O sentido e impressionante artigo que Pedro Bacelar de Vasconcelos escreveu no Público do passado dia 4 de abril vem colocar, de forma simples e crua, o dedo na ferida desta guerra inútil e horrível.
Quaisquer que possam ser os entendimentos que se tenham para as causas da guerra atual entre a Rússia e a Ucrânia e, bem assim, de outras guerras que, nos anos mais recentes, vêm matando pessoas e destruindo os seus haveres em várias partes do mundo, a verdade é que nada justifica hoje esse modo de resolver conflitos reais ou inventados e sem real significado para quem, verdadeiramente, os sofre.
As imagens desta horrível guerra, por mais exploradas que possam ser – e são – do ponto de vista da propaganda, deveriam impedir-nos, até por isso, de continuar a elas assistir impassíveis, como se nada se passasse nessa parte da Europa e em outras partes do mundo.
Os horrores da guerra, desta e das outras, que os difusores de reportagens visionadas não escolhem, por ora, transmitir, não são – nunca poderão ser – justificados.
Impressionam, contudo, mais quando verificamos que os interesses que, alegadamente, a explicam apenas subsistem como atuais por, em tempo, não se terem verdadeiramente procurado sarar a feridas da «guerra fria» que os legitimavam.
Convém, todavia, lembrar, a esse propósito, como a dita «guerra fria» terminou, afinal, por iniciativa de uma das partes.
Tal circunstância feliz deveria ter permitido encontrar, mais facilmente, os caminhos para uma paz justa e duradoura entre os países que a protagonizaram ou dela foram herdeiros, em qualquer dos campos.
Infelizmente, não aconteceu assim.
Permaneceram, contra toda a lógica, os rancores dos que dela se consideraram vencedores e dos que, em consequência, acabaram por a assumir como vencidos.
Um primeiro pronúncio desse desastrado estado de espírito foi o que, depois, se passou na Jugoslávia, sinal para cujos propósitos deveríamos ter olhado todos com a atenção que a gravidade dos factos impunha já então.
Mas não, apesar do que de horroroso ali se passou também e, igualmente, sem uma justificação plausível, uma vez mais prevaleceu e se perpetuou em alguns a mentalidade belicista e a vontade retroativa de acertar contas.
Apesar de tudo, quando as contradições eram reais – ou talvez por isso – a responsabilidade política dos antagonistas de então evitou a guerra.
Guerras fundadas, porém, nos avatares de contradições ideológicas passadas e já inexistentes no plano dos contendores, e em ressentimentos, por isso mesmo, ainda mais absurdos, tornam-se totalmente incongruentes e injustificadas.
Como bem refere Pedro Bacelar de Vasconcelos, é tempo, agora, de se construir e erguer uma plataforma de paz na Europa (também noutros sítios), que se baseie numa realidade nova que nada tenha a ver com a «guerra fria» e as contradições ideológicas que então a geraram.
Para que isso seja possível é, no entanto, necessário conseguir expor e ultrapassar um intricado conjunto de interesses institucionais, corporativos e materiais que, herdeiros desses tempos, continuam, contudo, a existir perenes, mais não seja para justificar proveitos puramente egoístas de uns tantos.
E, no entanto, é imperioso que essa nova plataforma de paz aconteça depressa para que o horror e o absurdo desta guerra – e de muitas outras – não continuem a destruir as vidas (únicas) de tantas pessoas e de tantos jovens, que mal começavam a olhar o futuro com esperança e alegria.
Sim, tem de ser esse o caminho que temos de começar já a percorrer: um caminho que nos leve a uma paz segura, porque assente em valores que comumente aceitamos e queremos ver realizados, mesmo que com sonhos, metas e velocidades diferentes.
Levantarmo-nos e exigirmos o desbravar desse novo caminho de uma paz segura e justa parece, com efeito, mais frutuoso do que erguermos de novo as bandeiras rasgadas e entoarmos os hinos selvagens e obsoletos das guerras passadas.
Se assim não agirmos, outros, ainda mais perigosos e irresponsáveis, apanharão do chão e das mãos dos mortos atuais, aqueles símbolos belicistas e com eles arrastarão muitos outros jovens generosos mas incautos para um outro e mais terrível holocausto.
«Paz agora», deve, pois, ser a única exigência e a militância destemida que devemos abraçar!