Física para futuros deputados, governantes e presidentes

Física para futuros deputados, governantes e presidentes


É importante que os futuros deputados, governantes, e presidentes dominem alguns conceitos fundamentais da física e da tecnologia mais avançada com impacto no nosso dia-a-dia


Esta é a designação inicial, adaptada para a realidade portuguesa, de uma cadeira ensinada na Universidade da Califórnia Berkeley pelo prof. Richard A. Muller [1] a estudantes de todas as áreas sem formação prévia em Matemática ou Física. Em 2010 resultou no livro “Physics and Technology for Future Presidents, An Introduction to the Essential Physics Every World Leader Needs to Know”, Princeton University Press (e também num livro de divulgação). O título do livro é autoexplicativo: existe um conjunto de conceitos e informação, no cruzamento da física e da tecnologia, que são cada vez mais críticos e que os nossos líderes devem conhecer para tomar as decisões nas sociedades modernas.

As escolhas políticas têm subjacentes, em muitos casos, questões cuja complexidade científica e técnica é extremamente elevada. Das alterações climáticas às questões energéticas, da segurança nuclear à inteligência artificial, da genómica à computação quântica, como devem os políticos tomar decisões sobre estes assuntos? Os cientistas devem participar nestes processos, preparando estudos e fazendo cálculos, trabalhando com as equipas dos decisores, mas, no final do processo, a decisão terá de ser tomada por alguém que, com elevada probabilidade, não é um especialista na matéria ou um cientista. Como argumenta Muller, os decisores de topo nos governos e nas empresas são mais inteligentes do que a maioria dos professores de Física e, portanto, conseguem compreender problemas complexos, mas precisam de ter os conhecimentos técnicos e científicos fundamentais.

É, assim, importante que os futuros deputados, governantes, e presidentes dominem alguns conceitos fundamentais da física e da tecnologia mais avançada com impacto no nosso dia-a-dia. No livro, os conceitos são explorados recorrendo a conceitos rudimentares de matemática, e sem o nível de abstração que geralmente associamos à física, explorando a máxima do físico Richard Feynman “If you cannot explain something in simple terms, you don’t understand it yourself”. Os estudantes devem conseguir explicar conceitos complexos de forma simples, da mesma forma que o prof. António Brotas, um professor catedrático de Física do Técnico, pedia aos alunos da cadeira de Termodinâmica que explicassem os fundamentos desses avanços a um político contemporâneo (geralmente, o visado era Napoleão Bonaparte).

O resultado são alunos que compreendem os fundamentos de tópicos contemporâneos tão diversos como a energia, a radioatividade, computadores quânticos ou a imagiologia médica, conseguindo fazer estimativas e quantificar os conceitos, e fazer previsões. Compreendem também a importância do confronto dos resultados e dos modelos com as evidências experimentais, e as relações de causalidade. Conseguem desconstruir informação distorcida ou de fraca qualidade, falácias metodológicas ou até falhas de validação. Percebem quais as escalas de tempos envolvidas nas decisões e as suas consequências nessas diferentes escalas de tempo.

Os cientistas devem colaborar nas tomadas de decisão, mas os nossos líderes políticos devem poder questionar os próprios especialistas, evitar decisões que violam os princípios mais fundamentais de conservação (e.g. de recursos financeiros) e estar alerta para as manifestações de pseudociência. Todo o conhecimento técnico e científico acumulado não evitará a necessidade de fazer escolhas eminentemente políticas, mas estas decisões serão muito mais sólidas e profundas se alicerçadas no conhecimento dos conceitos essenciais da física e da tecnologia.

[1]http://muller.lbl.gov/teaching/Physics10/PffP.html

 

Professor catedrático do Departamento de Física. Presidente do Conselho Científico

Instituto Superior Técnico