“Não era a PSP que ia fiscalizar o trabalho do senhor”, diz sindicato sobre suspensão de juiz anti-confinamento

“Não era a PSP que ia fiscalizar o trabalho do senhor”, diz sindicato sobre suspensão de juiz anti-confinamento


O magistrado do tribunal de Odemira foi suspenso preventivamente. Ordem dos Advogados condena conduta.


O Conselho Superior da Magistratura (CSM) decidiu suspender preventivamente o juiz Rui Fonseca e Castro, fundador do movimento Juristas Pela Verdade e atual líder da página Habeas Corpus, que contesta o estado de emergência, enquanto decorre o inquérito aberto à conduta do magistrado.

 

Minutas veiculadas online

Na terça-feira, Fonseca e Castro anunciou, no Facebook, que foi alvo de um inquérito disciplinar por parte do CSM pelas suas posições contra o estado de emergência, que vigora em Portugal devido à pandemia de covid-19.

“Sucede, porém, que nos encontramos em tempos que fogem completamente à normalidade. Encontramo-nos em tempos de exceção, a qual se traduz num ataque violento e sistemático aos nossos mais elementares direitos fundamentais”, proferiu o juiz, adicionando que “não está em causa qualquer pandemia, mas outrossim a subtracção dos nossos direitos, liberdades e garantias”, referindo-se ao estado de emergência que foi renovado às 00h00 do dia 17 de março.

“Quem não se pronuncia, quem não reage, irá tornar-se cúmplice. É tempo de nos unirmos e de lutarmos pelo que acreditamos”, rematou, enquanto conduzia e falava simultaneamente aos seguidores, no vídeo que publicou na página Habeas Corpus. “Da minha parte, podem esperar que nunca me calarei, nunca baixarei os braços!”, asseverou.

Tal como o Nascer do SOL noticiou há duas semanas, Fonseca e Castro, que esteve de licença sem vencimento durante dez anos, tem estado envolto em polémica devido à publicação de um caderno de minutas, por meio da página Juristas Pela Verdade, que visa conferir a todos quantos vivem as “graves restrições ao exercício de direitos, liberdades e garantias […] a possibilidade de fazerem valer” os mesmos, “com ou sem recurso a serviços advocatícios”.

 

Ordem também instaura processo disciplinar

O Conselho Geral da Ordem dos Advogados anunciou que “tomou conhecimento de que estariam a ser distribuídas pela internet por um juiz de direito minutas de peças processuais relativas a defesas em processos de contraordenação, providências de habeas corpus, participações criminais, declarações de não consentimento e termos de responsabilidade”. Consequentemente, em comunicado enviado às redações, elucidou que “a elaboração de peças processuais é um ato da competência própria dos advogados” e “verifica-se, no entanto que o juiz de direito em questão, embora tenha sido advogado, requereu no passado dia 2 de Março a suspensão da sua inscrição na Ordem dos Advogados, em virtude de no dia anterior ter reingressado na magistratura, por regresso de licença sem remuneração de longa duração”. Por conseguinte, remata o comunicado, “não pode legalmente esse juiz praticar actos próprios da profissão de advogado” e confirma a abertura de processo disciplinar.

 

PSP fez queixa

Tendo iniciado funções em Odemira a 1 de março, Fonseca e Castro não se inibiu de exprimir as suas ideias e, desde esse dia, publicou vários vídeos, inclusivamente um da Manifestação Mundial pela Liberdade, que decorreu em Lisboa no sábado passado.

Na quarta-feira, o jornal Expresso noticiou que a PSP havia feito, há duas semanas, uma participação do magistrado ao CSM por causa de uma entrevista em que apelou à desobediência civil.

“Alguém detetou infrações e procedeu em conformidade. Não era a PSP que ia fiscalizar o trabalho do senhor”, começa por esclarecer Pedro Carmo, presidente da Organização Sindical dos Polícias. “Se o denunciaram por perceberem que ele infringia a imparcialidade necessária e que não cumpria as suas funções, fizeram bem”, garante.

“Quando os atos que se cometem são incompatíveis com as funções que exercemos, seja numa força de segurança, no Direito ou noutra profissão qualquer, temos de ser suspensos”, diz Pedro Carmo, aludindo ao facto de Fonseca e Castro ter interrompido uma sessão de julgamento porque o procurador do Ministério Público e o funcionário judicial se teriam recusado a tirar a máscara na sala de audiências.

“Na PSP também temos estatutos próprios e temos de nos reger por eles. Pode ser uma suspensão provisória até se apurar a verdade”, o responsável sindical. Nota, porém, que afirmar que foi a PSP que fez a participação constitui “um tiro no escuro” na medida em que acredita que as outras forças de segurança também possam ter estado envolvidas. “Podemos dissertar sobre tudo. Todos os que não estão do lado dele, estão contra ele, por aquilo que parece”, frisa.

“Não sabemos qual é a postura dele no dia a dia. Há pessoas que o acompanham que nem sequer o conhecem pessoalmente. Simplesmente concordam com aquilo que diz, mas não conhecem as convicções que o levam a dizer certas coisas”, avança, acrescentando que Fonseca e Castro “para todos os efeitos, tem de ser imparcial”.