O metralhar das andorinhas explodiu o silêncio suave da tarde. O sol está suficientemente forte para que as avezinhas negras se agrupem em ondas que se desfazem sobre o Sado quando resolvem voar cada uma para seu lado.As andorinhas falam muito. As andorinhas falam sempre. Só a noite as cala. Fico a olhar o céu de um azul translúcido e o ziguezague dos pássaros, a rua vazia lá em baixo, sem passantes, o volume verde que choca dos caixotes do lixo enfileirados. Em Paris, certo dia, o chefe da polícia da cidade teve a ideia revolucionária de implantar latas para recolha de lixo por todas as ruas e boulevards. Chamava-se monsieur Poubelle. Morreu um dia, como qualquer um, e os parisienses esqueceram-se dele mais depressa do que os lisboetas se esqueceram do Intendente de Pina Manique, salvo quando querem explicar a alguém onde ficava a maior concentração de prostitutas da capital. O problema é que a obra do senhor Poubelle foi tão revolucionária que os caixotes do lixo passaram a ser chamados de poubelles. Em 1947, um grupo de descendentes seus, resolveu tomar uma posição sobre o assunto. Como já não era possível tirar da rua os baldes de lixo, mudaram simplesmente de nome. Não sei para qual. A família de monsieur Poubelle fartou-se de engolir des ordures, como dizem por lá, e libertou-se do desagradável e fétido fardo do nome que carregava sobre as costas. Conto a história como a li. Na verdade, Pitigrilli, o outro nome de Dino Segre, um dos humoristas mais ácidos que alguma vez me passou por uma página de livro, tinha uma certa razão quando se desculpava dos seus excessos de imaginação: “Que importa que a anedota seja autêntica ou falsa? Quando se escreve para divertir o público, há necessidade de se ter tamanho escrúpulo que só se escreva a verdade?” Não sei responder. Que respondam as andorinhas, metralhando pios por sobre a feiura de um caixote do lixo verde…
O senhor do lixo
O metralhar das andorinhas explodiu o silêncio suave da tarde. O sol está suficientemente forte para que as avezinhas negras se agrupem em ondas que se desfazem sobre o Sado quando resolvem voar cada uma para seu lado.As andorinhas falam muito. As andorinhas falam sempre. Só a noite as cala. Fico a olhar o céu…
JORNAL I
-
Edição de
O senhor do lixo
O metralhar das andorinhas explodiu o silêncio suave da tarde. O sol está suficientemente forte para que as avezinhas negras se agrupem em ondas que se desfazem sobre o Sado quando resolvem voar cada uma para seu lado.As andorinhas falam muito. As andorinhas falam sempre. Só a noite as cala. Fico a olhar o céu…
O metralhar das andorinhas explodiu o silêncio suave da tarde. O sol está suficientemente forte para que as avezinhas negras se agrupem em ondas que se desfazem sobre o Sado quando resolvem voar cada uma para seu lado.As andorinhas falam muito. As andorinhas falam sempre. Só a noite as cala. Fico a olhar o céu de um azul translúcido e o ziguezague dos pássaros, a rua vazia lá em baixo, sem passantes, o volume verde que choca dos caixotes do lixo enfileirados. Em Paris, certo dia, o chefe da polícia da cidade teve a ideia revolucionária de implantar latas para recolha de lixo por todas as ruas e boulevards. Chamava-se monsieur Poubelle. Morreu um dia, como qualquer um, e os parisienses esqueceram-se dele mais depressa do que os lisboetas se esqueceram do Intendente de Pina Manique, salvo quando querem explicar a alguém onde ficava a maior concentração de prostitutas da capital. O problema é que a obra do senhor Poubelle foi tão revolucionária que os caixotes do lixo passaram a ser chamados de poubelles. Em 1947, um grupo de descendentes seus, resolveu tomar uma posição sobre o assunto. Como já não era possível tirar da rua os baldes de lixo, mudaram simplesmente de nome. Não sei para qual. A família de monsieur Poubelle fartou-se de engolir des ordures, como dizem por lá, e libertou-se do desagradável e fétido fardo do nome que carregava sobre as costas. Conto a história como a li. Na verdade, Pitigrilli, o outro nome de Dino Segre, um dos humoristas mais ácidos que alguma vez me passou por uma página de livro, tinha uma certa razão quando se desculpava dos seus excessos de imaginação: “Que importa que a anedota seja autêntica ou falsa? Quando se escreve para divertir o público, há necessidade de se ter tamanho escrúpulo que só se escreva a verdade?” Não sei responder. Que respondam as andorinhas, metralhando pios por sobre a feiura de um caixote do lixo verde…
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