Periquitos-de-colar. A luta das aves por um lugar ao sol na capital

Periquitos-de-colar. A luta das aves por um lugar ao sol na capital


Os periquitos-de-colar ter-se-ão começado a reproduzir em Portugal nos anos 70 depois de uma fuga de cativeiro. Desde então, ninguém os parou. Chegaram a Lisboa nos anos 70 e, desde então, já se espalharam pelo país. Provenientes da Ásia e da África, as aves são facilmente identificáveis. O tempo geralmente ameno e a grande disponibilidade…


Voam pela cidade de Lisboa indiscriminadamente como se da sua casa se tratasse. O seu canto ouve-se à distância e as suas cores não os permitem passar despercebidos. Os periquitos-de-colar, periquitos-rabijunco ou periquitos-de-colar-rosa vêm há já vários anos a invadir a capital mas parece cada vez que a sua estadia não será apenas de passagem.

Encontram-se um pouco por todo o país, mas a capital parece ser o seu local de eleição. Desde o Jardim da Estrela, ao jardim da Fundação Calouste Gulbenkian, à Tapada das Necessidades e ao jardim do Ultramar, desde que existam zonas verdes, estes periquitos dão-se por satisfeitos.

De acordo com a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), a “espécie em liberdade é conhecida desde os anos 70, através de um indivíduo observado no estuário do Tejo, possivelmente oriundo de fuga de cativeiro”.

Não há, para já, muitos dados científicos relativamente à vida da espécie em Portugal mas, aquilo que se sabe é que são muitos aqueles que aproveitam o seu tempo livre para desfrutar do contacto com os pequenos pássaros, que trazem um pouco mais de natureza à capital.

Mas não é só em Lisboa que podemos observar a espécie. No resto do território, “a espécie está essencialmente presente no Grande Porto, Amadora e Cascais, Coimbra, Caldas da Rainha e Setúbal”, explica ao i Rui Machado, Técnico de Conservação na SPEA.

Os periquitos-de-colar são uma espécie bastante fácil de identificar: Têm uma cauda comprida, uma cabeça pronunciada, cor verde e bico vermelho em forma de ganho, usado para se alimentar de sementes e frutos. Os machos apresentam uma risca preta a circundar a área do pescoço, dando assim nome à espécie. Normalmente voam em bandos com algumas dezenas de membros e emitem vocalizações estridentes.

O que pouca gente sabe é que estes pássaros são da família dos papagaios e a sua origem é africana e asiática. Podem viver cerca de sete anos, embora se desconheça a idade média de sobrevivência em estado selvagem.

Num estudo feito em Portugal entre 2022 e 2003 acerca destas aves, descobriu-se que existiam cerca de 208 no dormitório do Jardim da Estrela, “que em conjunto com outros dormitórios menores no Algarve, Torres Novas e Mira, permitiu estimar a população nacional da espécie em mais de 270 aves”.

No entanto, a população desta espécie tem vindo a crescer ao longo dos anos e os cidadãos têm sido uma ajuda para monitorizar esse mesmo crescimento. A SPEA explica ao i que, no outono do ano passado “dinamizou uma iniciativa de ciência-cidadã” em que desafiou as pessoas a ajudar “a identificar os dormitórios da espécie em áreas urbanas de todo o país”. Nesta iniciativa, foram contabilizados “um total de 20 dormitórios e uma população estimada de 996 a 1269 indivíduos”. Essa iniciativa apontou também para a existência de “um máximo de 878 indivíduos” na cidade de Lisboa.

“No resto do país, a espécie está essencialmente presente no Grande Porto, Amadora e Cascais, Coimbra, Caldas da Rainha e Setúbal”, adianta a SPEA.

1Não são apenas os turistas que são atraídos pela luz acolhedora da capital portuguesa. Também os periquitos-de-colar têm ótimos motivos para optar por Lisboa para viver, tanto que o vêm a fazer há mais de 50 anos.

Para a SPEA, “o tempo geralmente ameno e a grande disponibilidade de árvores com cavidades naturais, que esta espécie usa para nidificar, são fatores que poderão explicar a presença da espécie não só na cidade de Lisboa, como em áreas urbanas da Área Metropolitana de Lisboa, e noutras áreas urbanas do país”.

Além disso, por serem uma espécie que se encontra em liberdade devido a a fugas de cativeiro e consequente reprodução, a associação acredita que é “provável que os periquitos-de-colar se tenham estabelecido primeiro e em maior número em Lisboa simplesmente por ser aqui que mais eram vendidos”.

Para perceber se estas espécies são uma praga, ou seja, se estão a “competir por recursos alimentares ou cavidades para nidificação” com outras, são necessários mais estudos. A SPEA está neste momento a “preparar novas ações de monitorização da espécie” para avaliar o “potencial impacto” dos periquitos-de-colar par outros animais. A associação explica, no entanto, que “pode dar-se o caso de estar a aumentar mas não ameaçar outras espécies”.

Mesmo não sendo, para já, considerada uma praga, o periquito-de-colar é uma espécie invasora em Portugal, de acordo com o Decreto-Lei n.º 565/99 de 21 de Dezembro, que regula a introdução na natureza de espécies não indígenas da flora e da fauna.

Em Espanha, onde também estão presentes, estes pássaros já estão a afetar o dia-a-dia de outros animais.

“Num estudo que foi feito aqui no país vizinho, onde a população de periquitos-de-colar anda à volta dos 3 mil, soube-se que [os periquitos-de-colar] têm tido impacto negativo sobre o mocho-d’orelhas. O mocho-d’orelhas é uma espécie migradora e quando retorna para nidificar na Península Ibérica, em algumas áreas onde também existem periquitos-de-colar, os buracos já foram ocupados, fazendo com que tenham de procurar áreas não tão boas”, explicou ao Público, em 2020, Hany Alonso, técnico de gestão de dados e cartografia na SPEA.