costa, ex-diretor do jornal. Note-se que Ricardo Costa é um exemplo de isenção jornalística, de rigor e de imparcialidade, sendo (podemos prová-lo por experiência pessoal) absolutamente imune a qualquer pressão, independentemente da sua proveniência. Ricardo Costa , quer como diretor do “Expresso” quer como diretor da SIC, sempre garantiu (e garante) liberdade máxima para os seus profissionais. Contudo, do ponto de vista humano, é sempre muito complexo escrever-se algo mais crítico ou contundente sobre o irmão de um amigo ou ex-patrão: na dúvida, prefere-se o tom mais elogioso ou mais reverencial, para não fazer perigar a amizade. É um caso de autocensura ou autocontenção de que sofrem alguns jornalistas do “Expresso”. Por nosso lado, estamos certos de que Ricardo Costa conhece a alta estima e admiração que temos pelo seu trabalho – e perceberá certamente que a nossa liberdade analítica é independente dos juízos subjetivos que possamos formular sobre os protagonistas dos factos objeto da nossa análise.

3. Dito isto, não podemos deixar de estranhar que o “Expresso” tenha inaugurado uma nova tradição: a entrevista de verão de António Costa. Há precisamente um ano, o “Expresso” deu o palco ao primeiro-ministro para lançar os dados do ano político, antecipando a rentrée. Pois bem, nessa entrevista, o primeiro-ministro manifestou o desejo da saída de Passos Coelho e a entrada de Rui Rio, sinalizando que o momento de viragem coincidiria com as eleições autárquicas: “Este é o momento do confronto político; depois, virá o momento dos consensos.” E a verdade é que a maioria dos militantes do PSD, ao votar em Rui Rio, fez a vontade a António Costa – ou seja, tudo o que o líder geringonçado desejou há um ano no “Expresso” aconteceu. Saiu-lhe a sorte grande. Daí que António Costa tenha querido repetir a estratégia – tal como no ano anterior lançou as autárquicas através do “Expresso” e ganhou, espera desta feita que suceda o mesmo com as europeias e as legislativas. No fundo, o “Expresso” é o amuleto da sorte de Costinho, o primeiro-ministro poucochinho. Atenção: para já, a entrevista focou–se nas europeias – para mais desenvolvimentos sobre as legislativas, aguardemos a entrevista de verão de António Costa ao “Expresso” em agosto de 2019.

4. E sempre com o mesmo estilo e a mesma estrutura. O mesmo estilo – uma entrevista suave, amistosa, não confrontacional, pouco esclarecedora, dando palco ao primeiro-ministro para vender a sua retórica mentirosa sem entraves. A mesma estrutura – duas páginas no caderno principal, destaque de capa e uma longa entrevista na revista do jornal. Normalmente, entrevistas com políticos são publicadas no caderno principal – contudo, o “Expresso” abre sempre uma exceção quando se trata de António Costa. Este é o único político que merece ser a estrela da revista, até porque, desta forma, sempre se poderá alegar que se tratava de uma conversa informal, mais solta, não tão presa aos formalismos e limitações do discurso político. Em 2017 foi assim; em 2018 repetiu-se; em 2019 voltará a repetir-se. Já circula inclusive o desafio (em jeito de piada) de saber onde há maior concentração de costistas por metro quadrado, se na redação do “Expresso” ou na redação do “DN”. Parece-nos que o “Expresso” leva vantagem…

5. Quanto ao conteúdo da conversa informal entre jornalistas do “Expresso” e o primeiro-ministro há pouco a dizer. Destacamos três notas: 

1) António Costa continua a gozar com os portugueses. No dia em muitos questionavam o paradeiro do primeiro-ministro, com o país legitimamente preocupado com os desenvolvimentos do incêndio em Monchique, António Costa divertia-se em mais uma ação de propaganda política para o “Expresso”. A Proteção Civil, os bombeiros, a população local estavam a lutar para evitar que a situação atingisse proporções trágicas enquanto o primeiro-ministro sorria a bandeiras despregadas para as objetivas do “Expresso”. O país arde, mas António Costa não esconde a sua felicidade. O país preocupa-se; António Costa congratula-se. Isto é um remake do pior do socratismo. Este processo de manipulação da opinião pública é próprio de um Estado terceiro-mundista.

2) O PS já está a trabalhar para a maioria absoluta -pedindo-a sem a pedir. Isto é, António Costa evita falar expressamente na maioria absoluta para não ferir as suscetibilidades dos seus parceiros de esquerda (pois ainda precisa deles); no entanto, evidencia o papel liderante do PS na atual solução governativa. Ou seja: aqueles que concordarem com o caminho seguido por este governo têm de votar no PS. Resultado prático: Costa apela ao esvaziamento do BE e do PCP para reforçar a posição do PS. Ora, a única virtualidade disto é a satisfação metafísica que nos dá porque confirma o que escrevemos no “Sol” online há duas semanas, no texto intitulado “Quem tramou Robles?”. Basicamente, António Costa confirmou a minha tese: foi o PS que lançou a notícia para entalar (e calar!) o BE. Se o BE mantiver o apoio ao PS de Costa confirmará a sua baixeza moral – saberemos que os bloquistas nem a si próprios se respeitam. 

3) António Costa falou por si, pelo PS – e pelo PSD. Os jornalistas quiseram saber da sua intenção de promover consensos com o PSD – e o líder do PS já adiantou que já vêm aí novos acordos com os sociais-democratas! Isto é, António Costa já fala em representação de Rui Rio! Isto só acontece devido à fraqueza da liderança do PSD – António Costa coloca-se assim, definitivamente, como o líder que une o impossível: domina tanto o Bloco de Esquerda e o PCP como domina o PSD. Qual o efeito sistémico no quadro político-partidário português? Fácil: o PS de Costa converte-se no “partido-charneira” do regime, ora virando à esquerda, ora virando à direita. E aumenta a insignificância do PSD, que fica sem poder, sem discurso, sem programa, sem referências. O PSD de Rui Rio não acha insólito que o primeiro-ministro fale pelo partido? À custa da amizade entre António Costa e Rui Rio, o PSD poderá viver a pior fase da sua história. A dúvida já só está em saber se o partido conseguirá sobreviver ao desastre chamado Rui Rio… 

6. Terminamos reiterando a nossa conclusão, que hoje já é uma certeza para todos: o “Expresso” está empenhado na maioria absoluta de António Costa – e António Costa vai aproveitando o palco de honra privilegiado que o “Expresso” lhe dá. Pedro Santos Guerreiro, diretor do jornal, é um nome a ponderar para substituir Mário Centeno…

 

joaolemosesteves@gmail.com 

Escreve à terça-feira
 


António Costa já apanhou o “Expresso” da maioria absoluta?


António Costa continua a gozar com os portugueses. No dia em muitos questionavam o paradeiro do primeiro-ministro, com o país legitimamente preocupado com os desenvolvimentos do incêndio em Monchique, António Costa divertia-se em mais uma ação de propaganda política


1. Escrevemos na semana transata, aqui no i, que o destaque inusitado dado à entrevista de Pedro Duarte pelo “Expresso”, na penúltima edição do jornal, se inseria numa lógica de desgaste do PSD – o que, somado à erosão previsível do Bloco de Esquerda na sequência da duplicidade moral de Ricardo Robles, tem o objetivo manifesto de reforçar o PS de António Costa, rumo à maioria absoluta. Afirmámos ainda que o “Expresso” iria, nas semanas subsequentes, dar amplo destaque à vitalidade política e solidez eleitoral do PS, exaltando os “feitos” de António Costa. Mal sabíamos nós que esta promoção do primeiro-ministro iria ser tão descarada – e logo na edição seguinte do mesmo jornal! Se dúvidas subsistissem sobre qual o posicionamento político do “Expresso” e a sua (fantasiosa) imparcialidade, estas foram definitivamente dissipadas: o jornal de Francisco Pinto Balsemão quer António Costa a liderar um governo socialista maioritário, dispensando PCP e Bloco de Esquerda. 

2. O que se percebe: por um lado, esta é a oportunidade histórica única para o fundador do “Expresso” ajustar contas com o partido de que é militante número um, o qual, na sua conceção, nunca o tratou à medida do seu merecimento; por outro, António Costa criou o ambiente político favorável à inviabilização da aquisição da TVI pela Altice, mantendo–a sob controlo de um grupo ligado aos socialistas espanhóis. Por último, humanamente, é muito difícil para um jornalista político do “Expresso” tecer considerações menos positivas sobre António Costa, irmão de Ricardo Costa, ex-diretor do jornal. Note-se que Ricardo Costa é um exemplo de isenção jornalística, de rigor e de imparcialidade, sendo (podemos prová-lo por experiência pessoal) absolutamente imune a qualquer pressão, independentemente da sua proveniência. Ricardo Costa , quer como diretor do “Expresso” quer como diretor da SIC, sempre garantiu (e garante) liberdade máxima para os seus profissionais. Contudo, do ponto de vista humano, é sempre muito complexo escrever-se algo mais crítico ou contundente sobre o irmão de um amigo ou ex-patrão: na dúvida, prefere-se o tom mais elogioso ou mais reverencial, para não fazer perigar a amizade. É um caso de autocensura ou autocontenção de que sofrem alguns jornalistas do “Expresso”. Por nosso lado, estamos certos de que Ricardo Costa conhece a alta estima e admiração que temos pelo seu trabalho – e perceberá certamente que a nossa liberdade analítica é independente dos juízos subjetivos que possamos formular sobre os protagonistas dos factos objeto da nossa análise.

3. Dito isto, não podemos deixar de estranhar que o “Expresso” tenha inaugurado uma nova tradição: a entrevista de verão de António Costa. Há precisamente um ano, o “Expresso” deu o palco ao primeiro-ministro para lançar os dados do ano político, antecipando a rentrée. Pois bem, nessa entrevista, o primeiro-ministro manifestou o desejo da saída de Passos Coelho e a entrada de Rui Rio, sinalizando que o momento de viragem coincidiria com as eleições autárquicas: “Este é o momento do confronto político; depois, virá o momento dos consensos.” E a verdade é que a maioria dos militantes do PSD, ao votar em Rui Rio, fez a vontade a António Costa – ou seja, tudo o que o líder geringonçado desejou há um ano no “Expresso” aconteceu. Saiu-lhe a sorte grande. Daí que António Costa tenha querido repetir a estratégia – tal como no ano anterior lançou as autárquicas através do “Expresso” e ganhou, espera desta feita que suceda o mesmo com as europeias e as legislativas. No fundo, o “Expresso” é o amuleto da sorte de Costinho, o primeiro-ministro poucochinho. Atenção: para já, a entrevista focou–se nas europeias – para mais desenvolvimentos sobre as legislativas, aguardemos a entrevista de verão de António Costa ao “Expresso” em agosto de 2019.

4. E sempre com o mesmo estilo e a mesma estrutura. O mesmo estilo – uma entrevista suave, amistosa, não confrontacional, pouco esclarecedora, dando palco ao primeiro-ministro para vender a sua retórica mentirosa sem entraves. A mesma estrutura – duas páginas no caderno principal, destaque de capa e uma longa entrevista na revista do jornal. Normalmente, entrevistas com políticos são publicadas no caderno principal – contudo, o “Expresso” abre sempre uma exceção quando se trata de António Costa. Este é o único político que merece ser a estrela da revista, até porque, desta forma, sempre se poderá alegar que se tratava de uma conversa informal, mais solta, não tão presa aos formalismos e limitações do discurso político. Em 2017 foi assim; em 2018 repetiu-se; em 2019 voltará a repetir-se. Já circula inclusive o desafio (em jeito de piada) de saber onde há maior concentração de costistas por metro quadrado, se na redação do “Expresso” ou na redação do “DN”. Parece-nos que o “Expresso” leva vantagem…

5. Quanto ao conteúdo da conversa informal entre jornalistas do “Expresso” e o primeiro-ministro há pouco a dizer. Destacamos três notas: 

1) António Costa continua a gozar com os portugueses. No dia em muitos questionavam o paradeiro do primeiro-ministro, com o país legitimamente preocupado com os desenvolvimentos do incêndio em Monchique, António Costa divertia-se em mais uma ação de propaganda política para o “Expresso”. A Proteção Civil, os bombeiros, a população local estavam a lutar para evitar que a situação atingisse proporções trágicas enquanto o primeiro-ministro sorria a bandeiras despregadas para as objetivas do “Expresso”. O país arde, mas António Costa não esconde a sua felicidade. O país preocupa-se; António Costa congratula-se. Isto é um remake do pior do socratismo. Este processo de manipulação da opinião pública é próprio de um Estado terceiro-mundista.

2) O PS já está a trabalhar para a maioria absoluta -pedindo-a sem a pedir. Isto é, António Costa evita falar expressamente na maioria absoluta para não ferir as suscetibilidades dos seus parceiros de esquerda (pois ainda precisa deles); no entanto, evidencia o papel liderante do PS na atual solução governativa. Ou seja: aqueles que concordarem com o caminho seguido por este governo têm de votar no PS. Resultado prático: Costa apela ao esvaziamento do BE e do PCP para reforçar a posição do PS. Ora, a única virtualidade disto é a satisfação metafísica que nos dá porque confirma o que escrevemos no “Sol” online há duas semanas, no texto intitulado “Quem tramou Robles?”. Basicamente, António Costa confirmou a minha tese: foi o PS que lançou a notícia para entalar (e calar!) o BE. Se o BE mantiver o apoio ao PS de Costa confirmará a sua baixeza moral – saberemos que os bloquistas nem a si próprios se respeitam. 

3) António Costa falou por si, pelo PS – e pelo PSD. Os jornalistas quiseram saber da sua intenção de promover consensos com o PSD – e o líder do PS já adiantou que já vêm aí novos acordos com os sociais-democratas! Isto é, António Costa já fala em representação de Rui Rio! Isto só acontece devido à fraqueza da liderança do PSD – António Costa coloca-se assim, definitivamente, como o líder que une o impossível: domina tanto o Bloco de Esquerda e o PCP como domina o PSD. Qual o efeito sistémico no quadro político-partidário português? Fácil: o PS de Costa converte-se no “partido-charneira” do regime, ora virando à esquerda, ora virando à direita. E aumenta a insignificância do PSD, que fica sem poder, sem discurso, sem programa, sem referências. O PSD de Rui Rio não acha insólito que o primeiro-ministro fale pelo partido? À custa da amizade entre António Costa e Rui Rio, o PSD poderá viver a pior fase da sua história. A dúvida já só está em saber se o partido conseguirá sobreviver ao desastre chamado Rui Rio… 

6. Terminamos reiterando a nossa conclusão, que hoje já é uma certeza para todos: o “Expresso” está empenhado na maioria absoluta de António Costa – e António Costa vai aproveitando o palco de honra privilegiado que o “Expresso” lhe dá. Pedro Santos Guerreiro, diretor do jornal, é um nome a ponderar para substituir Mário Centeno…

 

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