As doenças do movimento são um grupo de condições médicas que afetam o controlo normal dos movimentos do corpo. Essas condições podem envolver movimentos involuntários, excessivos ou diminuídos, rigidez muscular, tremores, entre outros sintomas relacionados ao movimento. Pela elevada relevância destas patologias, celebrou-se, pela primeira vez, no ano passado, o Dia Mundial das Doenças do Movimento e o mesmo repete-se esta quarta-feira.
Em Portugal, como em muitos outros países, várias doenças do movimento afetam a população. A condição mais comum associada a distúrbios de movimento é a doença de Parkinson. No entanto, outras condições, como distonia, tremores essenciais, ataxia e síndrome das pernas inquietas, também são diagnosticadas.
Os doentes com doenças do movimento em Portugal são geralmente tratados por neurologistas, que são especialistas em distúrbios neurológicos, incluindo aqueles relacionados com o controlo motor. Os tratamentos podem incluir medicamentos, terapias físicas, ocupacionais e, em alguns casos, procedimentos cirúrgicos.
Além do tratamento clínico, é comum que os doentes recebam apoio de organizações e grupos locais que se dedicam a apoiar pessoas com doenças do movimento e suas famílias. Essas organizações muitas vezes desempenham um papel crucial na consciencialização, no fornecimento de recursos e no estabelecimento de redes de apoio. Os hospitais e centros médicos em Portugal oferecem serviços especializados para o diagnóstico e tratamento dessas condições.
"São doenças que se caracterizam por uma lentificação do movimento, como seja a Doença de Parkinson, ou em alternativa pela produção de movimentos anormais, como seja, por exemplo, o tremor", começa por explicar Joaquim Ferreira, Diretor Clínico do CNS – Campus Neurológico e Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, evidenciando que "as doenças do movimento mais comuns são a síndroma das pernas inquietas, o tremor e a doença de Parkinson". "Existem muitas outras doenças do movimento, mas são menos frequentes", indica.
Segundo o portal do SNS, “depois da doença de Alzheimer, o Parkinson é a doença neurodegenerativa mais comum, afetando cerca de 20 mil portugueses”. "Essa estimativa está correta e resulta de um estudo de campo que realizámos em Portugal. Podemos, contudo, acrescentar que a doença de Parkinson é a doença neurodegenerativa em que é esperado um maior aumento do número de pessoas afetadas nos próximos anos", continua, acrescentando que "o sintoma mais frequentemente associado à doença de Parkinson e que leva as pessoas a procurar um médico é o tremor". "Contudo, a doença caracteriza-se por outros sintomas como, por exemplo, a lentificação de movimentos, o arrastar de uma perna, o menor balanceio de um braço, o tamanho da letra da escrita ficar mais pequena, um fácies mais inexpressivo, entre outros sintomas. Felizmente existem múltiplos medicamentos altamente eficazes para tratar a doença", observa o profissional de saúde.
"De igual forma, existem outros tratamentos mais invasivos como por exemplo técnicas cirúrgicas cerebrais e medicamentos administrados através de infusões contínuas que também são benéficos para formas mais avançadas da doença", diz. "Contudo, o que consideramos dever ser o tratamento mais adequado para a doença inclui os tratamentos farmacológicos e cirúrgicos mais eficazes, a par da atividade física e de uma abordagem multidisciplinar com a inclusão de profissionais de saúde como por exemplo fisioterapeutas, terapeutas da fala, psicólogos, nutricionistas, enfermeiros e outros profissionais de saúde", afirma Joaquim Ferreira.
"Infelizmente não temos ainda nenhum tratamento que impeça ou atrase o aparecimento da doença. O que hoje em dia parece ser a melhor forma de prevenir ou atrasar o aparecimentos de sinais de Parkinsonismo é fazer atividade física regular e controlar os fatores de risco vasculares (ex.: hipertensão, diabetes, obesidade)", declara acerca da Parkinson.
"Embora não haja estudos especificamente realizados em Portugal, antecipamos que a doença do movimento menos prevalente em Portugal seja a síndroma das pernas inquietas. Esta síndroma manifesta-se por uma sensação desconfortável nas pernas associado a uma vontade irresistível de as mover", diz. "Esse desconforto costuma ocorrer quando as pessoas se deitam ou quando se sentam em locais com pouco espaço para mexer as pernas. Mexer as pernas alivia esses sintomas. Nos casos em que estes sintomas sejam muito incomodativos e interfiram na qualidade de vida dos doentes, podem ser prescritos medicamentos para ajudar a melhorar os sintomas".
“No dia 29 de novembro, data de nascimento de Jean-Martin Charcot, célebre neurologista francês, assinala-se o Dia Mundial das Doenças do Movimento”, escreveu num artigo publicado em dois órgãos de informação. Que importância assume Charcot no panorama das doenças do movimento? "Jean-Martin Charcot, célebre neurologista francês do século XIX, desempenhou um papel fundamental na compreensão de muitas doenças neurológicas incluindo a Doença de Parkinson. Foi ele que atribuiu o nome de Parkinson a esta doença", descortina.
“Infelizmente, muitas das doenças do movimento são, não apenas, ainda desconhecidas para a população em geral, mas também subdiagnosticadas pelos médicos e outros profissionais de saúde”, redigiu também. Como é que este panorama pode ser alterado? "O subdiagnóstico das doenças do movimento tem implicações diferentes se se tratar de doenças frequentes ou raras e se existirem tratamentos eficazes que possam ser disponibilizados. A título de exemplo, podemos mencionar a síndroma das pernas inquietas que apesar de ser muito frequente na população geral, os médicos estão pouco alertados para o seu diagnóstico. Sabemos assim que os doentes percorrem um longo percurso até terem um diagnóstico correto, sendo ao longo desse trajeto diagnosticados como tendo varizes, hérnias discais ou fibromialgia. Entre as doenças mais raras, mas para as quais temos tratamentos eficazes disponíveis (ex.: toxina botulínica) podemos mencionar as distonias (ex.: blefaroespasmo – encerramento dos olhos e distonia cervical – 'torcicolo')", menciona.
“Apesar da crescente evidência científica recomendar uma abordagem multidisciplinar para tratar estas doenças, apenas uma minoria dos doentes consegue aceder a esta prestação de cuidados. Desta forma, o acesso limitado a cuidados multidisciplinares é uma das maiores limitações na abordagem terapêutica das doenças do movimento”, acrescentou igualmente. Como é que os decisores políticos podem entender que esta abordagem multidisciplinar é essencial? "É muito importante que os decisores políticos entendam que a prevalência de algumas destas doenças vai aumentar significativamente nos próximos anos e que é necessário começarmos a planear a adaptação do modelo de cuidados por forma a lidarmos com este aumento do peso sobre o serviço nacional de saúde. Em paralelo, é importante que a melhor evidência científica que já está disponível para a abordagem terapêutica destas patologias seja verdadeiramente incorporada no modelo de cuidados a ser disponibilizado, desde já, a estes doentes".
"No Dia das Doenças do Movimento, todos devemos, em conjunto, contribuir para que os doentes tenham acesso aos melhores cuidados e para que novos tratamentos sejam desenvolvidos e possam melhorar a funcionalidade e qualidade de vida de todos os doentes”, indicou. O que falha mais em Portugal naquilo que diz respeito a estas doenças? "O que mais falha em Portugal neste momento é garantir que todos os doentes com doenças do movimento, independentemente da região onde vivem e condições económicas, possam aceder de forma fácil e atempada aos melhores cuidados que o país já disponibiliza. De igual forma, é necessário também garantir que esses mesmos serviços de Neurologia e que essas consultas do movimento disponibilizem equipas multidisciplinares com treino nestas doenças", observa Joaquim Ferreira.
"Ajudar as pessoas que têm doenças do movimento vai muito para além de disponibilizar tratamentos farmacológicos ou outros tratamentos inovadores. Passa também por falarmos sobre estas doenças, facilitarmos o seu reconhecimento e diagnóstico, treinarmos os profissionais de saúde para uma abordagem terapêutica mais eficaz e também educar os doentes, familiares e cuidadores sobre estas doenças. Só com a ajuda de todos podemos tratar melhor os doentes com as 'armas' que já temos disponíveis e em paralelo desenvolver os tratamentos, ainda em falta, para muitas das doenças para as quais ainda não temos os tratamentos que gostaríamos de disponibilizar", conclui.