A dupla batalha contra a covid-19


É cada vez mais difícil racionalizar a abordagem à pandemia, não para a relativizar, mas para a poder abordar com sentimentos fortes de compromisso…


Na passada semana tive a oportunidade de intervir no debate realizado na sessão plenária do Parlamento Europeu sobre a estratégia de vacinação da UE e como ela se pode projetar de forma mais efetiva no objetivo de vacinar o mundo. 
Traduzi na minha breve intervenção o que desde o início tenho defendido também enquanto Presidente da Delegação do Parlamento Europeu para África, Caraíbas e Pacífico, ou seja, que para além da importância sanitária absoluta da vacinação global, bem demonstrado com o surgimento de novas variantes em zonas pouco cobertas, e do dever ético e moral de a tornar possível, ela é também uma oportunidade para capacitar científica e tecnologicamente zonas do globo cuja vulnerabilidade é inaceitável e insustentável, qualquer que seja o ponto de vista pelo qual a queiramos analisar.

Com naturalidade publiquei o vídeo da intervenção nas redes sociais e escrevi alguns textos alusivos. Esperava obviamente reações. A maior frustração para quem comunica pensamento e opinião é a indiferença àquilo que pensa e opina. Mas as reações que recebi tornaram ainda mais nítido que estamos perante uma dupla batalha. Libertar os corpos da covid-19, mas obviar também a que ele se aninhe nas mentes e distorça a lucidez de análise da sociedade complexa e das suas dinâmicas.

Não me refiro aqui aos efeitos colaterais que a infeção pode ter ao nível psíquico e sensorial, largamente descritos por especialistas e referenciados em estudos de impacto, nem às inúmeras teorias da conspiração que pululam pelo mundo ou aos aproveitamentos populistas da pandemia para reforçar poderes e práticas autoritárias, mas à formação de uma espécie de filtro de análise ou névoa que distorce a forma como cada vez mais pessoas olham para o mundo que as rodeia, atribui significados ao que vê e age em função disso.

É cada vez mais difícil racionalizar a abordagem à pandemia, não para a relativizar, mas para a poder abordar com sentimentos fortes de compromisso, porque tudo o que com ela se relaciona é tratado e comunicado em realidade aumentada, como se na sua dimensão estrita não fosse já suficientemente brutal e arrasadora. 

A sucessiva abertura dos noticiários, as capas de jornais e revistas, a contagem mórbida dos mortos, dos internados ou dos infetados sem paralelo com qualquer doença ou causa de morbilidade, a espiral que se apega ás conversas do dia a dia, do café ou do supermercado, com ou sem máscara, certificado ou PCR, uma vida suspensa de um vírus insidioso que parece ter acendido uma luz tão forte que encandeia cada vez mais gente e a impede de ver a floresta que está muito para além da árvore.

Tenho consciência que esta crónica sobre a covid-19 num momento em que tantos movimentos tectónicos abalam a geopolítica global e a política europeia e nacional estão prenhes de temas escaldantes, pode denunciar contaminação pelo paradigma distorcido em relação ao qual aqui me insurjo. Talvez seja, mas se o for é pelo menos consciente. E tem um objetivo confessado de alerta. Não podemos deixar-nos aprisionar e olhar o mundo através da covid-19. Temos de agir nele para aniquilar a pandemia, respeitando as normas de distanciamento mental necessário para assegurar a lucidez na análise e na ação. 

Eurodeputado do PS

A dupla batalha contra a covid-19


É cada vez mais difícil racionalizar a abordagem à pandemia, não para a relativizar, mas para a poder abordar com sentimentos fortes de compromisso...


Na passada semana tive a oportunidade de intervir no debate realizado na sessão plenária do Parlamento Europeu sobre a estratégia de vacinação da UE e como ela se pode projetar de forma mais efetiva no objetivo de vacinar o mundo. 
Traduzi na minha breve intervenção o que desde o início tenho defendido também enquanto Presidente da Delegação do Parlamento Europeu para África, Caraíbas e Pacífico, ou seja, que para além da importância sanitária absoluta da vacinação global, bem demonstrado com o surgimento de novas variantes em zonas pouco cobertas, e do dever ético e moral de a tornar possível, ela é também uma oportunidade para capacitar científica e tecnologicamente zonas do globo cuja vulnerabilidade é inaceitável e insustentável, qualquer que seja o ponto de vista pelo qual a queiramos analisar.

Com naturalidade publiquei o vídeo da intervenção nas redes sociais e escrevi alguns textos alusivos. Esperava obviamente reações. A maior frustração para quem comunica pensamento e opinião é a indiferença àquilo que pensa e opina. Mas as reações que recebi tornaram ainda mais nítido que estamos perante uma dupla batalha. Libertar os corpos da covid-19, mas obviar também a que ele se aninhe nas mentes e distorça a lucidez de análise da sociedade complexa e das suas dinâmicas.

Não me refiro aqui aos efeitos colaterais que a infeção pode ter ao nível psíquico e sensorial, largamente descritos por especialistas e referenciados em estudos de impacto, nem às inúmeras teorias da conspiração que pululam pelo mundo ou aos aproveitamentos populistas da pandemia para reforçar poderes e práticas autoritárias, mas à formação de uma espécie de filtro de análise ou névoa que distorce a forma como cada vez mais pessoas olham para o mundo que as rodeia, atribui significados ao que vê e age em função disso.

É cada vez mais difícil racionalizar a abordagem à pandemia, não para a relativizar, mas para a poder abordar com sentimentos fortes de compromisso, porque tudo o que com ela se relaciona é tratado e comunicado em realidade aumentada, como se na sua dimensão estrita não fosse já suficientemente brutal e arrasadora. 

A sucessiva abertura dos noticiários, as capas de jornais e revistas, a contagem mórbida dos mortos, dos internados ou dos infetados sem paralelo com qualquer doença ou causa de morbilidade, a espiral que se apega ás conversas do dia a dia, do café ou do supermercado, com ou sem máscara, certificado ou PCR, uma vida suspensa de um vírus insidioso que parece ter acendido uma luz tão forte que encandeia cada vez mais gente e a impede de ver a floresta que está muito para além da árvore.

Tenho consciência que esta crónica sobre a covid-19 num momento em que tantos movimentos tectónicos abalam a geopolítica global e a política europeia e nacional estão prenhes de temas escaldantes, pode denunciar contaminação pelo paradigma distorcido em relação ao qual aqui me insurjo. Talvez seja, mas se o for é pelo menos consciente. E tem um objetivo confessado de alerta. Não podemos deixar-nos aprisionar e olhar o mundo através da covid-19. Temos de agir nele para aniquilar a pandemia, respeitando as normas de distanciamento mental necessário para assegurar a lucidez na análise e na ação. 

Eurodeputado do PS