A França está a perder a paciência para as incertezas desestabilizadoras da Grã-Bretanha quanto ao seu papel no projecto de integração europeu. Sinal disso é o número crescente de personalidades que defendem que o melhor seria a grande ilha descolar dos restantes 27 países da União.
Desta vez foi um dos grandes do Partido Socialista francês, que foi primeiro-ministro num governo de François Mitterrand, quem desferiu o rude golpe, identificando a Grã-Bretanha como a fonte de grande parte dos problemas que enfrenta hoje a União Europeia. “A Grã-Bretanha é um grande país que sempre se recusou a permitir que a Europa interferisse nos seus assuntos. Bloqueou o esforço de maior integração”, disse o ex-dirigente ao “Trombinoscope”, uma revista parlamentar francesa.
“Se eles saírem, torna-se possível dar resposta às necessidades de governação europeia. Até a Alemanha se apercebe disto e tem-no exigido. Eu anseio por que aconteça porque eles impediram-na [a UE] de se desenvolver, mataram-na”, acusa Rocard.
Aos 83 anos, o socialista diz que ficou claro que “o povo britânico quer deixar a Europa” e apenas está a ser impedido de deixar a UE pelas classes política e financeira do país. “As elites britânicas têm medo do isolamento que isso pode provocar, e que este possa enfraquecer” o principal centro financeiro da Europa [Londres], esclareceu.
As declarações de Rocard ecoam outras feitas por Jacques Delors, o antigo presidente socialista da Comissão Europeia, que em 2012 também apelou ao Reino Unido para que deixasse a UE. O homem que é tido como o arquitecto da UE moderna e do euro, rompeu com a cautela típica dos líderes europeus num esforço para oferecer à Grã-Bretanha uma saída. “Os britânicos estão apenas preocupados com os seus próprios interesses económicos, e nada mais. Devia ser–lhes oferecida uma forma diferente de parceria”, disse Delors ao “Handelsblatt”, um jornal económico alemão. “Se os britânicos não querem um nível maior de integração na Europa, podemos mesmo assim ser amigos, mas numa base diferente. Consigo vislumbrar uma alternativa que mantenha a abertura no acesso ao espaço económico europeu ou um acordo de livre comércio”, adiantou.
A França reagiu mal às exigências feitas pelo primeiro-ministro britânico, David Cameron, de que alguns poderes atribuídos a Bruxelas fossem devolvidos aos parlamentos nacionais e de que a promessa de uma “união cada vez mais estreita” fosse retirada dos tratados da UE. Segundo fontes diplomáticas, Paris está farto das ameaças de Cameron de que se não houver uma reforma “a bifurcação dos caminhos se torna inevitável”.
A França surge na crista dos países hostis a uma alteração dos tratados e aos pedidos de referendos nacionais que se traduzirão em votos contra o euro. Paris defende a necessidade de uma “união cada vez mais estreita”, dado que esta assegura que a Alemanha continua no euro.