Miguel Cruz. “Muita gente pensou que a rádio ia desaparecer com a pandemia”

Miguel Cruz. “Muita gente pensou que a rádio ia desaparecer com a pandemia”


14 anos depois da primeira emissão, a M80 alcança resultados de audiências muito positivos. Uma proximidade com o público que deixa  satisfeito Miguel Cruz, diretor da estação. E que se desengane quem pensava que a pandemia poderia acabar com a rádio: ela está cada vez mais próxima dos portugueses e, para a M80, o objetivo é continuar sempre…


A M80 é, pela primeira vez, a segunda rádio mais ouvida na região da Grande Lisboa. Que sabor tem esta vitória?

Tem um sabor naturalmente muito especial porque já lá vão 14 anos e ao fim de 14 anos de luta conseguimos esse marco histórico que, para nós, é absolutamente vital e que mostra bem o caminho que a estação tem percorrido e, sobretudo, no meu entender, mostra que quando nós temos condições de difusão suficientes para estar de igual para igual com os nosso concorrentes, conseguimos, de facto, ir muito mais longe do que aquilo que, muitas vezes, os números nacionais que são referidos apontam. É um incentivo absolutamente extraordinário para continuarmos o trabalho que temos feito e, possivelmente, atingirmos ainda outros objetivos que temos em mente para o futuro.

São agora 14 anos. Quais são os principais marcos?

Houve muita coisa que aconteceu ao longo destes 14 anos mas diria que, de uma forma um pouco mais formal, os dois maiores marcos foram o crescimento da rede emissora que é, como sabemos, em rádio difusão, absolutamente determinante. A M80 nem sempre foi aquilo que é hoje. No início tínhamos apenas dois emissores – um em Lisboa e um no Porto. Depois acrescentámos uma série de rádios locais em rede e fomos crescendo. Só quando finalmente conseguimos acrescentar a rede regional de emissores sul que hoje operamos é que demos um salto qualitativo nas audiências e, portanto, para mim, um dos principais marcos é este crescimento da rede emissora que esperemos que possa continuar a acontecer e, se isso surgir, evidentemente que teremos hipótese de ir mais longe que aquilo que temos feito até agora. O segundo marco, que para mim é muito importante, aconteceu há três anos quando fizemos 11 anos e, nesse ano, lançámos 11 rádios digitais que foram estrategicamente muito relevantes para a M80 porque é um produto que procura atingir 40 anos ou um pouco mais de 40 anos de música e essas rádios digitais permitiram super-servir o nosso auditório tradicional e fugir um pouco àquilo que chamo o maior denominador comum do produto FM. Como não cabia tudo no FM, conseguimos, com estes produtos digitais ir muito mais longe e tematizar grande parte da nossa música em torno de rádios dedicadas às várias décadas e também de rádios dedicadas aos vários estilos e esse marco foi muito relevante. Temos assistido a um crescimento muito grande na escuta destas estações e vamos continuar a trabalhar no sentido de as desenvolver. 

A primeira emissão surgiu pela voz de Nelson Miguel e a primeira música foi dos Starship: Nothing’s Gonna Stop Us Now. 14 anos depois, ainda nada vos para?

Diria que estamos a fazer por isso todos os dias. A responsabilidade da escolha foi, de facto, do meu colega Nelson Miguel que ainda hoje é o programador principal da estação e era, na altura, um desejo. Hoje, felizmente, está a concretizar-se. Temos crescido e queremos continuar a crescer. Tem valido muito a pena. Tem sido um desafio enorme mas com grandes resultados e grandes alegrias, quer para mim pessoalmente quer para toda a equipa, julgo eu. Estamos muito contentes com os resultados obtidos. Sobretudo, como digo, quando muitas vezes com muito pragmatismo nós olhamos para a realidade das coisas e percebemos que algumas estações da concorrência com muito maior cobertura, com muito mais potentes emissores estão atrás de nós. Isso deixa-nos cheios de orgulho e dá-nos muita força para continuar. Nothing’s Gonna Stop Us Now, já lá diziam os Starship, indiscutivelmente. 

Do primeiro dia em específico, que memórias tem? Correu tudo bem ou há alguma coisa que tenha passado despercebida aos ouvintes?

Correu tudo relativamente bem para os ouvintes. Internamente o processo foi um pouco diferente porque tudo era diferente: as condições, a equipa era muito pequenina, o estúdio foi montado à pressa e estava quase – como se costuma dizer – preso por arames, digamos. Estávamos com muito receio que a coisa corresse mal. Felizmente tinha uma estrutura por trás da estação com a qual já tinha trabalhado, inclusivamente nas outras estações do grupo. Estava mais ou menos seguro que haveria sempre alguém que se pudesse chegar à frente para nos ajudar a resolver um eventual problema. Do ponto de vista do auditório a coisa correu lindamente. Nunca imaginámos é que, de facto, passados estes 14 anos, conseguíssemos ter a relevância que temos hoje, sendo já desde 2017 a terceira estação nacional. É um grande orgulho e, naquela altura, muito poucos – eu inclusivamente – imaginaríamos que um dia isso viesse a acontecer. E volto a lembrar: na altura tínhamos um emissor local em Lisboa e outro no Porto. Era uma realidade completamente diferente. Temos trabalhado muito para fazer a M80 crescer não só como produto mas também como marca. Sabemos hoje que a maior parte do auditório sabe o que ela significa e estamos muito orgulhosos disso. 

Quando a M80 surgiu, anunciou-se que era uma rádio com música dos anos 70, 80 e 90. Continua a ser assim mas não só…

Exatamente. Houve uma evolução que, curiosamente, na altura foi mais ou menos estudada. Não sabíamos como é que ela ia acontecer em termos práticos e o que tem acontecido é que já há alguns anos acabámos por ter que abandonar o slogan que tínhamos então que era ‘todos os êxitos dos anos 70, 80 e 90’ e criámos um novo slogan: ‘se a sua vida tem uma música, ela passa na M80’ que é uma frase muito mais aberta e que permite que outras músicas lá caibam. À medida que o tempo foi passando fomos diminuindo um pouco a carga de anos 70, fomos aumentando a carga de anos 90 e já desde há alguns anos temos até alguns temas do início do milénio. Vamos ajustando o nosso produto musical ao target ao qual nos dirigimos. É o target acima dos 35 anos. Nesse sentido, vai havendo uma evolução muito estudada, não fazemos isso de livre iniciativa. Todos os anos fazemos profundos estudos percetuais e estudos de mercado para saber exatamente o que fazer e o que não fazer mas tem havido essa evolução.

Inevitavelmente falamos um pouco do ano atípico que temos vivido. A equipa esteve em teletrabalho?

Estivemos e temos estado em teletrabalho.

Como é fazer emissões a partir de casa?

No primeiro confinamento foi extremamente difícil, foi um grande desafio para toda a equipa, em especial para os locutores de primeira linha quando tiveram que fazer as emissões à distância a partir de casa. Neste segundo confinamento optámos por pôr em teletrabalho todas as restantes pessoas menos aquelas que, de facto, têm a primeira linha, que fazem a emissão todos os dias. Estão hoje separadas em vários estúdios, no caso da M80 em dois estúdios diferentes, uma pessoa em cada estúdio. Mas fazem a partir dos estúdios e as condições e o produto final é muito melhor do que no primeiro confinamento. Toda a restante equipa está em teletrabalho e também tem sido um desafio enorme para conseguir a mesma qualidade de produto no final. Acho que hoje em dia as coisas já estão muito mais rotinadas e as pessoas muito mais habituadas às reuniões por Zoom ou por Teams e a coisa vai acontecendo. Relativamente à situação do ano passado, houve muita gente que pensou que a rádio ia desaparecer em 2020 com a pandemia. De facto, os estudos de audiências mostram que, apesar de ter havido uma ligeira diminuição ocasional, as audiências mantêm-se e a escuta de rádio mantém-se. Para nós foi uma boa notícia e estamos muito contentes com essa situação. Curiosamente foi o ano de 2020, em plena pandemia, o melhor de performance da M80. Batemos, no final do ano, dois recordes de audiências nacionais históricos seguidos e a pandemia teve para nós coisas, obviamente complicadas, difíceis, mas também teve este lado importante do ponto de vista da performance que foi estarmos num pico de performance extraordinário. É para mim e para a equipa um grande privilégio. Continuar a subir ao fim de 14 e estarmos ainda a obter máximos históricos é um privilégio e estamos muito contentes com esta situação. 

Falamos de pandemia e inevitavelmente falamos em confinamento. As pessoas estão em casa mas ouvem rádio. Que papel tem a rádio na vida dos portugueses nesta fase?

Esta é uma grande pergunta na medida em que o desafio da M80 – e nós internamente falámos muito sobre isso quando há um ano começou esta pandemia – era ter a ambição de continuar tudo na mesma. Ou seja, estamos e queremos estar presentes de uma forma positiva na vida das pessoas com as induções positivas que a nossa música, indiscutivelmente, transmite. Na altura, procurámos mexer o mínimo possível na nossa programação no sentido em que, se a vida das pessoas ficou completamente alterada por uma série de razões, vamos manter alguns desses valores seguros na vida das pessoas. Procurámos que a M80 fosse exatamente isso: a mesma M80 de sempre. E julgo que isso trouxe bons resultados na medida em que o público se reviu nessa estratégia e, podendo ter uma vida bastante destabilizada, sabiam que ao sintonizar esta estação, as tais emoções positivas continuavam a estar presentes e a M80 ia ser fiel a si própria. É isso que temos feito neste período particularmente conturbado. 

Recentemente lançaram um novo site e uma aplicação para smartphones. Exatamente para estarem mais próximos do público?

Sentimos que as plataformas digitais são uma excelente maneira de continuar a chegar ao nosso público, de estar presente na vida deles. No final do ano passado lançámos então um novo site, muito mais moderno, muito mais apelativo, com muito mais funcionalidades e acesso a maior diversidade de conteúdos. A aplicação seguiu a mesma realidade estética e também tem uma performance absolutamente extraordinária. Ficamos muito contentes. A velocidade de utilização da aplicação aumentou de uma forma incrível da antiga aplicação para esta. Com essa estratégia, o que queremos é continuar a chegar o mais rapidamente possível nas melhores condições a esse público que, confinado, já não ouve ou poderá não ouvir apenas a rádio no carro mas terá muitas outras maneiras – telemóvel, tablet, computador – para ouvir o nosso produto.

Ao longo dos anos a equipa foi crescendo, apostaram, por exemplo, na Vanda Miranda. Sentem que, além da música, muitos dos vossos ouvintes são atraídos também pela vossa equipa?

Confirmaria, indiscutivelmente. A estação é, em primeira instância, a sua música mas é muito mais que isso. A voz dos animadores – aquilo a que chamo habitualmente a boa disposição e o tom de comunicação dos protagonistas – é absolutamente determinante misturado com esta música para fazer o produto M80. Tenho o privilégio de trabalhar com algumas das melhores vozes da rádio portuguesa. À medida que as pessoas vão evoluindo na sua carreira e também na idade vão-se aproximando do target M80 e tenho a sorte de trabalhar com alguns colegas com quem trabalhei na altura em que era diretor da Rádio Comercial. Isso tem sido o crescimento da equipa, sobretudo vindo de outras estações do grupo. É o caso de quase todos eles que estão neste momento na M80, sobretudo a Vanda Miranda que foi a mais mediática quando aconteceu mas há o João Vaz, o Miguel Simões… uma série de pessoas que têm feito essa transição e que julgo que os nosso ouvintes reconhecem e apreciam quando eles desenvolvem os seus dons de comunicação em cima destas músicas que, felizmente, são memoráveis para as pessoas. É a combinação destes dois fatores que faz o sucesso da M80.

A M80 costumava celebrar o seu aniversário com pompa e circunstância. Como é fazê-lo ‘dentro de quatro paredes’ há dois anos?

É muitíssimo mais complicado e mais frustrante. As festas eram para nós – e são ainda – uma forma muito relevante de estarmos junto do nosso auditório. Nessa data particularmente importante que é o aniversário, colocávamos a hipótese de o fazer em conjunto. O ano passado não foi possível, este ano não foi possível. É muito desagradável para nós e provavelmente também para o auditório. Estamos muito ansiosos que haja um desconfinamento e que as coisas possam voltar à nova normalidade para que essa tradição possa voltar a ser posta em prática e os ouvintes possam voltar a estar connosco e nós com os ouvintes que é um objetivo importante quer para eles quer para nós.