Donald Trump será empossado como Presidente dos Estados Unidos na próxima segunda-feira, dia 20. É o regresso do 45.º, agora 47.º, líder da maior potência mundial à Casa Branca após quatro anos de interregno democrata. O multimilionário voltará a jurar ser fiel à Constituição oito ano depois da primeira vez, agora numa conjuntura internacional que lhe apresenta múltiplos desafios em várias geografias. A transição de poder aparenta estar a decorrer com normalidade, ao contrário do que aconteceu na última vez, e Trump, juntamente com J. D. Vance consumarão a sua contundente vitória eleitoral de 5 de novembro. Não é demais relembrar que os Republicanos conquistaram o voto popular e estarão em maioria em todos os braços de poder do sistema americano – tanto em ambas as câmaras do Congresso quanto no Supremo Tribunal.
Revolução conservadora
A nova presidência de Trump traz consigo não só uma mudança substancial em termos políticos, mas é o ponto fundamental que marca definitivamente uma revolução conservadora um pouco por toda a parte. A vitória de Trump é o culminar da reversão de tendências, onde o nacional-conservadorismo e o conservadorismo liberal emergem como ideologias dominantes face à social-democracia e ao próprio socialismo. Uma contrarrevolução que já havia começado com a eleição de Giorgia Meloni em Itália, de Javier Milei na Argentina e até de Nayib Bukele em El Salvador. Todos os nomes desta nova “internacional conservadora” estarão presentes na cerimónia, que também contará com a presença de André Ventura.
O primeiro condenado
Donald Trump será o primeiro Presidente condenado da história dos Estados Unidos. Uma saga judicial que se tem arrastado desde maio de 2024 – onde o Presidente-eleito foi considerado culpado de 34 acusações – chegou ao fim na semana passada, após a sentença do juiz Juan Merchan, que diz ser importante dar o caso como encerrado, reportou a BBC. A decisão final foi a de uma exoneração condicional, ou seja, não haverá pena de prisão, multa ou até liberdade condicional.
Independentemente de todo o imbróglio sem precedentes na Justiça, uma das grandes expectativas para esta segunda presidência de Donald Trump recai, sem surpresa, no âmbito da política externa. Herdando conflitos na Europa e no Médio Oriente e altas tensões no Mar do Sul da China, em particular no estreito de Taiwan, a presidência de Trump acabará por ser, em última instância, avaliada e relembrada consoante o sucesso ou fracasso neste vetor, com a dimensão interna a ter menos peso na análise histórica. Consigo, o realismo regressará à Sala Oval, onde a «paz pela força» será a linha orientadora da ação americana no estrangeiro, algo que já foi apreciado pelo Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky e parece começar a surtir efeito no Médio Oriente.
O cessar-fogo
Na quarta-feira, a escassos dias da tomada de posse, foi anunciado um princípio de entendimento para um cessar-fogo entre Israel e o Hamas. Naturalmente, tanto Joe Biden como Donald Trump reclamam os louros do processo que aliviará, de forma momentânea, o sofrimento a que o Médio Oriente tem estado submetido desde os ataques de 7 de outubro. O plano será posto em prática em três fases, com a primeira a incluir, para além do cessar de hostilidades, a libertação dos reféns israelitas em troca de prisioneiros palestinianos, a retirada das Forças de Defesa Israelita de Gaza e ainda um fluxo de ajuda humanitária para o território. As fases seguintes permanecem incertas e dependentes do sucesso da primeira.
«Apresentei os contornos exatos deste plano a 31 de maio de 2024», escreveu Biden num comunicado lançado na noite de quarta-feira, «após o que foi aprovado por unanimidade no Conselho de Segurança da ONU. É o resultado não só da extrema pressão a que o Hamas tem estado sujeito e da alteração da equação regional após o cessar-fogo no Líbano e o enfraquecimento do Irão – mas também da obstinada e meticulosa diplomacia americana. A minha diplomacia nunca parou nos seus esforços para conseguir este objetivo». Uma natural reivindicação dos louros por parte da administração cessante, mas levanta-se inevitavelmente a questão do porquê de só ter sido aceite neste momento, a poucos dias da tomada de posse do novo executivo.
O enviado de Trump
Donald Trump, ao seu estilo, anunciou o acordo já como uma vitória sua. «Com este acordo em vigor, a minha equipa de Segurança Nacional, através dos esforços do Enviado Especial para o Médio Oriente, Steve Witkoff, continuará a trabalhar em estreita colaboração com Israel e com os nossos aliados para garantir que Gaza NUNCA mais se torne um porto seguro para os terroristas», lê-se numa publicação da sua rede social Truth Social. Trump já tinha ameaçado que, caso os reféns israelitas não fossem libertados até dia 20 de janeiro, haveria «um inferno para pagar». Assim, a hipótese de que o acordo para o cessar-fogo foi parcialmente atingido por influência de Donald Trump é forte. Steve Witkoff teve um peso importante nas negociações, e pode ter sido o desbloqueador do impasse entre Washington e Telavive. «O enviado de Trump ao Médio Oriente forçou Netanyahu a aceitar um plano para Gaza que tinha rejeitado repetidamente», noticiou o jornal israelita Haaretz .
O cessar-fogo deverá entrar em vigor no domingo, porém, a esperança em que está envolto parece ignorar outros exemplos recentes. Em novembro de 2023 houve também um acordo de cessar-fogo, que não durou mais de uma semana após o Hamas ter alegadamente lançado um rocket para território israelita, quebrando a trégua. Para além disto, ontem, o Gabinete de Guerra israelita adiou o voto por alegadas novas exigências do Hamas. E, com a continuação do grupo terrorista, que está paralisado, mas não totalmente neutralizado, parece haver pouca esperança para uma paz forte e duradoura no Médio Oriente.
Uma nova era
Ao contrário do que aconteceu em 2017, Donald Trump já conhece os cantos à Casa Branca. A familiarização com os nem sempre amigáveis corredores da política de Washington é importante, e o cenário é agora totalmente diferente. O ex-Presidente vai rodear-se de uma equipa que lhe deu mostras de lealdade, mesmo que vários membros, Vance incluído, tenham sido duros críticos de Trump quando este apareceu pela primeira vez na cena política.
Outro aspeto incontornável é Elon Musk. O magnata da tecnologia, dos mais próximos do próximo Presidente e uma figura central na elite de Mar-a-Lago, estará responsável, juntamente com Vivek Ramaswamy, pelo DOGE (Departamento de Eficiência Governamental), uma ramificação que se focará no corte das gorduras do aparato estatal. Musk tem sido um membro controverso, demonstrando apoio por várias fações nacional-populistas por todo o mundo, especialmente na Europa. «Quero alertar o país», disse o ainda Presidente Joe Biden no último discurso dirigido à nação na noite de quarta-feira, «para algumas coisas que muito me preocupam. Trata-se da perigosa concentração de poder nas mãos de um número muito reduzido de pessoas ultra-ricas e das consequências perigosas se o seu abuso de poder não for controlado. Atualmente, está a tomar forma de uma oligarquia».
Assim, o próximo mandato promete a todos os níveis, e resta esperar pelos resultados desta mudança de rumo da maior potência mundial, a principal guardiã do mundo (e da civilização) ocidental.