Posto isto, há coisas que tardam em entender que – também cá – têm forçosamente de mudar. Principalmente o que é principal e evidente.
Portugal é um dos países mundiais que mais depende do Turismo.
Não é de agora, até podemos arriscar a dizer que é de sempre. Mas, para os mais descrentes nesta análise em modo de conclusão, reportando-nos a números pré-COVID, Portugal em 2018 tinha “só” no setor do Turismo uns impressionantes 10% (aproximadamente) da contribuição total do PIB.
O Turismo é mesmo o fator chave da economia nacional.
Portugal vive (ou vivia?) do Turismo e a estratégia nacional, estratégia política inclusive, a nível de Governo central, mas também ao nível dos órgãos autárquicos locais (em que apostou Lisboa e Porto? No que se transformaram nos últimos anos? Qual o setor que deram preferência? Pois é, é o Turismo), era feita para continuar a ser assim durante muitos mais anos.
Não é que seja errado apostar nesse setor em função do que temos e somos. Portugal tem condições atmosféricas incríveis, tem uma ótima gastronomia, culturalmente é um país rico e “oferece” ainda uma diversidade regional que possibilita visitar “vários países” dentro de um só país. Somos realmente afortunados pelo país que temos.
Porém, quando tudo está em (ainda mais) constante mudança, temos de alterar também alguma coisa do que em tempos foi normal ser por si só. O Turismo também irá mudar. Não são só as máscaras cirúrgicas que vieram seguramente para ficar, porque vírus não há só o SARS-CoV-2 e a doença COVID-19 apenas alertou que não havia uma salvaguarda, por exemplo, de barreira hospitalar perante possíveis infetados com vírus, ou o Home Office que se aliou, talvez para sempre, ao Works everywhere com o qual viveremos quando o coronavírus nos der tréguas ou, pelo menos se cá ficar, seja mais controlável de forma epidemiológica.
O Turismo. A grande fonte da economia portuguesa.
Sabemos que o setor do Turismo é muito mais que meramente olharmos para a hotelaria, mas, se olharmos especificamente para este ramo deste setor de atividade, podemos ver que continuámos, mesmo em período de pandemia, a fazer a incursão que Portugal vinha a apostar em massa: Em 2020 inaugurámos 89 hotéis no nosso país, em pleno ano de confinamento e ausência de passeios. Para comparação, pré-covid, em 2019 tinham sido inaugurados 57 novos hotéis em Portugal. É evidente concluirmos que mesmo com a doença COVID-19 a paralisar a atividade turística mundial, Portugal continuou a investir neste setor.
Mas e agora? Fica tudo na mesma? Os hotéis devem ficar à espera do “adeus” do vírus para ser tudo como era até 2019? Se olharmos à nossa volta, aos países vizinhos, mas também para outros continentes, concluiremos rapidamente que não basta.
Pelo mundo fora, os antigos “só” hotéis estão a transformar-se em moradias de longa duração ou em escritórios. É sabido que a crise pandémica afetou de sobremaneira o setor turístico, em especial também o ramo da hotelaria, e com o crescimento do home office os ditos hotéis podem pensar para além de uma qualquer simples cobrança de utilização diária para dormida das suas instalações.
Comecemos por olhar para os nossos vizinhos, cuja realidade cultural e económica em muito esbate naquela que nós temos. Em Espanha, assim que o verão de 2020 terminou, começou um processo gradual de adaptação que Portugal ainda não vive. Começaram a possibilitar a ocupação dos quartos para outro tipo de modalidade de hospedes em que é possível trabalhar ou arrendar, por mais tempo, pagando uma renda mensal. Os hotéis de nuestros hermanos começaram a ser escritórios, moradias periódicas e descobriram um caminho possível para nova utilidade das suas instalações após um ano marcado por confinamentos e ausência de turistas.
É aqui que entra no “novo” Works everywhere. Tal como faz já Espanha, o que pensa o futuro do mercado turístico de ver profissionais de outros países da Europa a trabalhar remotamente com as paisagens lindíssimas que qualquer região portuguesa tem, o tempo bom de outono e a nossa forte gastronomia local para paragem? Aqui ao lado, em Málaga, a cadeia de hotéis Gallery Hoteles criou inclusive, já a pensar nestas modalidades, uma espécie de coworking. Como? Fácil. Removeu camas de cerca de uma dezena de quartos e adaptou-se ao tempo que vivemos por forma a captar novos “clientes”.
Já, fortes na criatividade sempre, criaram o conceito de “Homtel” que basicamente mistura “Home” e “Hotel”, na língua de Churchill, para este tipo de turismo diferenciado.
Tem lógica? O futuro dirá se sim ou se não, porém, na teoria, tem muito sentido.
Mas isso só se faz aqui na europa? Não. Há até ideias diferentes que surgiram em algum confinamento do ano que passou. Nos Estados Unidos reforçaram, para além da espécie de “Homtel” o conceito mesmo de co-living, de forma a assegurar novas possibilidades de trabalho para profissionais individuais ou até equipas que desejem ficar durante um período de tempo naquele local em virtude do abalo que os ditos “escritórios normais” levaram com a pandemia e medidas de distanciamento.
Para não ser só na Europa, olhemos para a Cidade que nunca dorme (mesmo em pandemia…): Nova Iorque. Em pleno Brooklyn, segundo relatos do conceituado jornal de referência global The New York Times, o futurista hotel Whyte, que fica na ilha de Manhattan, adaptou todos os seus quartos e transformou-se num hotel escritório. Mudaram a iluminação, as mesas em formato escritório, aumentou-se a capacidade de rede de internet, criaram-se espaços de impressão via Wi-Fi e, claro está, a título de curiosidade, até acesso digital ilimitado deram ao The New York Times assim como café sem qualquer custo.
Noutra ponta do continente norte-americano, em Los Angeles, em plena Beverly Hills, um hotel de nome The London West Hollywood criou também um conjunto de escritórios para serem alugados ao mês. Esta ideia, tal como a de Nova Iorque, serviu para atrair empresas e trabalhadores independentes que viram as condições de escritórios tradicionais mudarem com a pandemia.
Adaptaram-se. Não pararam. Mudaram. Se é para sempre? Ninguém sabe. Seguramente foi feito a pensar nos tempos que vivemos, mas, também, nos empregados e nos seus rendimentos. Evidentemente que também nos lucros de cada empresa ligada ao setor turístico que há mais de um ano está paralisado. Inovou-se.
Portugal, como país tão forte turisticamente, uma referência mundial pelas praias algarvias, pela super cosmopolita Lisboa, pelos Vinhos do Douro, pelas paisagens alentejanas ou pelas magníficas ilhas dos Açores e pela Madeira de Cristiano Ronaldo tem só que olhar para a frente. Não pode estagnar à espera de que 2019 volte cá. Isso acabou. Estamos em 2021 e só há futuro para trabalhar.
Resta-nos saber: O Turismo lusitano vai tirar férias em modo Homtel ou Co-Living?