A acontecer será acompanhado de uma maioria no Senado, onde os Republicanos passarão de 49 para 51, e da manutenção da maioria republicana na Câmara dos Representantes. Mesmo que se verifique a habitual correcção anti-presidencial no Congresso nas eleições mid term de 2026, há o risco real de um bloco republicano duradouro na Presidência, Senado, Câmara dos Representantes e Supreme Court. A existir uma Administração Trump II, os fiéis colaboradores já estão escolhidos, as decisões pré-tomadas e algumas propostas legislativas estão já escritas, cortesia da lenta curva de aprendizagem durante a Administração Trump I e do labor dos diversos lobbies conservadores, cristalizado no Project 2025.
Na semana passada Trump deu, no Economic Club em Chicago, uma longa entrevista dedicada à economia, perante uma plateia de entusiastas que aplaudia o entrevistado e apupava o entrevistador, John Micklethwait, editor chefe da Bloomberg e, de 1987 a 2015, jornalista e editor chefe nesse arauto do esquerdismo que é The Economist.
Trump resumiu numa palavra o seu programa económico, antecedida do enquadramento: “a palavra mais bonita que consta do dicionário: tarifas” (alfandegárias). Para garantir o emprego dos americanos Trump propõe-se aumentar significativamente as tarifas alfandegárias nas importações, independentemente dos produtos ou da sua origem (o que inclui a China mas também a União Europeia). O aumento das tarifas implicará um aumento automático dos preços, uma espécie de elevado IVA federal que fará disparar a inflação e tornará ainda mais dura a vida dos americanos pobres (que já se queixam da inflação trazida pela pandemia e pela injecção de dinheiro na economia para combater a recessão). A opção proteccionista também não garante no imediato a criação de emprego nos EUA ou a melhoria dos salários dos americanos. A criação de capacidade produtiva nos EUA, para substituir as importações, implica tempo, dinheiro e vontade de investir. Lançadas as tarifas haverá represálias tarifárias por parte dos outros Estados e blocos económicos, o que afectará as exportações dos EUA. A recente descoberta, por parte de Trump, da produção nos EUA dos veículos eléctricos do seu apoiante Musk permite, ex abundantia, explicar porque é que o regresso ao proteccionismo não é uma boa opção para os americanos. Se Trump II cumprir as promessas eleitorais, reduzindo a imigração e a receita fiscal, haverá mais dois factores (menor força de trabalho e maior consumo) a fazer disparar a inflação.
A compreensão das vantagens do comércio livre sobre o proteccionismo implica um grau mínimo de literacia económica que o grosso dos apoiantes de Trump não tem. Ainda mais difícil será explicar que os EUA, na divisão internacional do trabalho, fornecem um serviço de segurança e defesa que é remunerado pela manutenção do valor, artificialmente elevado, do dólar, manutenção que é garantida pela compra de dívida pública dos EUA pelos exportadores (com a China e a UE à cabeça). Os Estados exportadores de bens e serviços financiam com os dólares gerados pelas exportações os crescentes défices orçamentais dos EUA. Como os EUA têm o monopólio da emissão de dólares, este suave arranjo serve os interesses de todos. Ameaçar este equilíbrio pode revelar-se dramático para os EUA. Basta que o apetite pela sua dívida baixe, o que fará disparar a respectiva taxa de juro. Ou que a aposta sino-russa em outras moedas de referência, que não o dólar, seja bem sucedida.