Helder Macedo. “O sal que teria sido o teu sabor”

Helder Macedo. “O sal que teria sido o teu sabor”


Perto dos noventa, e com a morte a dominá-lo, o poeta lança-se num assalto decisivo, trazendo a memória de quantos corpos e amores lhe serviram de ímpeto e que, à medida que se sente arrastado, lhe permitem ainda desferir uma série de soberbos golpes nesta derradeira inimiga


Por estes dias, já se nos antecipa alguma coisa do que possa ser a experiência da morte. Uma indiferença que nunca deve ser confundida com um traço de carácter, mas que é antes de mais uma facilidade em despedir-se das coisas, uma certa inclinação para a morte da qual nos defendíamos com essa outra facilidade de nos enamorarmos ou empenharmos em causas, suspendendo essa indeterminação. Mas se podemos falar de uma época que se aplica num esforço de ignorância, que a ela se entregue com orgulho e o prepara e serve como o seu veneno, numa tosca perfídia mal calculada, a de um desdém demasiado sumário, num desgosto que alastra a tudo e numa displicência criminosa, sabemos o que significa a morte. Sabemos desse silêncio que não é uma trégua, mas um sinal de guerra, como tantos se esforçam por negar até ao limite do patético o que se torna, por isso, a tal ponto manifesto que logo deles troça. Esses modos de se aferrar a ilusões julgando assim preservar-se.

No fundo, se os deuses desertaram e nem da sua elevada intriga nos resta um vago rumor, se nos cabe inteiramente construir o juízo e definir sozinhos o lugar do destino que nem por isso ficou vazio, como vinca Eduardo Lourenço, a nossa questão é a mesma de Hamlet, “mas sem reino da Dinamarca para nos justificar, sem crânio repousante para suportar a angústia do mundo, sem ‘ser’ ou ‘não-ser’, apesar de tudo, luminosamente divididos pela presença da Morte que como príncipes sarcásticos segurávamos nas mãos com um à-vontade de coveiros e uma intimidade de monges”.

A própria morte vem-se degradando, e já não significa o combate desesperado de cada um com essa medida do Além que está inscrita dentro de nós, como se a própria morte quisesse experimentar algo da agonia que provoca naqueles que por ela vão ser dominados, mas a morte vem sendo desgastada, decomposta em trocos para aliviar o pavor dos que nunca souberam digerir essa constatação. Hoje, é evidente que não há qualquer forma de êxtase ou compensação que se possa retirar de um esforço por se separar de si, perder-se na distância, algo que as religiões tradicionalmente tinham procurado difundir como um cautério. É evidente como por trás de tantos beatos não está outra coisa senão um pavor insanável, entupindo-se de promessas e inscrevendo-se em todos os programas extra-curriculares e vendo-se a integrar a equipa de manutenção desta imensa porra. Mas mesmo então, mesmo nessas reuniões nocturnas dos funcionários do Além, ela penetra, com a sua força de contágio. E são raros aqueles que aprendem a gozar essa “sempre mais amarga ferida/ a escuridão que gera o próprio canto”, como escrevia em Vesperal (1967), Helder Macedo.

Para escrever um único verso, como lembrava Blanchot, é necessário ter esgotado a vida. Mas são cada vez mais aqueles que parecem ter optado por uma postura somítica em relação a esta, não querem ser vistos a dissipá-la, esperando que a morte assim se atarde, seja clemente com eles. Há quase seis décadas, Macedo preferia encher as medidas de um “corpo enlaçante”, de um “rosto suculento”, trabalhar o verso como uma juventude: “a vida elaborei para um destino/ que me obrigasse ao corpo só/ e à noite”. Havia uma clareza desabrida, mesmo se não evitava por vezes certos enlevos excessivamente clássicos, enredantes, uma solenidade formal algo sufocante, não evitando ser tantas vezes visto na companhia desses esquadrões da morte da tradição. Mas não deixava de aparecer com “as mãos rasgadas”, e aquela urgência em retirar “de cada gesto o peso”. Foi um poeta tão pouco lido, tantas vezes ignorado, mas também isso o poupa ao infausto excesso das cerimónias que têm procurado fazer da poesia outra instância tão desoladora e vã dessa cultura, no seu nível mais degradado, tão incapaz de resistir ou se implicar de forma decisiva em qualquer combate, tornando-se um mero reflexo de um século podre de refinamento, sempre tão facilmente “assimilada”, reclamada por todas as facções com o mesmo grau de petulância e esterilidade.

Nos seus melhores momentos, Helder Macedo soube queimar o seu rastro e a partir de cinzas elaborar a sua mente, dar-nos a imagem de um príncipe sarcástico, capaz daquela gravidade meio afectada dos senhores, mas apenas para cumprir esse gesto melífluo, essa acutilância fabulosa que nos merece a tal cultura de que nos vemos cercados. Afinal, por muito que custe àqueles que aceitam todos os pactos e compromissos, nunca se identificaram melhor essas formas de autoindulgência contra as quais a poesia deve impor-se, todo esse ritual em torno de objectos caseiros, transportáveis, como simples espelhinhos de bolso, enquanto buscam uma conversão que de elementos de culto passam a só respirar confiantemente no ambiente do espectáculo. Mas se nem sempre Helder Macedo soube ir até ao limite da recusa, e se em anos recentes se deixou capturar nesse enredo de cumplicidades e complacências, mesmo se tinha o cuidado de apenas se deixar fotografar com ar circunspecto, mais recuado e ao canto no retrato de grupo dos nossos festivais, era como se reconhecesse que a diferença só pode ser apercebida dentro de um contexto, e que abdicar inteiramente de marcar presença seria deixar-se dissolver na distância. Assim, e por mais que Breton barafustasse, afirmando que tudo aquilo que se pode realizar no terreno intelectual acabará sempre por tresandar ao pior servilismo ou à mais completa má-fé, a rejeição total acaba por ser ela mesma uma forma de capitulação, e o combate exige uma atenção e proximidade, sendo isso quase tudo o que nos une a uma vivência cultural tão débil e previsível, com os seus desacatos tão improfícuos.

Em Corpos da Memória temos um soberbo canto de cisne. Um livro brevíssimo e pungente, um momento muito alto numa obra poética que, em grande medida, permanece desconhecida, e que aqui se furta àquela tentação mais corrente que procuraria reforçar certos elementos mais notáveis ou reconhecíveis num percurso tão lento e laborioso ao largo de décadas, em linha com essa constante récita que passa sobre tudo fingindo homenagear, quando não faz mais do que petrificar tudo o que houvesse de espontâneo e mais valioso numa obra. Também por isso é que temos a sensação de que não passa muito tempo sem que nos inteiremos de como alguma inteligência estimável se “formalizou”, dando a sensação que só resta aos discursos literários conduzirem-se com mais ou menos sobriedade, mas sem indispor ou perturbar demasiado as boas consciências que dão expressão ao consumo cultural. Na lesta nota prefacial, Macedo assume que anda muito chateado, tendo como certo que estes são os últimos poemas que nos faz chegar em vida – “e não gosto nada de deixar de poder ser”. Mais importante é a forma como entrelaça os versos com uma razão de ser, a voz que corresponde a uma “ávida face”, lembrando que houve sempre essa margem vibrante, esteve “sempre a escrever poesia, mesmo quando a parecer que não”. E acrescenta: “Pois é, nunca quis publicar versos parecidos. Para isso bem bastam os versos de outros. (…) Entretanto aqui estão estes. No ano em que completarei (completaria? – depois digam) noventa anos. Pensei em chamar-lhes Poemas de Amor e Desamor. Mas sei lá, às vezes coexistem, até podem ser intermutáveis. Por isso preferi chamar-lhes Corpos da Memória.”

Como um professor de piano, incutindo em nós aquela disciplina sem a qual toda a urgência erra pelo vício de se enredar numa actividade tão excessiva quanto enganosa, a morte está ali para nos obrigar a ouvir esse silêncio que nos cerca de todos os lados, a superar o ruído daqueles que tagarelam a fim de se esconderem dela. A escrita é um modo de fazer de si esse instrumento tão poroso, afinar-se descendo a sós ao ponto mais escuro de si, tentando captar essa agonia permanente da realidade humana, e fazer dela uma música calada, mas que se oiça enquanto o mesmo impulso resistir noutro homem. “Na literatura, como no resto, não há vivos por ‘direito divino’ (ou só os há por ‘direito divino’, isto é, pelo fervor presente que neles se vivifica)”, escreve Eduardo Lourenço. Mas este mesmo presente não é privilégio, não é olhar absoluto, à maneira da última edição do Larousse. O mundo da literatura é um mundo intrinsecamente mortal, por ser um mundo vivo onde o juízo final é em permanência o juízo do mais antigo passado pelo presente e do presente pelo passado.”

Esta mesma consciência nos toca a partir destas páginas breves mas excessivas como um espelho, esse tumulto de reflexos que se encadeiam a partir do momento em que olhamos o mundo com a grave consideração de que talvez o façamos pela última vez. “Visito os álbuns das fotografias/ como se me visse à minha espera/ com os outros mortos/ ainda vivos/ nos cemitérios do nosso esquecimento/ onde os corpos eternos são as almas/ dos efémeros fantasmas que já fomos.” Este é um livro tão forte por se mostrar dominado por esse inebriamento da constatação do fim, sem procurar refugiar-se na posteridade, ou em ilusões parecidas, o de um ser que se mostra capaz de não pertencer já a ninguém nem a nenhum tempo e com esse abandono a escrita já não se sente na escrita a menor ambição literária, mas esse efeito de “fervor presente”, de força irrenunciável que se liga a uma lucidez terrível. Como nos diz Elias Canetti no seu livro de notas, aforismos e balbucios ou invectivas contra a morte, “só no interior das suas frases dispersas e contraditórias é possível a uma pessoa manter-se unida, coerente consigo mesma, ser inteiramente alguma coisa sem renunciar ao mais importante, a possibilidade de se replicar, de respirar, experimentar os seus próprios gestos, elaborar o seu próprio sotaque, praticar o uso de diferentes máscaras, recear as suas próprias verdades, emplumar as suas mentiras de modo a passarem-se por verdades, azucrinar a morte e, uma vez rejuvenescido, desaparecer”.

Este livro consegue essa proeza sem deixar de tratar a morte com uma estranha delicadeza, com modos corteses, sem recorrer à imprecação ou aos insultos da praxe nem envergar aquele tom ofendido, exprimindo uma mágoa desmedida. Não é que Helder Macedo esteja em paz com a ideia, mas há nele uma poderosa resolução, como só a vida pudesse regenerá-lo, e fosse esta que se esgotou e não ele. Não parece minimamente arreliado, como é o caso de Canetti, por outros ficarem, e a vida prosseguir sem ele, não mostra um verdadeiro ressentimento, mas apenas alguma tristeza diante dessas possibilidades ou desejos que entreteve, mas não pôde viver até ao fim. “E assim fiquemos/ sem mágoa e sem regresso/ despedidos/ de um amor que ainda fosse/ no que de nós em nós deixou de ser.” Tratando-se de um livro final, não há nele qualquer concessão a um efeito de grandiosidade, senão essa coragem de enfrentar a coisa com um tal grau de determinação que parece ser a morte quem prefere desviar o olhar. Por isso também, se resplandece uma ousadia fabulosa é essa consciência de que “o último corpo que se sente vivo/ é o próprio corpo quando morre”. Não quer por isso dizer que muitos dos que morreram antes, não tenham nesse hausto derradeiro abrangido muito mais futuro do que aqueles que julgam ter-lhes sobrevivido. A eternidade não se impressiona com a longevidade de uma vida em termos dos anos, mas muitas vezes não consegue ultrapassar aquelas horas que alguém passou a sós, ensaiando uma frase até à exaustão no esforço de reter um pedaço da sua vida. Por outro lado, ao ler os últimos poemas de certos poetas fica-nos a sensação de que foram capazes de se aproveitar da proximidade da morte para inverterem a relação entre predador e presa, lançando-se sobre ela, devorando-a quando a luz lhes era subtraída, aproveitando-se dela, de uma forma quase física, parecendo que escreviam agarrando o indicador desta, gastando a unha negra que se desfez no papel como carvão. “Quando o futuro está todo/ quase todo/ contido no passado/ o tempo inverte o seu percurso/ ou nós o dele/ na memória imaginada/ como se futuro fosse.// As palavras são as mesmas/ com outros habitantes/ nas fontes, rios, lagos, mares,/ furnas, montanhas, amizades que pudessem ser amores/ reciprocados/ espelhos do mundo que nos coube/ por não cabermos nele/ ou ele em nós.”

O poeta passeia uma última vez pela face da terra, tomando-lhe o peso e a respiração, e se em tempos já se sentiu eco de si próprio, agora coincide de forma de tal modo feroz com esse vulto que preenche que não há margem sequer para transmitir um reflexo. Concentra em si o tempo todo, o mundo que atravessou e recompôs, entre aquilo pôde ser ou imaginou. “Agora não há espelhos/ nem eu sou quem neles me vejo/ os amigos morreram/ os amores acabaram/ os poemas tornaram-se silêncios/ que só podem ser lidos/ nos vazios que houvesse/ entre as palavras/ de outra língua/ de outra terra/ de ninguém.”

A força destes poemas está também naquilo que, apesar de tudo, subjaz à escrita, nesses elementos que não podem ser saciados nela: “Não se pode beber água da palavra água/ faz mais sede/ no intervalo entre a boca e o desejo”… E então fica claro que a vida é como uma distracção da morte, como se esta baixasse a guarda por um instante, esse em que se torna possível desferir-lhe um golpe que a desequilibre e instile nela essa dose de sonho ou paixão que é a vida irreal que os homens trouxeram ao mundo. “A vida/ fivela que ata as duas pontas da morte/ com as migalhas que um deus imaginado/ multiplicou// em milagrosos pães inteiros/ nos silos do desejo./ Amámos/ as migalhas consumidas.”

Este é o último livro de um poeta que há muito começou a sentir alguma dificuldade em “ser tão velho como sou”, e que, incapaz de refugiar-se num “senil contentamento”, vai esbravejando, dando luta ao fim, sentindo desejo quando outros já não estão para isso, ao ponto de sentir que nele “o amor foi mais forte do que a morte/ corpo a corpo transformada/ em aparência de vida que sobrassem/ na memória dos corpos inconclusos”. E o último poema termina mesmo da forma mais crua, com uma dureza magnificente, engalfinhando-se com as suas limitações: “e odeio velhos/ apetece-me dar-lhes empurrões/ apetece dar-me pontapés/ com a perna que dói menos/ na perna que dói mais// vértebras comprimidas/ próstata alargada/ olhos lacrimejantes/ lábios frouxos/ dorso recurvado/ ventre flácido/ cancro/ perdi nove centímetros de altura/ bengala tateante/ jovens mulheres dando-me o braço núbil/ com cuidados maternais/ para que não caia nas escadas// e ainda assim a querer certificar-me/ de que não cheiro a ranço/ a corpo inabitado/ a cuspo ressequido/ a castidade/ a merda/ a mijo/ a padre confessor/ a desejo requentado na lembrança// ainda assim/ ainda assim/ enquanto a vida vive em mim/ até ao fim.”

Tomara a muitos, a quase todos, mesmo nos momentos de maior força e tenacidade, de pura e exaltada embriaguez vitalista, coroar-se com tamanha fúria contra essa noite escura.

Este é um livro quase perfeito, quase porque a perfeição seria menos fecunda, não ofereceria margem a essa potência do inacabado, e se há um grande rigor, uma profunda meditação em cada verso, não deixa de haver também de se debater quase instintivamente contra essas noções que arrefecem como verdades, e isso dá ao livro um tremor sem o qual pareceria um texto póstumo. É um livro que corre o risco de passar despercebido, nesta língua onde tudo o que seja expresso de forma tão singular está condenado a resistir na sua abissal fragilidade, e é um livro tão cativante porque não pode deixar de surgir como um acontecimento íntimo na vida do leitor, no seu diálogo com a sua própria mortalidade, mas também por surgir “numa época como a nossa em que se tocam com o mais extremo frenesi o sentimento de uma radical fragilidade da História humana no seu conjunto e o sentimento de que essa mesma História é a mais potente e mesmo a única realidade” (E. Lourenço).

Embora não seja a agonia da realidade aquilo que vemos ser confrontado nestas páginas, percebemos como Helder Macedo tem muito claro como a poesia é, em termos de imaginação e de sensibilidade, o combate dos homens pela sua própria realidade. E, assim, não deixa de ser tocante, como nota Canetti, que as letras do alfabeto ainda possam significar alguma coisa, que ainda retenham as suas formas e o seu peso de modo a poderem manifestar alguma coisa nesta paisagem destruída de crenças pontuadas por corpos. Que estas ainda resistam como sinais em vez de se terem desintegrado como a própria vida não deixa de nos provocar um certo assombro. Que não se tenham apagado num momento de dúvida ou vergonha, e que cada frase urgente que tenham sido forçadas a compor ainda guarde o seu potencial, isto ainda nos causa um secreto fascínio. 

Há medida que as lembranças se liquefazem, mesmo assim há detalhes que escapam às marés do esquecimento, e é ao resgate desses corpos que este livro se dedica. “Como um belo, frágil/ beneficente monstro/ construído de fragmentos/ depredados/ assim sobram os amores que já não são/ por nunca serem/ as faces, nomes, lábios, olhos, corpos,/ lugares intermutáveis/ no corpo da memória (…)”

Trata-se de suspender o tempo, de corroer esse género que nos deixa impotentes diante das estruturas cronológicas, indo ao encontro desse efeito de produção da memória, e que passa pelas dores que o corpo recorda, que nele estão inscritas e podem ser reabertas, revistas e recompostas… “É no futuro que a vida é sempre igual/ no passado nada é como já foi/ as causas boas/ os efeitos duvidosos/ as escolhas/ as recusas/ cartas, fotos, testemunhos,/ encontros, desencontros/ vão mudando com o tempo/ de outro tempo”… Há um passado que só pela memória pode ser reencontrado, e muitas vezes esses passos perdidos com que nele mergulhamos, é daí que emerge uma outra consciência, um radical elemento de transformação. E para um livro que marca um confronto tão directo com a morte, este é estranhamente luminoso, como se reconhecesse que a marca humana assinala essa fronteira invisível em que, entre uma imagem recordada e reavivada por esse efeito da imaginação, que compensa certas lacunas, extravasando os elementos mais fortes, há um ponto em parece que o mar às tantas naufraga, e a morte transborda, “fechada sobre si/ na luz emudecida dos corpos concluídos”. Chega-se ao fim de um contorno, sem o apagar. É a morte que não tem memória, e por isso não consegue imaginar mais nada. Mas quem viveu em luta contra os limites da própria vida, transmitiu ao seu eco o mesmo fervor para refazer mil outras hipóteses. “Chegar ao fim da vida/ não é o mesmo que chegar à morte/ nem a morte chegar/ onde sempre me habitou/ com o meu nome// é um desexistir que ainda fosse,/ um conceito que não sabe ser pensado,/ o verso solto de um poema já não escrito/ na luz mutável deste sol filtrado/ pelas folhas secas/ cor da terra/ que caem sobre a terra humedecida/ como se a ela regressassem/ de entre as folhas outonais ainda verdes/ desta árvore anterior a esta casa/ a esta rua/ esta cidade/ este país estrangeiro que me habita// como se fosse ela que me visse/ na janela sem memória/ da finita eternidade onde me vejo.”