Vivida que foi, com civismo e normalidade, mais uma festa da democracia, com a eleição de milhares de autarcas para os 308 Concelhos do País, vale a pena refletir sobre a ideia que se instalou na opinião publicada e na opinião pública, de que o debate sobre temas nacionais fez soçobrar a existência de debate sobre as questões de proximidade e sobre as candidaturas e programas em confronto no plano local. Os resultados verificados não confirmam essa ideia.
A perceção da prevalência dos temas nacionais em eleições locais é profundamente enviesada pelos critérios de comunicação, baseados na gestão de audiências, praticados pelos principais media de âmbito nacional. Esses órgãos seguem a campanha dos líderes partidários pelo País, deixando em segundo plano o debate que terra a terra, freguesia a freguesia, rua a rua e quando possível porta a porta, foi acontecendo por todo o território nacional. Um debate ao qual apenas a comunicação social regional e local deu voz, onde ainda resiste.
No quadro da disponibilidade limitada que decorre do facto de exercer um mandato no Parlamento Europeu, não deixei de participar na campanha autárquica em múltiplos Concelhos e de perceber como a maioria dos eleitores sabiam o que significava a escolha para o seu dia a dia e como nisso se preparavam para basear o seu voto. Também me cruzei com muitas pessoas que o contexto da vida afastou dos locais onde estão recenseados e já se tinham rendido à abstenção. É preciso facilitar o exercício do direito de voto sem pôr em causa a sua segurança e fiabilidade.
Não enfileiro, pelos motivos antes explicitados, nas hostes dos que definiram a campanha sobretudo pelos temas nacionais que nelas se discutiram, designadamente pela discussão sobre a forma de usar os recursos para a recuperação e a modernização do País no âmbito no próximo ciclo autárquico. Era difícil que com o modelo de acompanhamento mediático antes referido, o tema da recuperação do País não tivesse acabado por chegar à campanha, até porque é inegável que a sua concretização com sucesso depende de uma coligação de cidadania que inclui a administração pública, mas também o tecido económico e empresarial, o sector social, a sociedade civil, os parceiros sociais e as autarquias em todas os seus patamares.
Menos normal foi a atitude dos Partidos que não estando no Governo, têm legítimas aspirações de governação e que enjeitaram o momento para também eles, Concelho a Concelho, região a região, sector a sector, explicarem quais as suas opções alternativas, quando for esse o caso, para o modelo e as prioridades de aplicação dos recursos que vão estar disponíveis.
Embora a linguagem bélica não me agrade, tenho que reconhecer que triunfou como metáfora potente de comunicação. “Bazuca” é aliás uma célebre candidata a palavra do ano, designando uma ferramenta decisiva para o nosso futuro coletivo. Pena foi a pólvora seca disparada pelos Partidos que se dizem alternativa, no debate sobre a sua aplicação em concreto nos territórios locais, menorizando-se como parte ativa na definição de um programa de ação que diz respeito a todos.
Eurodeputado do PS