
A CDU foi o partido que emergiu vencedor das eleições legislativas do passado domingo, mas é a Alternativa para a Alemanha (AfD) que regista o maior crescimento, cimentando-se como segunda potência no cenário político alemão, relegando o histórico SPD para terceiro lugar.
As eleições europeias e as sondagens mais recentes já previam o aumento de relevância do partido associado à extrema-direita, e o resultado foi realmente positivo. O partido liderado por Alice Weidel conquistou 20,8%, ficando a apenas 7,8% do partido mais votado, o que lhes permitirá uma presença substancial no Bundestag, com 152 legisladores eleitos.
O background de Weidel
A líder da AfD nasceu a 6 de fevereiro de 1979 na cidade de Gütersloh, na então República Federal Alemã. A sua ascendência gerou polémica em novembro do ano passado, após o Politico ter publicado uma peça sobre a ligação estreita do seu avô com o III Reich, o que fomentou ainda mais as críticas à AfD que tem sido comparada ao obscurantismo hitleriano. O seu avô, Hans Weidel, «foi um importante juiz nazi, nomeado diretamente por Adolf Hitler, responsável pela condenação dos opositores do III Reich», segundo «uma investigação do Welt am Sonntag, com base em extensos documentos de arquivos alemães e polacos».
O assunto raramente foi mencionado pela líder da AfD, naturalmente, que já frisou em várias ocasiões a necessidade de a Alemanha seguir em frente e acabar com o «culto de vergonha» em relação ao passado negro de meados do século XX. Segundo a mesma peça, através de um porta-voz, Weidel disse que não tinha conhecimento do passado nazi do seu avô. «Devido à discórdia familiar, não houve qualquer contacto com o avô, que morreu em 1985, nem foi tema de conversa na família», disse o porta-voz. Weidel tinha seis anos quando o seu avô Hans morreu. A sua avó, também ela membro do partido nazi, faleceu dois anos mais tarde.
As tentativas de branqueamento do regime nazi por parte de altos membros da AfD – como a abordagem ao Holocausto e ao próprio período negro da história germânica – fazem soar os alarmes sobre o partido, que já tinha sido classificado como «suspeito de ser um grupo de extrema-direita» pelo serviço de informações internas da Alemanha, o BfV. Estes episódios mancharam a imagem do partido, que foi marginalizado na Europa por outros líderes da direita – também apelidados de extrema-direita –, como o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán ou Marine Le Pen.
A inspiração
Mas Weidel parece não estar nessa linha. A líder da AfD é doutorada em economia, trabalhou no Banco da China, onde viveu por seis anos, e acabou por escrever a sua dissertação sobre o futuro do sistema de pensões chinês, avançou a agência de notícias alemã Deutsche Welle. É também parte de uma direita mais pró-mercado, como fica patente no seu mais recente programa eleitoral, tendo chegado a admitir a sua admiração por Margaret Thatcher, a líder do partido conservador e primeira-ministra britânica na década de 1980. Em entrevista ao jornal alemão Bild, Weidel disse que a biografia da Dama de Ferro a impressiona e valoriza a sua capacidade de «nadar contra a maré, mesmo quando as coisas se tornam desagradáveis». A germânica parece querer seguir o mesmo caminho, e estabeleceu uma comparação entre a situação económica do Reino Unido no final da década de 1970 e a alemã no presente: «Thatcher assumiu o poder na Grã-Bretanha quando o país estava economicamente em baixo e voltou a pô-lo no bom caminho».
Contra as minorias?
Uma das principais críticas feitas à AfD é o seu alegado desrespeito pelas minorias, sejam elas étnicas ou sexuais, travando uma batalha cultural que te sido transversal à Europa e nunca se envergonhando de vincar a sua posição contra o wokismo e contra a imigração desregulada. O que salta imediatamente à vista ao consultar as notas biográficas de Alice Weidel – e tem sido algo amplamente explorado e debatido – é que a líder da AfD é homossexual e casada com uma imigrante proveniente do Sri Lanka, com quem adotou duas crianças, contrariando o ideal do partido que advoga pela família tradicional, onde «a mãe e o pai assumem permanentemente a responsabilidade conjunta pelos filhos». Weidel disse em 2017, citada pela Deutsche Welle, que esta situação poderia incomodar «uma ou duas pessoas» do partido, mas desvalorizou, garantindo que «isso também existe noutros partidos».
Alice Weidel é também das poucas mulheres que representam a AfD no Bundestag, sendo que o grupo parlamentar, até às mais recentes eleições, era composto por apenas 9 mulheres e 69 homens. Mas, independentemente de todas as características minoritárias, Weidel não escapa à crítica dos ativistas pelas causas das minorias.
Projetos de futuro
Este aumento substancial de votos faz com que a AfD tenha agora outras responsabilidades. No último debate antes das eleições, Weidel já tinha dito que estenderia a mão ao novo chanceler, Friedrich Merz, garantindo que estaria aberta a «propostas racionais da CDU» e que «o povo decidiu que quer uma coligação entre azul [AfD] e preto [CDU]», acusando Merz de ter descartado a possibilidade.
A AfD tem sido caracterizada como uma iniciativa eurocética e pró-Rússia, depois de defender posições que indicam a limitação do peso de Bruxelas sobre a soberania dos seus Estados-membros e que advogam pelo fim da guerra na Ucrânia a qualquer custo, mesmo que seja prejudicial para os ucranianos.
Assim, aguarda-se pela liderança de Weidel na próxima legislatura, que será o verdadeiro teste do algodão para apurar se será mais um caso de sucesso da direita europeia ou se acabará por levar o partido à implosão, como também já tem acontecido. Para já, o partido é popular – e populista, segundo vários analistas – e será a oposição oficial a um governo de bloco central entre a CDU e o SPD.