CDU vence, AfD cresce e SPD cai a pique

CDU vence, AfD cresce e SPD cai a pique


A CDU/CSU venceu as eleições legislativas alemãs. O crescimento da AfD tem causado preocupação, e as linhas vermelhas impostas por Merz farão com que tente uma solução com o SPD e os Verdes. Os liberais do FPD ficaram aquém dos 5% necessários para garantir representação no Bundestag


O principal partido do governo cessante, os social-democratas do SPD, sofreu a maior queda, tendo ficado em terceiro, conseguindo apenas mobilizar 16,4% do eleitorado. Os Verdes registaram uma perda de 3,1% dos votos, mas a penalização do FDP foi a mais pesada, uma vez que não conseguiram chegar aos 5%, requisito mínimo para garantir representação no parlamento alemão.
O crescimento notável da Alternativa para a Alemanha (AfD) – partido conotado como de extrema-direita – foi, provavelmente, o acontecimento mais controverso, mesmo que tenha sido pouco surpreendente. O partido liderado por Alice Weidel já tinha sido o segundo mais votado nas eleições europeias do passado 10 de março, tendo agora fortalecido o seu estatuto de segunda maior potência. Arrecadando 20,8% dos votos – mais 10,4% e 4,9% que nas últimas legislativas e europeias, respetivamente – os eleitores que escolheram a AfD terão agora 152 representantes no Bundestag, o parlamento germânico.
A coligação que venceu as eleições cresceu 4,4% em relação às legislativas de 202, mas recebeu menos 1,4% dos votos que nas últimas europeias. O Linke, partido de Esquerda, viu um crescimento na ordem dos 3,9%, conseguindo 8,8% dos votos, e o BSW, também de esquerda, ficou a apenas 0,3% de entrar no Bundestag, o que complicaria ainda mais a aritmética pós-eleitoral. Assim, a CDU contará com 208 legisladores, a AfD com 152, o SPD com 120, os Verdes com 85 e o Linke com 64.
O processo democrático foi também um dos vencedores da noite, com 84% dos eleitores a deslocarem-se aos seus locais de voto – a maior participação desde 1990, data da reunificação alemã após o colapso do Muro de Berlim e da União Soviética.

Cenários de governação

Mesmo com a vitória, a CDU ficou longe de uma maioria absoluta que lhe permitiria governar sem qualquer tipo de apoio exterior. Assim, Merz entrará agora num período de negociações que não serão certamente fáceis. Existindo uma maioria clara à direita, esse cenário parece estar fora de questão, uma vez que o líder da CDU, à semelhança de outros líderes europeus do centro-direita, traçou linhas vermelhas quanto a uma coligação com a AfD. Weidel tinha frisado a sua disponibilidade para tal, garantindo que estariam “abertos a propostas racionais da CDU”. “O povo decidiu”, continuou, “que quer uma coligação entre azul [AfD] e preto [CDU]”, mas acusa Merz de ter “descartado” a possibilidade de unir os dois partidos mais votados.
Estando a aliança à direita descartada, o novo chanceler terá de virar para a esquerda, onde existem dois cenários possíveis: uma coligação de centro, apenas com o SPD, e uma mais alargada, juntando ainda os Verdes. A primeira garantiria uma maioria frágil de 328 deputados, sendo que a segunda seria mais confortável, uma vez que teria o apoio de 413 legisladores. A questão que se tem colocado é a seguinte: estas coligações não representarão mais do mesmo com pequenas diferenças? Merz já desvalorizou o processo de negociações, dizendo que a Alemanha necessita de “uma formação rápida e sensata de um governo”. “Temos de nos tornar capazes de atuar a nível internacional”, continuou deixando clara a sua esperança de formação de governo “até à Páscoa”. “A Europa está à espera da Alemanha”, concluiu. Na sua declaração de vitória nas redes sociais, o novo chanceler disse que iria “cumprir rapidamente” o mandato governamental, “porque o mundo lá fora não está à nossa espera. Nem está à espera de longas conversações e negociações de coligação. Temos de voltar rapidamente à ação”, garantiu.

A migração dos votos

Numa análise às eleições, a agência de notícias alemã DeutscheWelle demonstrou com gráficos o interessante fenómeno da migração de votos. Os números relativos ao SPD mostram que 2 milhões de eleitores do partido nas últimas legislativas rumaram à CDU, 720 mil à AfD, 560 mil ao Linke e 440 mil ao BSW, tendo o partido apenas captado novo eleitorado do FDP e dos não votantes de 2021. A CDU perdeu 1 milhão para a AfD e valores residuais para o Linke e para o BSW, sendo que a reconquista de votantes ao centro – 2 milhões ao SPD, 1 milhão ao FDP e 900 mil a não votantes – lhe permitiu a vitória.
A AfD, que tem seguido o rumo da chamada internacional conservadora, fazendo campanha pelo fortalecimento do controlo da imigração e contra a agenda woke e globalista – não deixando de ser interessante que a sua líder seja lésbica e casada com uma imigrante do Sri Lanka –, beneficiou principalmente do voto de eleitores que não se dirigiram às urnas há 3 anos e meio, o que pode ser interpretado como voto de protesto. Perdeu apenas 60 mil eleitores para o BSW.
Também o Linke roubou votos a quase todas as outras forças partidárias, à exceção da AfD e do BSW. Este último foi o único partido que ganhou votos em todas as frentes, acabando, ainda assim, por não conseguir os 5% exigidos.
Outro dado que salta à vista dos resultados de domingo é o voto dos jovens entre os 18 e os 24 anos. A maioria optou pelas alternativas de extremos opostos, com a AfD a merecer 21% dos votos desta faixa etária, enquanto o Linke conseguiu 27%. Os partidos tradicionais – SPD, CDU, Verdes e FDP – ficaram pelos 11%, 12%, 10% e 6%, respetivamente.
Assim, esperam-se tempos desafiantes para Alemanha, que espelha o que tem sucedido noutros países europeus e que corre o risco de entrar num impasse político ao estilo do outro grande motor da União: a França. Agora aguarda-se o período de negociações e os alemães esperam certamente ansiosos que o novo executivo possa responder aos seus mais urgentes anseios.