Maçã Verde. Em nome dos pais, das tascas  e dos santos secretos

Maçã Verde. Em nome dos pais, das tascas e dos santos secretos


Tiago Pais, que se pode dizer que é um especialista em tascas, apresentou-nos o seu livro, “As 50 Melhores Tascas de Lisboa”, da maneira certa: pelo meio de um almoço no Maçã Verde, seguramente uma das melhores tascas de Lisboa.


Abençoadas tascas era outro título que podíamos ter dado a este texto conversado e escrito à mesa. Quando chegámos já Tiago Pais estava à nossa espera. A casa estava cheia mas o Sr. Zé Carlos lá deu um jeito e desencantou uma boa mesa num cantinho do restaurante Maçã Verde, em Santa Apolónia, que Tiago Pais, jornalista que basicamente se dedica a comer e a escrever sobre o que come, grande vida, elegeu como uma das sete melhores da cidade em “As 50 Melhores Tascas de Lisboa”. Um guia para bem comer – e barato, que isso também é importante – que dá vontade de devorar em 50 dias, e que antes do verão será editado também em inglês.

Ora vamos ao menu. Isto é quinta-feira, dia de cozido, mas cozido é cozido e se há coisa a que não resistimos é a uns choquinhos fritos à algarvia, ainda que aqui especial, especial, seja o choco frito à setubalense. Não vale a pena ir a Setúbal, garante o Sr. Zé Carlos. Mas isso é às sextas, hoje que é quinta vai ter que ser à algarvia, e ainda bem, que até gostamos mais.  “Com uma saladinha?” Com saladinha, se faz favor, e o mesmo para os dois, para não baralhar, que o Sr. Zé Carlos insiste, e nós acedemos, em mais “um pratinho, só para provar” de secretos de porco, esses sim, uma das maiores especialidades da casa. Como a lampreia, “quando é altura dela”, com “a malguinha do vinho verde”. Mas só por encomenda. Essa é Zé Brandão quem faz, o outro sócio, minhoto. “É ele que faz a lampreiazinha, e faz muito bem”.

Especialidades que demoraram 20 anos a apurar, foi em 1996 que o Maçã Verde passou a existir como restaurante, conversão feita pelos próprios sócios, estes dois que já apresentámos, que em 1981 abriram aqui uma hamburgueria/snack-bar chamada Green Apple. Era a “tostazinha em pão caseiro grande, com fiambre, queijo, presunto, essas coisas”, naquela altura em que estavam “mais virados para a juventude, havia a tropa e os de Lisboa iam para o Norte e os do Norte vinham para Lisboa. Havia sempre as saídas e partidas, eram sempre 5, 10, 15, 20 mil pessoas.” Terminado o serviço obrigatório converteram o snack-bar em restaurante de “mini-prato, sempre a andar”, que era o que pedia aquela nova vida da zona de Santa Apolónia.

Mas os secretos Foi atrás dos secretos que Tiago Pais veio aqui dar uma vez, recomendado por um chefe, crê que o chefe Cordeiro mas já foi há uns anos. “Costumava perguntar aos chefes onde é que eles gostavam de ir comer”, conta, sobre o tempo em que coordenava os guias de restaurantes da “Time Out”. Justamente desses tempos, Tiago Pais, que agora continua a escrever sobre comida mas no “Observador”, tinha já uma boa lista de tascas, que decidiu há tempos reunir num guia. “Já tinha uma base de dados de umas 20 ou 30 que sabia que deviam entrar, depois fui à procura das outras. Experimentar, ir aos sítios, perguntar às pessoas também, para chegar a uma lista final. O número 50 nem era o objetivo, veio depois.”

E nisto chegam os chocos.
— Então já trago uma saladinha e depois um bocadinho de carninha para vocês provarem.
— Mas pouca! Não abuse, é só mesmo para a Cláudia provar.
“Estás a ver? É por causa disto, esta coisa da ‘carninha’, dos ‘choquinhos’, basta vires cá duas ou três vezes e já te conhecem pelo nome.” Vamos pensando que se isto não é especialidade, a especialidade o que será. Por esta altura já reconhecemos a Tiago Pais todos os créditos para nos guiar pelas tascas de Lisboa ou de onde for. É aí que lhe perguntamos de onde vem este amor às tascas, que isto é amor mesmo. “Desde miúdo, sempre comi muito fora. O meu pai adorava almoçar e jantar fora.”

Para chegar à lista, foi mais de meio ano a percorrer as tascas de Lisboa, sete com uma distinção especial a que chamou Palito d’Ouro, qual Estrela Michelin, qual quê. Sete casas que são “as que melhor representam os princípios aqui defendidos: comida tradicional de grande qualidade, serviço eficaz, castiço, generoso até, e preços que não só ofendem como chegam a comover”. O preço é um critério importante para Tiago Pais. “O livro custa 11 euros, incluí sítios em que o preço médio, com tudo, não ultrapassasse esse valor.”

Terminado o livro, em novembro, fecharam duas. “É uma questão um bocado sensível, estou sempre a ver se estão todos abertos.”
— Não queres mais?
— Não, não.
Venham os secretos. E sobre os secretos… bom, o melhor, caro leitor, é mesmo vir prová-los, que a nós que não nos especializámos em comida é difícil explicar isto aqui.
“Tivemos então que pôr uma que tínhamos de reserva e de fazer outra que não tinha entrado porque era de um senhor no Chiado que ia ser despejado e estava muito deprimido, mas depois conseguiu não ser despejado e já quis entrar no livro.” Tiago Pais não nos disse qual era mas fomos ao mapa e só pode ser o Das Flores. É ir lá, e muitas vezes, a ver se não fecha. Longa vida às tascas e aos secretos. E aos conselhos de Tiago Pais.

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Maçã Verde
Rua dos Caminhos de Ferro, 84. Santa Apolónia.
Seg-Sex, 12h00-16h00, 18h00-00h00; 
Sáb, 12h00-16h00
Tel. 218868780; 965512266