“Pedi sempre a Deus que me fizesse ver o tempo em que devia sair e que não ficasse nem mais um segundo para além desse tempo.” Foi assim que Paulo Portas justificou, há dez anos, a sua demissão da liderança do CDS, após a derrota nas eleições legislativas.
A situação é semelhante à que o CDS vive nos tempos actuais. Os centristas tinham acabado de sair de um governo impopular, liderado por Santana Lopes, e pagaram o preço nas eleições. Na hora da despedida, Portas deu quatro razões para deixar a liderança: não conseguiu contribuir para uma maioria de centro–direita, não conseguiu 10% dos votos (ficou-se pelos 7,3%), falhou a pretensão de ser a terceira força política e não evitou a maioria absoluta do PS.
Em 2004, como em 2014, Portas teve de decidir se iria a eleições coligado com o parceiro no governo ou sozinho. Optou pela segunda hipótese e explicou que o PSD e o CDS são partidos “diferentes, com valores próprios e programas distintos”. Apesar de Santana e Portas terem tentado, durante alguns dias, negociar um acordo, os centristas não alinharam. “Assim não há constrangimentos para ninguém. Significa que os portugueses podem escolher. Cada partido tem uma mais-valia”, garantiu o presidente do CDS.
Ao longo dos 14 anos que esteve à frente do CDS – é o líder mais resistente dos partidos com assento parlamentar -, Portas foi sempre sozinho a eleições. Em 2011, o CDS ainda desafiou o PSD para “um movimento político novo”, mas já sabia a resposta: os sociais-democratas não estavam interessados. Passos Coelho nunca abriu a porta a outra solução que não fosse concorrer em “listas próprias”. Aliás, a única coligação pré-eleitoral à direita foi a Aliança Democrática (AD), que juntou o PSD, o CDS e o PPM há mais de 30 anos.
Isto não impediu o partido que nasceu “rigorosamente ao centro”, nas palavras de Freitas do Amaral (ver texto ao lado), de participar em sete governos durante estes 40 anos. Ao todo, foram mais de dez anos no poder partilhados com o PS – a primeira aliança dos centristas foi com os socialistas -, mas principalmente com o PSD.
Paulo Portas esteve em três desses governos e já leva seis anos como ministro: começou na Defesa, com Durão Barroso e Santana Lopes, passou para os Negócios Estrangeiros com Passos Coelho e chegou a vice-primeiro-ministro, depois de se ter demitido com a garantia de que a sua decisão era irrevogável. As contradições não são uma novidade em Portas. Na década de 90, quando era director do jornal “O Independente”, garantia no programa “Parabéns”, de Herman José: “Não quero ser político, não quero ser eleito para coisa nenhuma.”
A dúvida é até quando resistirá. A especulação à volta da sua possível saída antes das legislativas já obrigou o líder centrista a esclarecer que “em Outubro de 2015 quem vai decidir sobre os políticos que ficam e os que saem é o povo, pela simples razão de que há eleições e o povo julgará”. Antes disso, Portas vai ter de decidir se está disponível para uma aliança. Ao pedido do porta-voz do PSD de que “rapidamente se pudesse olhar para uma coligação para o futuro”, Portas respondeu que “é tão imperativa a necessidade da coligação entre PSD e CDS como é compreensível e necessária a defesa da nossa identidade numa coligação que não é, nem ninguém queria que fosse uma fusão”. Mesmo no CDS, muitos acreditam que Portas se prepara para sair a seguir às legislativas. Assunção Cristas, Pires de Lima ou Nuno Melo são alguns dos nomes que podem liderar o novo ciclo.
O partido que nasceu ao centro e era para se chamar CDP
Freitas do Amaral anunciou a criação do CDS como “uma síntese harmoniosa entre o centro-direita e o centro--esquerda”. Faz hoje 40 anos que o Centro Democrático Social foi apresentado ao país como “um partido centrista”. “A nossa posição é rigorosamente ao centro”, disse Freitas do Amaral, que queria explorar o espaço deixado vago pelo PPD que nesses tempos se identificava com o centro-esquerda. Na apresentação do partido, três dúvidas assaltavam os jornalistas: era o CDS o partido da Igreja? Era o partido da alta finança? Era o partido do antigo regime? Freitas do Amaral teve a mesma resposta para todas as perguntas: “Não.” OCDS era de “inspiração cristã”, mas não pretendia “representar a Igreja”. Era “um partido aberto a todas classes sociais” e, por último, era a favor da democracia. Curiosamente, o primeiro nome do novo partido era Centro Democracia e Progresso (CDP). Foi esse o nome mais votado pelos fundadores entre os dez que estavam em cima da mesa. Mas um dia antes da apresentação do CDS nasceu o Partido do Progresso. Para evitar confusões, Freitas e Adelino Amaro da Costa decidiram optar pelo segundo nome mais votado – CDS.