Ebrahim Raisi, clérigo ultraconservador, é, desde há muito, apontado como o potencial sucessor do Líder Supremo do Irão, Ali Khamenei. Foi, pois, sem surpresa que o responsável máximo pelo sistema judicial da República Islâmica do Irão venceu as eleições presidenciais do passado dia 18 de Junho. Por ocasião da sua primeira declaração pública, após o acto eleitoral, Raisi aproveitaria para instar a nova Administração norte-americana a voltar ao acordo nuclear, de 2015 [Plano de Ação Conjunto Global, JCPOA], abandonado unilateralmente pelo anterior inquilino da Casa Branca, Donald Trump, a 8 de Maio de 2018, com retorno à imposição de sanções ao Irão. Contudo, para Raisi a tarefa não parece nada fácil, já que são inúmeras as potências mundiais que desconfiam da boa vontade da liderança iraniana, continuando a acreditar na sua determinação em contruir uma bomba nuclear. Certo é que com a manutenção das sanções internacionais que têm impedido o comércio, as exportações de hidrocarbonetos e o acesso aos mercados financeiros, a economia do país caminha a passos largos para uma situação particularmente preocupante, com sinais de grande inquietação no seio da população. Esta situação tem sido agravada pela pandemia [COVID-19], que colocou o país no topo de uma indesejável tabela, com 3,7 milhões de casos e mais de 89 mil óbitos.
Apesar de reinar algum optimismo junto de alguns sectores da sociedade iraniana de que o JCPOA possa ser retomado, há que considerar, igualmente, a necessidade de alargamento das negociações às questões de âmbito regional que preocupam seriamente alguns dos Estados vizinhos. Por outro lado, por parte de muitos especialistas e de membros do Congresso norte-americano existe o entendimento que um eventual abrandamento das sanções poderá resultar numa oportunidade para o Irão retirar alguma vantagem no capítulo financeiro e, através dela, incrementar o seu poder bélico, o que configuraria uma ameaça para alguns dos seus vizinhos, manifestamente opositores da liderança iraniana. Nestes domínios, não é de mais lembrar o permanente cepticismo de Khamenei no que às intenções do Ocidente diz respeito; sentimento que é seguido de perto por Raisi que, de resto, já deixou patente não ver nas relações com o Ocidente uma prioridade do seu consulado presidencial, preferindo lançar os seus olhares mais para Oriente, em direcção à China.
Numa altura em que Raisi ignora os pedidos norte-americanos para que em futuras conversações seja incluído o tema dos misseis balísticos e o apoio iraniano a organizações terroristas, em que o mesmo chega a afirmar ser esta uma questão “inegociável”, parece ficar claro que o novo presidente enfrentará sérios desafios tanto de natureza interna como nas relações externas, na convicção de que a economia iraniana só poderá melhorar com a implementação de medidas que promovam, de facto, mudanças políticas fundamentais.
Lisboa, 30 de Julho de 2021
João Henriques
Investigador Integrado do Observatório de Relações Exteriores (OBSERVARE)/Universidade Autónoma de Lisboa
Vice-Presidente do Observatório do Mundo Islâmico
Auditor de Defesa Nacional pelo Institut des Hautes Études de Défense Nationale (IHEDN), de Paris