2002, Coreia do Sul-Portugal.Um soco violento no Park


“A ciência compõe-se de erros que, por sua vez, são os passos até à verdade.” Se o autor desta frase inspiradora (Júlio Verne) conhecesse a selecção nacional de 1986 e a de 2002, faria marcha atrás. Porquê? Simples, o erro repete-se 16 anos depois. No Mundial do México, um caso de doping atira Veloso (Benfica)…


“A ciência compõe-se de erros que, por sua vez, são os passos até à verdade.” Se o autor desta frase inspiradora (Júlio Verne) conhecesse a selecção nacional de 1986 e a de 2002, faria marcha atrás.

Porquê? Simples, o erro repete-se 16 anos depois. No Mundial do México, um caso de doping atira Veloso (Benfica) para fora dos convocados, substituído por Bandeirinha (Académica). No Mundial Coreia do Sul/Japão, é Kenedy (Marítimo) quem sai à última hora.

“O que aconteceu”, sustenta o jogador, “foi que tomei um comprimido para emagrecer durante a minha semana de férias, entre o fim do campeonato e o início do estágio. É um dia triste para mim.” Mais à frente, Kenedy dá uma bicada. “Apanhei por tabela, estou metido numa guerra entre a federação e os responsáveis pelo controlo antidoping, mas não quero ir por aí. Só quero deixar claro que não me dopei.” Hugo Viana é repescado.

A esta confusão alia-se a lesão de Figo, provocada por Deco num Real Madrid-FC Porto em Fevereiro para a Liga dos Campeões. Três meses depois, o melhor do mundo para a FIFA ainda tem o pé direito do tamanho de uma batata. O jogo de estreia é com os EUA e o início não poderia ter sido pior: 3-0 aos 36 minutos. Marcamos dois golos mas não evitamos a embaraçosa derrota.

Segue-se a Polónia. Em dia de aniversário, Oliveira aparece em campo de muletas por ter torcido o pé esquerdo no hotel e acerta a táctica com o regresso do 4-2-3-1 da fase de qualificação depois da infeliz experiência do 4-1-3-2 no primeiro jogo da fase de grupos. Paulo Bento entra no onze para jogar ao lado de Petit. Fortalecido o meio-campo, Oliveira tem de abdicar de um elemento no ataque. Pauleta é o 9 de eleição e João Pinto recua para 10. Rui Costa encosta.

Quatro dias separam o 4-0 à Polónia do jogo com a anfitriã Coreia do Sul. Nesse período, França e Argentina fazem as malas.

O seleccionador António Oliveira continua de muletas e só faz uma alteração, com a troca de lateral-direito: reentra Beto para o lugar de Frechaut. De resto, o mesmo esquema do 4-2-3-1 com João Pinto entre Sérgio Conceição e Figo a alimentar Pauleta. De fora, Rui Costa.

À partida, temos de ganhar. Mas se a Polónia ganhar aos EUA, um empate é o suficiente para o apuramento rumo aos oitavos-de-final. Espera-nos o México. Antes do jogo, a fadista Mariza canta o hino e há uma emoção diferente. São 12h30 da tarde em Portugal continental. O jogo começa à hora marcada, com João Pinto a dar para Pauleta. Um minuto depois do primeiro remate do jogo, a Polónia dá-nos uma alegria com o golo de Olisadebe. No instante seguinte, 2-0 da Polónia. Quer isto dizer que o nulo em Incheon vale-nos o apuramento directo e fecha a porta do Mundial aos EUA. Diz-se que Oliveira proíbe os jogadores de saberem o resultado do outro jogo mas isso nem é o pior.

Aos 26 minutos, João Pinto atropela Ji-sung Park num lance a meio-campo. A entrada é violenta, a bola não é tida nem achada no assunto. O árbitro argentino Ángel Sánchez nem pensa duas vezes e puxa o cartão vermelho, João Pinto enerva-se ainda mais e dá-lhe um murro no estômago com o punho direito. O esgar do juiz sul-americano, num misto de incredulidade e dor, é um poema.

Na segunda parte, Beto vê o segundo amarelo (66″). Com nove em campo, Oliveira tira Pauleta e coloca Jorge Andrade. A ideia de defender o 0-0 cai por terra aos 70″, num remate de Ji-Sung Park (o tal da entrada dura de João Pinto). A Polónia continua a ajudar-nos (3-1) e Portugal ainda acerta no poste (Conceição 88″) mas o adeus é inevitável quando Ángel Sánchez apita para o fim.

A chegada ao aeroporto da Portela é um misto de emoções desmedidas. João Pinto é mais aplaudido que assobiado. “Não agredi ninguém”, diz o 8. A FIFA não é dessa opinião e suspende-o por quatro meses, já depois de finalizado o Mundial. Voltaria a jogar em Outubro (Sporting-Belenenses 2-0), mas a selecção nunca mais conta com ele.