O Tratado do Alto Mar


O ano não termina sem uma nota de esperança na capacidade dos Estados para encontrarem, ao abrigo do Direito Internacional Público, soluções para a gestão de interesses que vão para lá dos egoísmos nacionais.


O Tratado do Alto Mar (TAM), concluído em 20 de Junho em Nova Iorque e aberto à assinatura desde 30 de Setembro, foi longamente negociado por uma Conferência Intergovernamental, ao abrigo da Convenção das Nações Unidas para o Direito do Mar (ou Convenção de Montego Bay, CMB), e que teve por missão redigir um instrumento vinculativo dedicado à conservação e ao uso sustentável da biodiversidade marinha em áreas para lá da jurisdição nacional.

Em 1982 a CMB já tinha introduzido elementos muito fortes de solidariedade, com a gestão comum, em prol da humanidade, dos fundos marinhos para além da jurisdição nacional. A qualificação dos fundos marinhos como património comum da humanidade teria sido uma das razões de peso que levou à não ratificação da CMB pelos EUA. Já a gestão e conservação de recursos vivos no Alto Mar ficou, na CMB, balizada por uma principologia suave, com um grau de cogência relativamente difuso, ao remeter para normas fora da CMB e de que se colhe exemplo na alínea a) do artigo 119º: “Tomar medidas, com base nos melhores dados científicos de que disponham os Estados interessados, para preservar ou restabelecer as populações das espécies capturadas a níveis que possam produzir o máximo rendimento constante, determinado a partir de factores ecológicos e económicos pertinentes, incluindo as necessidades especiais dos Estados em desenvolvimento e tendo em conta os métodos de pesca, a interdependência das populações e quaisquer normas mínimas internacionais geralmente recomendadas, sejam elas sub‑regionais, regionais ou mundiais.” A vinculatividade desta norma principológica fica na dependência da celebração de convenções que a concretizam e que estabeleçam regras precisas para a quantificação das capturas, com mecanismos de controlo e com sanções aplicáveis aos prevaricadores. E a efectividade das convenções especiais dependerá da vontade de os Estados relevantes (os que têm as maiores frotas pesqueiras) se vincularem.

O TAM é herdeiro desta abordagem, com a consagração de mecanismos institucionais que irão desenvolver normas substantivas e procedimentais que permitam dar-lhe efectividade. O Tratado prevê a partilha de informação científica relativa aos recursos marinhos mas também a partilha dos benefícios financeiros por via de dois Fundos um Voluntário e outro Especial, o primeiro a ser alimentado por contribuições voluntárias e o segundo a beneficiar de taxas baseadas na actividade no Alto Mar e de um quinhão dos lucros obtidos. A concreta regulação do mecanismos de partilha dos benefícios é remetida para os mecanismos institucionais criados pelo TAM.

Mais original é o mecanismo para a criação de áreas marinhas protegidas no Alto Mar, a ser decidida por consenso ou, na falta deste, por três quartos das Partes. Não obstante a generosidade desta solução, uma Parte pode objectar, com os fundamentos previstos no TAM, a ficar vinculada pela nova área protegida.

O TAM consagra a obrigação de realizar avaliações de impacte ambiental em relação a actividades exercidas para lá da jurisdição nacional, incluindo a necessidade avaliar os efeitos que são desconhecidos ou pouco conhecidos e a adopção de medidas preventivas, de mitigação e de gestão de potenciais efeitos negativos.

O Tratado entrará em vigor 120 dias depois da 60ª vinculação. Esta é a quadra certa para desejar que tal possa acontecer durante o ano de 2024.

O Tratado do Alto Mar


O ano não termina sem uma nota de esperança na capacidade dos Estados para encontrarem, ao abrigo do Direito Internacional Público, soluções para a gestão de interesses que vão para lá dos egoísmos nacionais.


O Tratado do Alto Mar (TAM), concluído em 20 de Junho em Nova Iorque e aberto à assinatura desde 30 de Setembro, foi longamente negociado por uma Conferência Intergovernamental, ao abrigo da Convenção das Nações Unidas para o Direito do Mar (ou Convenção de Montego Bay, CMB), e que teve por missão redigir um instrumento vinculativo dedicado à conservação e ao uso sustentável da biodiversidade marinha em áreas para lá da jurisdição nacional.

Em 1982 a CMB já tinha introduzido elementos muito fortes de solidariedade, com a gestão comum, em prol da humanidade, dos fundos marinhos para além da jurisdição nacional. A qualificação dos fundos marinhos como património comum da humanidade teria sido uma das razões de peso que levou à não ratificação da CMB pelos EUA. Já a gestão e conservação de recursos vivos no Alto Mar ficou, na CMB, balizada por uma principologia suave, com um grau de cogência relativamente difuso, ao remeter para normas fora da CMB e de que se colhe exemplo na alínea a) do artigo 119º: “Tomar medidas, com base nos melhores dados científicos de que disponham os Estados interessados, para preservar ou restabelecer as populações das espécies capturadas a níveis que possam produzir o máximo rendimento constante, determinado a partir de factores ecológicos e económicos pertinentes, incluindo as necessidades especiais dos Estados em desenvolvimento e tendo em conta os métodos de pesca, a interdependência das populações e quaisquer normas mínimas internacionais geralmente recomendadas, sejam elas sub‑regionais, regionais ou mundiais.” A vinculatividade desta norma principológica fica na dependência da celebração de convenções que a concretizam e que estabeleçam regras precisas para a quantificação das capturas, com mecanismos de controlo e com sanções aplicáveis aos prevaricadores. E a efectividade das convenções especiais dependerá da vontade de os Estados relevantes (os que têm as maiores frotas pesqueiras) se vincularem.

O TAM é herdeiro desta abordagem, com a consagração de mecanismos institucionais que irão desenvolver normas substantivas e procedimentais que permitam dar-lhe efectividade. O Tratado prevê a partilha de informação científica relativa aos recursos marinhos mas também a partilha dos benefícios financeiros por via de dois Fundos um Voluntário e outro Especial, o primeiro a ser alimentado por contribuições voluntárias e o segundo a beneficiar de taxas baseadas na actividade no Alto Mar e de um quinhão dos lucros obtidos. A concreta regulação do mecanismos de partilha dos benefícios é remetida para os mecanismos institucionais criados pelo TAM.

Mais original é o mecanismo para a criação de áreas marinhas protegidas no Alto Mar, a ser decidida por consenso ou, na falta deste, por três quartos das Partes. Não obstante a generosidade desta solução, uma Parte pode objectar, com os fundamentos previstos no TAM, a ficar vinculada pela nova área protegida.

O TAM consagra a obrigação de realizar avaliações de impacte ambiental em relação a actividades exercidas para lá da jurisdição nacional, incluindo a necessidade avaliar os efeitos que são desconhecidos ou pouco conhecidos e a adopção de medidas preventivas, de mitigação e de gestão de potenciais efeitos negativos.

O Tratado entrará em vigor 120 dias depois da 60ª vinculação. Esta é a quadra certa para desejar que tal possa acontecer durante o ano de 2024.